Elon Musk não é maior visionário do mundo dos carros elétricos
(Bloomberg) -- No Salão do Automóvel de Pequim deste ano, um burocrata chinês aposentado se abaixou para passar a mão no capô de um elegante cupê esportivo que é anunciado como o carro a bateria mais rápido do mundo, e ele sorria como um pai orgulhoso.
De certa forma, é exatamente isso o que ele é. Duas décadas antes, Wan Gang convenceu o Conselho de Estado da China a utilizar seu vasto poder para apoiar a arriscada e não comprovada tecnologia dos carros elétricos. Ele defendeu o uso de dinheiro do governo, inclusive subsídios, para ajudar a criar uma indústria campeã mundial que ultrapassaria as fabricantes de automóveis ocidentais. Aquele cupê que ele estava admirando no Salão do Automóvel em abril? Foi construído pela chinesa NIO.
Elon Musk criou sua fama promovendo veículos que usam novas energias, mas quando a história do carro elétrico for escrita, Wan talvez tenha um peso maior. Os motoristas chineses compram um de cada dois veículos elétricos vendidos, e a indústria automobilística mundial está tentando se adaptar. Essa revolução foi fomentada por Wan, um ex-ministro da Ciência e Tecnologia cujas realizações são ainda mais extraordinárias ao considerar que ele nunca aderiu ao Partido Comunista chinês.
"Ele é o pai da indústria de veículos elétricos da China", disse Levi Tillemann, ex-assessor do Departamento de Energia dos EUA e autor do livro "The Great Race: The Global Quest for the Car of the Future". "Sem Wan Gang, é improvável que a China tivesse tentado ultrapassar o Ocidente. Isso foi ideia dele."
Wan, de 66 anos, que deixou o ministério em março e agora ocupa um cargo acadêmico em um think tank de Pequim, atualmente não está concedendo entrevistas, segundo seu escritório.
Depois de décadas de entusiasmo e falsas largadas, os veículos elétricos avançam para representar um segmento significativo da indústria automobilística. Neste ano, a produção chinesa de veículos que usam novas energias (NEVs, na sigla em inglês) deverá chegar a 1 milhão de veículos, um aumento de 26 por cento em relação ao ano passado. O Reino Unido, a França e a Índia estão propondo a proibição de veículos com motor de combustão interna, de acordo com a Bloomberg New Energy Finance.
Carreira e legado
Um dos poucos sortudos de sua geração a frequentar a faculdade, Wan foi admitido em um programa de Ph.D. em engenharia mecânica na Universidade de Tecnologia de Clausthal, na Alemanha. Quando se formou, em 1991, choveram ofertas de emprego de todas as grandes fabricantes alemãs, mas ele escolheu a Audi porque era a menor e oferecia as melhores oportunidades de promoção.
Como executivo do departamento de planejamento da Audi, Wan desempenhou o papel de embaixador, exibindo sua fábrica de última geração em Ingolstadt para enviados chineses que tentavam ressuscitar sua indústria automobilística decrépita. Um dos convidados foi o então ministro da ciência Zhu Lilan, que gostou do engenheiro.
Meses depois do primeiro encontro, em 2000, Wan estava em seu país natal vendendo para Zhu e o resto do Conselho de Estado a ideia de dar um grande salto. A China estava sufocada com a poluição, e suas fábricas de automóveis, ponderava Wan, nunca poderiam alcançar as fabricantes japonesas, americanas ou alemãs no setor de veículos tradicionais.
Uma aposta em novas tecnologias poderia colocar a China em pé de igualdade ou até mesmo possibilitar que o país assumisse a liderança, teorizou Wan. Também poderia ajudar a reduzir a dependência do petróleo estrangeiro.
Hoje, existem no mercado mais de 100 modelos de carros elétricos fabricados na China, construídos por gigantes como a BYD, financiada por Warren Buffett, e startups como a NIO, que levantou cerca de US$ 1 bilhão em uma oferta pública inicial neste mês.
Os NEVs representam cerca de 1 de cada 20 carros de passageiros comprados na China, números que provavelmente subirão por causa dos incentivos estatais - o verdadeiro legado de Wan.
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