Romance de Bolsonaro com a mineração visa tesouros da Amazônia
(Bloomberg) -- Em um voo para Brasília, no ano passado, Jair Bolsonaro levava na bagagem de mão pouca coisa além de dois pequenos pedaços de metal extraídos no Brasil: um era grafeno, usado em células solares; o outro era nióbio, que serve para reforçar o aço.
Na época, ele disse que esperava exibi-los em uma entrevista na TV como prova da promessa da mineração para a atribulada economia do Brasil. Embora algumas das ideias do capitão da reserva tenham mudado ao longo do tempo, o desejo de Bolsonaro de liberar o potencial de mineração da Amazônia, a floresta tropical de 690 milhões de hectares localizada no coração da América do Sul, se manteve firme.
Agora ele está prestes a chegar à presidência, liderando as últimas pesquisas por dois dígitos, e a comunidade da mineração está salivando.
"Olha, a gente está esperando há 30 anos", disse Elton Rohnelt, que fundou algumas mineradoras durante a ditadura militar no Brasil, de 1964 a 1985, e foi colega de Bolsonaro na Câmara dos Deputados na década de 1990.
Organizações não governamentais que "não querem mineração" impediram o desenvolvimento, disse Rohnelt, em entrevista por telefone. "O setor mineral do norte está todo aguardando que o governo brasileiro com Bolsonaro regulamente a situação", disse, e que "diga qual é o caminho que tem que ser tomado".
Bolsonaro ainda não definiu detalhes para o setor de mineração, e um porta-voz não deu retorno aos pedidos de comentários feitos por telefone e e-mail. Mas declarações passadas do candidato estão deixando ativistas em alerta.
Ele disse, por exemplo, que pode tirar o Brasil do acordo climático de Paris se isso significar sacrificar a soberania da Amazônia, cujo ecossistema é visto por muitos como de importância ecológica mundial. E criticou as agências ambientais do país por impedirem projetos promissores.
O plano de governo de Bolsonaro promete reduzir o tempo de espera para licenciamento de pequenas usinas hidrelétricas a um máximo de três meses, enquanto em alguns casos pode demorar uma década. Ele afirmou também que não destinará nem um centímetro mais para reservas indígenas e que quer as populações nativas integradas à sociedade brasileira moderna.
Cerca de 30 por cento do território brasileiro é protegido, tanto para efeito de conservação quanto para grupos indígenas, principalmente na Amazônia, segundo a Embrapa, uma organização de pesquisa agrícola administrada pelo governo.
As opiniões de Bolsonaro refletem o mesmo caráter nacionalista que o coloca à frente nas pesquisas. Mas também trazem complicações subjacentes tanto para Bolsonaro quanto para o Brasil, e podem afetar grupos indígenas, derrubar mais de uma década de políticas ambientais e abrir uma cara campanha de construção em uma floresta tropical pouco acolhedora.
Ainda assim, pelas palavras de Rohnelt, desenvolver a Amazônia nunca foi tarefa fácil. Quando ele iniciou a prospecção de ouro na região, a falta de estradas o obrigava a explorar com helicópteros com seus colegas paraquedistas, disse. Guerrilheiros colombianos percorriam a floresta, obrigando-o às vezes a andar armado.
Na década de 1990, Rohnelt foi colega de Bolsonaro na Câmara dos Deputados, e os dois eram amigos, disse. Mas não conseguiram aprovar uma regulação exigida pela constituição para a realização de atividades de mineração em territórios indígenas. Rohnelt disse que apoiou um projeto a respeito, em 1996, mas que ainda aguarda votação. Há outros 20 projetos pendentes para o setor.
Se Bolsonaro chegar à presidência, a dificuldade para fazer com que os parlamentares aprovem a mineração na Amazônia pode diminuir. O partido do candidato favorito conseguiu mais de 50 cadeiras na Câmara no primeiro turno das eleições, contra apenas oito atualmente, o que o transforma na segunda maior sigla da casa.
Embora os obstáculos legislativos restrinjam parte dos investimentos, a selva da burocracia também desanima bastante.
A empresa canadense Belo Sun Mining pretendia construir a maior mina de ouro do Brasil na Amazônia, mas no ano passado teve a licença suspensa quando a Fundação Nacional do Índio (Funai) afirmou que a empresa não havia realizado os estudos necessários. A Potássio do Brasil, um projeto de US$ 2 bilhões, tem quase uma década e sofreu diversos atrasos, segundo o presidente da empresa, Hélio Diniz.
Diniz diz que não tem candidato preferido. Mas reconheceu que o conhecimento militar pode ser útil para o desenvolvimento da Amazônia daqui para frente, e Bolsonaro prometeu nomear generais para alguns cargos ministeriais. "Temos tido muito apoio deles", disse Diniz, por telefone. "Eles sabem que precisamos de desenvolvimento lá para ajudar as pessoas. Não apenas desenvolvimento do governo. Eles tiveram que levar empresas para lá."
Outros líderes do setor têm reclamado que o excesso de zelo das autoridades judiciais complica os negócios desde o desastre do rompimento da barragem de rejeitos da Samarco Mineração, que matou 19 pessoas em 2015.
A burocracia assola o setor de mineração nacionalmente, não apenas na Amazônia, disse Murilo Ferreira, ex-CEO da Vale, a maior produtora de minério de ferro do mundo e a única grande mineradora com presença considerável na Amazônia graças às reservas do Carajás.
Gigantes da mineração como Rio Tinto, BHP Billiton e Glencore têm presenças limitadas ou estão ausentes, disse Ferreira, por telefone. "As empresas têm tido muitas dificuldades", o que significa que "procuram outros lugares onde a situação é muito mais fácil", disse.
Houve um declínio significativo nos novos pedidos para pesquisa mineral, segundo João Orestes, secretário de planejamento e desenvolvimento do Estado do Amazonas, que supervisiona a mineração. Nas décadas de 1980 e 1990, a esfera local do órgão regulador da mineração recebia cerca de 2.000 solicitações por ano envolvendo três estados da Amazônia. Neste ano, receberam menos de 100, disse.
Os últimos três presidentes eleitos "nunca falaram em mineração, nunca consideraram isso importante", disse Orestes, por telefone. "Com Bolsonaro tem esse entendimento."
--Com a colaboração de Flavia Said.
Repórteres da matéria original: David Biller no Rio de Janeiro, dbiller1@bloomberg.net;R.T. Watson no Rio de Janeiro, rwatson71@bloomberg.net
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