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'Deturpam a reforma com contrainformação', diz ex-secretário de Previdência

Agência Câmara
Imagem: Agência Câmara

Alexa Salomão

São Paulo

16/05/2017 11h00

Pelas estimativas de Leonardo Rolim Guimarães, ex-secretário de Previdência e consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados, até o início de junho a reforma da Previdência passa. O maior esforço agora é derrubar "a argumentação falaciosa" que prejudica a tramitação no Congresso e a compreensão do cidadão. "A comunicação foi muito deturpada", diz ele. A seguir, trechos da entrevista.

Dá para estimar em quanto tempo o governo vai garantir maioria para aprovar a reforma?

Eu estimo que, entre final de maio ou início de junho, o governo já tenha todos os votos de que precisa.

Por que está demorando mais tempo do que o previsto?

Essa reforma é difícil de qualquer jeito, ainda mais em ano pré-eleitoral, e a sua comunicação, em tempos de redes sociais, foi muito deturpada.

Deturpada em que sentido?

Chegou para as pessoas que a reforma é ruim, negativa e desnecessária. Muitas mentiras foram colocadas na internet, de forma totalmente irresponsável. As pessoas já são resistentes às mudanças e leem essas coisas, já viu: basta que alguém fale algo que elas se convencem logo e ficam contra. Era de se esperar, nesse cenário, que o governo tivesse dificuldade.

Apesar de o governo até ter uma base muito mais ampla que os três quintos necessários para a aprovação, uma quantidade considerável de parlamentares realmente ainda não está convencida da real necessidade da reforma. Eles ficam perguntando se não dava para esperar, se é tão grave assim. A gente vai lá, explica: olhe, a reforma está atrasada.

Atrasada em quanto tempo?

Voltando lá atrás. Fernando Henrique Cardoso, quando presidente, fez uma reforma na Previdência. Nem de longe, porém, ela foi o que ele pretendia. O texto que saiu do Congresso ficou bem aquém do que era preciso. Resultado: foi uma reforma importante, mas não resolveu o problema. Em pouco tempo, foi preciso fazer outra. Mas a mesma coisa aconteceu no governo de Lula: ele mandou um projeto muito mais ambicioso, o que saiu foi menos.

Em 2011, criamos grupos de trabalho com aposentados, com centrais sindicais. Era para o governo ter apresentado uma proposta, mas não saiu. Em 2015, Dilma Rousseff retomou a questão, anunciou que faria a reforma. Novos grupos foram criados. Mas veio o impeachment. Aí entra o governo de Michel Temer. Tem gente que diz que agora estão acelerando a discussão da reforma. Não. São uns 10 anos de atraso, se pensarmos que devia ter saído no governo Lula.

O sr. mencionou que a reforma de FHC foi diluída e não resolveu o problema. O que seria "resolver o problema"?

Garantir que o governo vai ter dinheiro no futuro, para poder pagar a aposentadoria de quem é jovem hoje e, lá na frente, vai ser velho. Garantir equilíbrio dos benefícios concedidos entre ricos e pobres. O Barroso está certo no que disse (no sábado passado, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, defendeu a Reforma da Previdência, alegando que o modelo atual transfere renda dos mais pobres para os mais ricos). O nosso sistema previdenciário é altamente regressivo. A reforma vai melhorar a distribuição de renda. Digo o mesmo sobre os jovens.

Tenho pena dos jovens que são contra. Essa reforma é para eles.

Não vai ter dinheiro mesmo?

Não tenha dúvida: não vai ter. A conta é simples. Há 20 anos, o sistema tinha metade dos aposentados que tem hoje. Em 2050, serão o triplo do que temos hoje, mas a quantidade de pessoas contribuindo vai ser praticamente o que temos hoje. Você já cobre esse buraco usando dinheiro de impostos. Quem paga mais impostos? Os mais pobres. Barroso está certo: tiramos dinheiro dos mais pobres para dar de aposentadoria aos mais ricos.

E se hoje a sociedade já não consegue pagar, já tem um rombo, como vai pagar no futuro? Já estamos tirando dinheiro de educação, de saúde, de investimento, de ciência e tecnologia para cobrir a Previdência. Não precisa ser expert em matemática para ver como será no futuro.

Como militares ficaram de fora e aposentadorias especiais prevalecem, fica a impressão de que a reforma prejudica os pobres.

O que acontece no debate sobre a reforma hoje aconteceu nos debates anteriores. A elite brasileira sempre foi vampira, sanguessuga. São pessoas inteligentes, bem formadas, competentes. Mas usam os pobres como escudos. Para defenderem os seus privilégios, criam toda uma argumentação falaciosa, para que os pobres e os jovens, os grandes beneficiários, fiquem contra.

Toda ênfase dessa reforma preserva os mais pobres e tira privilégios da maioria dos funcionários públicos. Gente como eu e o Marcelo (Caetano, secretário de Previdência), funcionários públicos, somos odiados pelos colegas hoje. Quem se aposenta mais cedo? Quem tem emprego estável, carteira assinada a vida toda ou emprego no serviço público. Pobre não tem isso. Pela regra nova fica igual para todo mundo - e essa é a diferença dessa reforma que irrita a elite.

Acaba aposentadoria precoce, acaba a regra diferenciada, acaba a integralidade e a paridade. E a regra de transição endurece para quem ia se aposentar cedo. Obriga a criação de Previdência complementar nos Estados. Todo mundo vai ter o teto do INSS. Entre os novos trabalhadores, não tem privilégio para ninguém e, entre os antigos, reduz muito dos privilégios existentes. Você tem ideia de quanto ganham os auditores fiscais, que fizeram campanha contra a reforma? Uns R$ 25 mil. Por que você acha que são contra?

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.