'Não existe ajuste fiscal sem reforma da Previdência'
Economistas diziam que o Brasil estava se recuperando, mas que havia riscos externos, como o aumento da taxa de juros nos EUA e a possibilidade de o governo Trump adotar barreiras protecionistas. Esse cenário está se configurando, mas não vimos reflexo nos indicadores do Brasil. O que está acontecendo?
Já se esperava que a taxa de juros americana subisse. No Brasil, temos uma combinação de taxa de juros baixa para o padrão local e recuperação econômica. Isso tende a ter um efeito benéfico para as empresas, acaba atraindo capital e mitigando o impacto de volatilidade episódica nos mercados internacionais. Sobre as barreiras, vamos ver como serão implementadas. Por ora, se for contido a um problema do setor siderúrgico, o impacto tende a ser limitado. A preocupação é com efeitos colaterais ou com o processo de se tornar generalizado.
Nesse cenário, como vai a economia nacional?
O Brasil crescerá algo como 3% neste ano, saindo da recessão definitivamente. O crescimento deve refletir basicamente as decisões de política econômica, em especial a monetária do ano passado. A política monetária demora de seis a nove meses para ter seu efeito sobre a atividade. Há uma incipiente melhora do crédito, o que tende a alavancar a demanda. Por outro lado, vemos o PIB mundial crescendo 4%. Então vai ser mais um ano em que o Brasil encolhe perante o PIB mundial. A região como um todo, tirando o Peru, vai perder fatia de mercado em relação. É um problema sul-americano. Temos crescido pouco. Não temos conseguido melhorar a qualidade do treinamento da força de trabalho. E aí a produtividade cresce pouco.
O fato de a recuperação ser muito baseada na política monetária faz pensar que o restante da economia está em situação complicada. Há dificuldade na implementação de um ajuste fiscal?
Não existe ajuste fiscal sem reforma da Previdência. Acho que a necessidade da reforma cobre praticamente todo o espectro político. Obviamente, diferentes partidos têm diferentes versões de reforma. Se a reforma não ocorrer, em algum momento o País vai chegar aonde o Rio já chegou. A reforma vai ser discutida de novo no início do ano que vem praticamente sob qualquer cenário eleitoral. Não acho que o esforço de persuasão do ano passado esteja totalmente perdido. As pessoas estão cientes da necessidade da reforma. O próximo governo, como vai ser recém-eleito, provavelmente terá capital político para avançar nessa agenda.
Deveremos ter um déficit primários de quase R$ 160 bilhões em 2018. Podemos conviver com ele?
A gente vai conviver na medida em que o mundo acreditar que vamos enfrentá-lo. Por ora, as pessoas acreditam que haverá uma reforma da Previdência e outras medidas serão tomadas de modo a trazer o déficit para baixo e eventualmente gerar superávits primários suficientes para estabilizar a dívida. É questão de confiança. Vai depender do diagnóstico da nova equipe econômica e da capacidade de articulação do novo governo no Congresso.
Havia uma preocupação no mercado de que, sem a reforma da Previdência, a Selic voltaria a subir. Isso não ocorreu. Quão sustentável é a taxa de juros a 6,5%?
Sem a perspectiva de reforma, pode se tornar muito mais difícil manter a taxa de juros num patamar de um dígito. A configuração dos preços de ativos hoje reflete a crença de que a reforma será aprovada em 2019. Sobre a política monetária de curto prazo, a recessão aconteceu, foi profunda, gerou uma folga na utilização de recursos e permite que a taxa de juros fique nesse patamar até meados de 2019.
Qual o cenário para as eleições?
O consenso é de continuidade da política econômica em linhas gerais. Caso essa conjectura se mostre equivocada, teremos de repensar o cenário.
Tem um efeito Jair Bolsonaro nas contas?
Penso mais em equipe econômica e capacidade de articulação. Não estou preocupado com o nome do cabeça de chapa.
Então como vê uma equipe liderada por Paulo Guedes (conselheiro econômico de Bolsonaro)?
Não vou discutir nomes específicos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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