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Venezuela reajusta salário mínimo e volta a tabelar preço dos produtos

Eduardo Knapp/Folhapress
Imagem: Eduardo Knapp/Folhapress

Elianah Jorge

Correspondente da RFI Brasil na Venezuela

30/04/2020 07h27Atualizada em 01/05/2020 09h39

O salário mínimo na Venezuela passa a 800 mil bolívares a partir de sexta-feira (1°), valor equivalente a US$ 4,6 mensais. O segundo reajuste salarial do ano chega no momento em que o país apresenta 331 casos de coronavírus, enfrenta uma grave escassez de gasolina, além de ameaças de falhas nas redes de distribuição de alimentos com o tabelamento dos preços dos produtos básicos.

O reajuste salarial de 77,77% chega a ser simbólico diante da inflação interanual de 3.365%, divulgada em março deste ano pelo parlamento venezuelano, que é de maioria opositora. Além do aumento, que já virou uma tradição do presidente Nicolás Maduro para marcar o Dia do Trabalho, o governo venezuelano voltou a tabelar produtos. Cerca de 27 artigos da cesta básica foram congelados pelo "sistema de preços definidos".

De acordo com o governo, "este preço justo, deve satisfazer as necessidades do povo e garantir a produção, reposição de inventários e da matéria-prima para toda a cadeia (de alimentos)".

Mas mesmo com o aumento salarial e o controle de preços, quem depende do salário mínimo não consegue ter acesso à uma alimentação adequada. O quilo da carne tabelada, por exemplo, custa cerca de US$ 4. Embora a meta seja evitar a especulação, o tabelamento de preços pode significar uma nova escassez de produtos e o aumento dos casos de fome no país.

Há poucos dias, Nicolás Maduro anunciou que 88% dos venezuelanos inscritos no sistema "Pátria" - o banco de dados no qual estão registrados os beneficiários dos programas estatais - afirmaram que precisam de maior atenção na questão da alimentação.

Entre 2013 e 2019 o controle de preços gerou falhas na distribuição de produtos, principalmente de alimentos básicos. Em meados do ano passado, quando o governo bolivariano flexibilizou as medidas, as mercadorias voltaram às prateleiras em todo o país. Alguns empresários do norte do Brasil se beneficiaram da proximidade geográfica para exportar seus produtos à Venezuela.

Gasolina x distribuição de alimentos

Com as principais refinarias do país trabalhando no nível mínimo, a Venezuela, embora seja sócio-fundador da Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP), enfrenta uma severa escassez de gasolina. Mais da metade da frota do venezuelana está parada.

Desde o início da quarentena, estabelecida em meados de março passado, começou a faltar gasolina na Venezuela. Este problema gerou um efeito dominó, sobretudo nas redes de distribuição de alimentos.

É da região dos Andes venezuelanos que saem a maioria das frutas, legumes e vegetais que abastecem o país. Sem conseguir combustível, os produtores não conseguem escoar a produção. Os poucos produtos que chegam às cidades são vendidos com ágio.

O isolamento social imposto como forma de evitar contágios por Covid-19, aliado à alta dos preços e à falta de gasolina, motivaram nos últimos dias protestos e saques em diversas cidades do país. Em Upata, no estado Bolívar, ao menos uma pessoa morreu durante um conflito.

Gasolina a preço internacional

Na tentativa de regular a situação, foi estabelecido um controle que permite ao cidadão comum abastecer apenas no dia determinado pelo número final da placa do veículo. Não bastando o rodízio, é preciso fazer mais de 20 horas de fila para colocar entre vinte e trinta litros de combustível.

Essa problemática levou à dolarização de fato do preço da gasolina na Venezuela. Embora o valor oficial do tanque cheio do combustível seja o equivalente a R$ 0,0000001, já é possível encontrar quem revenda por até US$ 2 o litro do produto.

Alguns analistas preveem que, em breve, a Venezuela sofrerá um processo de privatização da venda de gasolina, que passará a ter preços compatíveis aos do mercado internacional.

Até pouco tempo atrás o aumento do preço da gasolina era considerado tabu no país. Nem mesmo a altíssima inflação, que chegou a 9.585% ano passado, alterou o preço do combustível, que é determinado pelo Estado.

Os venezuelanos que conseguem cruzar fronteira têm preferido comprar gasolina no Brasil. Em Pacaraima (RR), cidade brasileira localizada há poucos quilômetros da Venezuela, o litro da gasolina custa cerca de R$ 4,50. O valor é alto, mas a procura é tanta que não sobra combustível sequer para os quase 12 mil moradores do local. Antes da escassez de gasolina na Venezuela, o movimento era inverso e os brasileiros preferiam comprar gasolina venezuelana.

Além da distribuição de alimentos, a falta de gasolina vem afetando, inclusive, o trabalho das funerárias. Sem combustível, o traslado de corpos e caixões está comprometido.

Aviões vindos do Irã

Nos últimos dias aterrissaram na Venezuela de aviões da Mahan Airlines, linha aérea iraniana sancionada pelos Estados Unidos por suposto envolvimento com grupos terroristas. Segundo fontes não oficiais, pelo menos três voos procedentes de Teerã trouxeram para a Venezuela profissionais e materiais para tentar reativar a produção de gasolina na refinaria de Cardón, localizada no norte do país.

Embora não estejam claras as ações do governo para resolver de imediato a falta de gasolina no país, esta semana Nicolás Maduro nomeou Tareck El Aissami como ministro do Petróleo e Asdrubal Chávez, primo do ex-presidente Hugo Chávez, como o novo presidente da estatal Petróleos da Venezuela (PDVSA).

Tareck El Aissami é acusado de narco-terrorismo pelo governo americano. Os Estados Unidos oferecem U$ 10 milhões por sua captura.

Mais de um mês sem ir à escola

Por causa da quarentena que já dura mais de um mês, os estudantes venezuelanos não podem frequentar as instituições de ensino. Para a conclusão do ano letivo, que será agora em junho, o Ministério da Educação anunciou que provas e trabalhos deveriam ser feitos pela internet.

Porém, a falta de infraestrutura tem sido um impasse à escolarização. O sinal de internet é falho ou inexistente em diversos estados venezuelanos, além de ser dificultado pelos constantes apagões que afetam boa parte do país. Muitos alunos estão sem estudar e não há garantias de que poderão receber o conteúdo escolar em tempo hábil.

No ano passado uma grande falha elétrica deixou por semanas quase toda Venezuela às escuras. Na quarta-feira (29) Carmen Meléndez, ex-ministra da Defesa e atual governadora do estado Lara (centro-oeste venezuelano), afirmou que "é possível viver sem energia, mas não sem água".

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Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado no segundo parágrafo, o governo venezuelano voltou a tabelar produtos, e não o governo boliviano. A informação foi corrigida.