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Veja profissões que receberiam menos por hora extra com reforma trabalhista

Filipe Andretta

Do UOL, em São Paulo

13/08/2021 14h07

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (12) uma nova reforma trabalhista que, dentre outras medidas, diminui o pagamento de horas extras para profissões com jornada de trabalho reduzida. Com o apoio do governo, o texto substitui a medida provisória (MP) 1.045. Ela ainda precisa ser aprovado pelo Senado e passar pela sanção do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Especialistas ouvidos pelo UOL afirmam que a regra poderá afetar várias categorias:

  • bancários
  • telefonistas (como operadores de telemarketing)
  • jornalistas
  • médicos
  • dentistas
  • advogados
  • músicos
  • aeroviários
  • aeronautas
  • engenheiros
  • secretários

Em regra, os empregados da iniciativa privada têm um limite de jornada definido pela legislação trabalhista (CLT) que é de oito horas diárias e 44 horas semanais. As profissões da lista acima são as que têm regras próprias, com limites menores.

Os bancários, por exemplo, têm jornada de trabalho limitada a seis horas por dia e 30 horas por semana. Telefonistas, categoria que abrange operadores de telemarketing, têm limite de seis horas diárias e 36 semanais.

O que mudaria com a reforma

A regra atual é que o trabalho para além da carga horária (geral ou especial) é remunerado como hora extra, com adicional de 50%.

O texto aprovado na Câmara diz que profissionais com jornada reduzida poderiam aderir à jornada geral da CLT (oito horas por dia e 44 por semana) recebendo um adicional de 20% pelas horas a mais, ou seja, menos que os 50% pagos hoje em dia.

Só haveria adicional de 50% na hora extra se o empregado trabalhar além da jornada geral da CLT, de oito horas diárias.

Texto fala em acordo, mas especialistas questionam

Em tese, a nova regra só valeria se houver acordo por escrito da empresa com o empregado ou com o sindicato. O texto também diz que, passada a emergência de saúde do coronavírus, a mudança na jornada teria que acontecer por iniciativa do empregado.

O advogado Rômulo Saraiva, especialista em direito do trabalho, afirma que, na maioria dos casos, a demanda por horas extras vem do patrão.

Na prática, desconfio que será do empregador a última palavra da iniciativa de determinar quem vai trabalhar mais horas.
Rômulo Saraiva, advogado

Para Ricardo Calcini, professor de direito do trabalho do Centro Universitário FMU, o texto foi elaborado com o objetivo de dar aparência de que não houve prejuízo para o trabalhador —embora as categorias com jornada reduzida saiam prejudicadas pela redução no valor das horas extras.

Mudança pode ser derrubada na Justiça

Segundo Calcini, a regra aprovada na Câmara é inconstitucional e poderá ser barrada na Justiça. Isso porque a Constituição determina que horas extras sejam remuneradas com adicional de 50%. Uma lei não poderia reduzir essa porcentagem.

Desde a reforma trabalhista de 2017, acordos entre empresa e sindicatos podem se sobrepor a regras da CLT, desde que não violem direitos mínimos previstos na Constituição.

Especialistas também dizem que a regra pode ser derrubada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) por ser um "jabuti" —matéria inserida na tramitação da medida provisória e que não tem relação com o texto original.

Sindicatos criticam a mudança

Sindicalistas que representam algumas profissões potencialmente afetadas disseram que as convenções e os acordos coletivos já assinados terão de ser respeitados, com a garantia da jornada especial e o pagamento de hora extra pelas regras atuais. Mas como os acordos têm prazo de validade (são renovados periodicamente), a reforma poderia atingir os trabalhadores cedo ou tarde.

Neiva Ribeiro, secretária-geral do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e região, afirmou que a nova regra de horas extras para a categoria é ilegal porque contradiz a Constituição e por ser um "jabuti". Ela disse que o governo já tentou passar a mesma mudança em outras medidas provisórias, como a que tentou emplacar o Contrato de Trabalho Verde e Amarelo.

Mauro Britto, do Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações do Estado de São Paulo, afirmou que a medida é insensível e prejudica ainda mais uma categoria que enfrenta dificuldades por causa da substituição de mão de obra por robôs de atendimento.

"Nós repudiamos essa atitude do Congresso, que está longe de representar a classe trabalhadora, e lamentamos a consciência política dos trabalhadores que ajudaram a eleger esses representantes", afirmou.

A Federação Nacional dos Jornalistas declarou que a medida é inconstitucional e que ataca a jornada de trabalho garantida à categoria na CLT.

O UOL procurou o deputado Christino Áureo (PP-RJ), relator do texto aprovado na Câmara, e aguarda uma manifestação.