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Na pandemia, brasileiro paga 20% a mais para financiar casa própria

Imagem: Getty Images/iStock

Fabrício de Castro

Do UOL, em Brasília

28/10/2021 04h00

Em busca de espaços maiores e funcionais, os brasileiros que compraram imóveis durante a pandemia de covid-19 financiaram casas e apartamentos quase 20% mais caros. Dados do Banco Central mostram que, de fevereiro de 2020 a agosto deste ano, o valor do imóvel financiado subiu 18,92%. No mesmo período, a inflação brasileira foi de 9,94%.

O levantamento do BC não revela se os imóveis subiram de preço ou se as pessoas procuraram espaços maiores e mais caros por fatores como home office.

Essa alta dos imóveis acima da inflação é traduzida pela mediana dos valores de garantia de imóveis residenciais financiados (MVG-R), um indicador do BC que funciona como uma espécie de termômetro dos financiamentos no Brasil.

Em fevereiro de 2020, antes da pandemia, a MVG-R estava em R$ 185 mil. Em agosto deste ano, já estava em R$ 220 mil. Isso significa uma alta de 20%.

Como é calculado o indicador?

Ao solicitar o financiamento, uma família informa o valor de compra do imóvel ao banco. Para que a operação seja aprovada, a instituição financeira providencia uma avaliação independente do imóvel, para saber se o preço cobrado pelo vendedor condiz com o mercado.

Isso ocorre porque, no caso de falta de pagamento, o próprio imóvel servirá de garantia ao banco.

Esses valores de avaliação de imóveis nos financiamentos são informados ao BC pelos próprios bancos. Com isso, o BC calcula a mediana do preço do imóvel financiado, considerando unidades em todo o Brasil em determinado período.

Veja as mudanças da MVG-R durante a pandemia:

  • Fevereiro 2020: R$ 185 mil
  • Maio 2020: R$ 180 mil
  • Agosto 2020: R$ 185 mil
  • Novembro 2020: R$ 200 mil
  • Fevereiro 2021: R$ 213 mil
  • Maio 2021: R$ 217 mil
  • Agosto 2021: R$ 220 mil

Ficou mais caro ou compraram casas maiores?

O avanço da MVG-R não é, necessariamente, uma indicação de que os preços de imóveis subiram durante a crise sanitária. O indicador mostra que se pagou mais, mas isso também acontece quando os consumidores buscam residências de maior padrão.

"Quando você olha para os empréstimos, eles são de maior monta. Você pode entender a partir disso que os clientes estão comprando bens de maior valor", explica Alberto Ajzental, coordenador do curso de Desenvolvimento de Negócios Imobiliários da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Por que imóveis mais caros?

Ajzental explica que o fenômeno está ligado a dois fatores principais.

Primeiro, as condições de financiamento se tornaram mais atrativas durante a pandemia. Segundo, as famílias passaram a buscar espaços maiores.

Dada a renda familiar, as pessoas puderam comprar um bem mais caro. E, durante a pandemia, elas valorizaram mais a permanência em casa. Passaram a desejar um imóvel maior e melhor
Alberto Ajzental, professor da FGV

Mais espaço para o home office

Esse foi o caso do servidor público Eduardo Rodrigo Just, de Ponta Grossa, no Paraná. Proprietários de uma casa de 50 m², ele e a esposa decidiram se mudar no meio da pandemia, em busca de mais espaço.

"Quando começou a pandemia, lá em março do ano passado, a empresa ofereceu trabalho em home office, por tempo indeterminado. Eu gostei. Mas minha casa era pequena. Com o passar dos meses, ficamos saturados", afirma. "O quarto de dormir era dividido com o escritório improvisado."

A solução foi financiar a compra de outra casa, desta vez de 160 m². "O espaço para trabalho ficou maior e consegui montar um pequeno escritório. Também dá para aproveitar melhor a área de lazer", diz.

Saíram do aluguel e compraram apartamento maior

Erik Paulussi e Amanda Sequin compraram apartamento na pandemia Imagem: Divulgação

A jornalista Amanda Sequin, de São Paulo, também decidiu buscar um espaço maior durante a pandemia. Um dos estímulos foi a alta do IGP-M (Índice Geral de Preços - Mercado), indicador tradicionalmente utilizado no Brasil para reajustar os contratos de aluguel.

No ano passado, em função da disparada dos preços do dólar, o indicador acumulou alta de 23,14%, a maior variação desde 2002.

"Como houve aumento do IGP-M, que regulava meu contrato, o valor do aluguel ficou muito alto. Percebi que conseguiria dar entrada no meu apartamento e que, se precisasse financiar, seria um bom momento", diz a jornalista.

Ela e o marido, o também jornalista Erik Paulussi, acabaram trocando neste ano o apartamento alugado de 65 m² no Sumarezinho, zona oeste de São Paulo, por um imóvel próprio de 103 m² na Mooca, zona leste da capital. Ao fazerem as contas, perceberam que nem precisariam entrar em um financiamento imobiliário.

"No antigo apartamento, tínhamos dois quartos. Usávamos um como dormitório e outro como escritório", diz Amanda Sequin. "Na pandemia, eu e meu marido fazíamos reuniões remotas o tempo todo. No novo apartamento, temos três quartos, sendo dois escritórios adaptados."

Fenômeno mundial

O professor Roy Martelanc, coordenador da pós-graduação em Negócios do Mercado Imobiliário da Fundação Instituto de Administração (FIA), afirma que a busca por imóveis maiores — e muitas vezes, mais caros — está ocorrendo em todo o mundo.

Tem muita gente migrando para uma casa ou apartamento maior e mais longe. Se a pessoa vai trabalhar apenas um ou dois dias por semana na empresa, em home office parcial, por que não trocar a proximidade por mais metros quadrados?
Roy Martelanc, professor da FIA

O que observar antes de fazer o financiamento?

Os especialistas ouvidos pelo UOL deram orientações sobre o que fazer antes de fechar a compra:

  • Certifique-se de que o imóvel está adaptado para o trabalho e o estudo em casa. O mundo pós-pandemia será mais virtual
  • Escolha de forma criteriosa o imóvel e observe os custos. Nos últimos meses, os preços do setor de construção têm aumentado, o que impacta no valor dos lançamentos imobiliários
  • A alta da taxa básica de juros (Selic) vai influenciar o custo dos financiamentos daqui para frente, assim como o avanço da inflação. É preciso avaliar qual é a melhor opção de crédito
  • O aumento da inflação também reduz o espaço, no orçamento das famílias para o pagamento das parcelas do financiamento
  • Observe sempre o custo efetivo total (CET), e não somente os juros. Ele inclui todas as despesas envolvidas na compra do imóvel, como juros, taxas, custos de serviços e seguros
  • Existem hoje quatro tipos de financiamento imobiliário: prefixados (juro fixo); juro fixo + TR (taxa referencial); juro fixo + IPCA; juro fixo + poupança. Com o avanço da inflação, a opção que incorpora o IPCA pode trazer um custo financeiro maior nos próximos anos

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