Trabalhadores de aplicativo têm jornadas extensas e sem INSS, aponta IBGE
Um levantamento inédito realizado pelo IBGE divulgado nesta quarta-feira (25) mostrou que 2,1 milhões de brasileiros utilizaram plataformas digitais para trabalhar no ano de 2022. Desses, 77% eram autônomos e a maioria eram condutores de automóveis para transporte de passageiros. Entenda quem são esses trabalhadores.
O que diz a pesquisa?
A pesquisa mostra quem são os chamados trabalhadores "plataformizados" do país. Segundo definição da a OCDE, OIT e União Europeia, o trabalho plataformizado é caracterizado pelo controle ou organização, por parte da plataforma digital ou aplicativo de celular, de "aspectos essenciais das atividades, como o acesso aos clientes, a avaliação das atividades realizadas, as ferramentas necessárias para a condução do trabalho, a facilitação de pagamentos e a distribuição e priorização dos trabalhos a serem realizados."
77% dos plataformizados trabalham por conta própria. A Região Sudeste registrou o maior percentual, concentrando 57,9% (862 mil pessoas) do total de trabalhadores plataformizados no Brasil. Na maioria das vezes, as plataformas utilizadas são de prestação de serviços.
Cerca de 1,5 milhão trabalham especificamente por meio de aplicativos de serviços. Os aplicativos de transporte particular de passageiros lideram o ranking, sendo utilizadas em 47,2% dos casos por cerca de 704 mil pessoas. Em segundo lugar, com 39,5% (589 mil pessoas), estão os aplicativos de entrega de comida, produtos etc.
Os aplicativos de táxi, que entram em uma categoria separada, reúnem 13,9% dos plataformizados (207 mil pessoas). Logo em seguida, com 13,2% (197 mil pessoas), estão aplicativos de prestação de serviços gerais ou profissionais.
O forte predomínio de trabalhadores por conta própria entre os plataformizados sugere que a estratégia que as plataformas digitais utilizam para a captação de seus prestadores de serviços não ocorre, majoritariamente, por meio de contratação direta, visto manterem a maior parte desses trabalhadores na condição de colaboradores ou trabalhadores independentes. No entanto, ainda que, na grande maioria dos casos, não sejam estabelecidos vínculos empregatícios formais com as empresas que controlam tais aplicativos, há evidências de certo grau de dependência desses trabalhadores em relação às plataformas.
IBGE
Quanto esses trabalhadores ganham?
O rendimento médio é 5,4% superior em relação ao rendimento médio dos não plataformizados. Ainda assim, existem algumas ressalvas que devem ser feitas, considerando as diferenças dos grupos de pessoas que usam os aplicativos, como o nível de instrução e ocupações exercidas.
Para os grupos menos escolarizados, o rendimento médio mensal é, realmente, maior. A renda das pessoas que trabalham por meio de aplicativos de serviço ultrapassa em mais de 30% o rendimento das que não usavam as ferramentas digitais.
Mas o cenário é diferente entre as pessoas com o nível superior completo. O rendimento dos plataformizados (R$ 4.319) era 19,2% inferior ao daqueles que não trabalhavam por meio de aplicativos de serviços (R$ 5.348) em todas as Grandes Regiões do país.
No caso dos motoristas de aplicativo, por exemplo, o rendimento médio mensal é de R$ 2.454. O valor é ligeiramente superior ao observado entre os condutores não plataformizados (R$ 2.412).
O cenário, no entanto, é diferente para os condutores de motocicletas. Nas atividades de malote e entrega, o rendimento médio dos motociclistas plataformizados foi de R$ 1.784, apenas 80,7% daquele recebido pelos não plataformizados (R$ 2.210).
Quem são esses trabalhadores?
81,3% dos trabalhadores que utilizam as plataformas são homens. Enquanto isso, 18,7% são mulheres. Além disso, 48,4% têm entre 25 e 39 anos. As demais faixas etárias possuem uma menor participação entre os plataformizados.
67,9% são da categoria de operadores de instalações e máquinas e montadores. O grupo abrange os condutores de motocicletas e de automóveis, incluindo os motoboys e motoristas entregadores, taxistas e motoristas de aplicativo. Em seguida, com 14%, estão os trabalhadores dos serviços, vendedores dos comércios e mercados.
61,3% têm nível intermediário de escolaridade, ou seja, ensino médio completo ou superior incompleto. Já as pessoas com ensino fundamental completo ou médio incompleto correspondiam a 16,5% dos trabalhadores das plataformas.
Apenas 14,2% de pessoas com ensino superior utilizam as plataformas. Já as pessoas sem instrução ou com o fundamental incompleto são 8,1% do total de ocupados que trabalhavam por meio de aplicativos.
A pesquisa contribui sobremaneira para fomentar o debate público em torno da regulação do trabalho em plataformas digitais, inclusive do ponto de vista previdenciário, o que só é possível através de dados oficiais. Além disso, as estatísticas abrem a possibilidade para a criação de políticas públicas efetivas e para o planejamento da atuação dos órgãos de defesa do trabalho decente, ao mesmo tempo que demonstram claramente a informalidade nesse tipo de trabalho, a forte dependência dos trabalhadores em relação às plataformas, jornadas mais elevadas e rendimento menor do que os trabalhadores 'não plataformizados' do setor privado.
Procuradora Clarissa Ribeiro Schinestsck
Os desafios da categoria
Os trabalhadores plataformizados trabalham mais. Ainda que exista uma maior flexibilidade na escolha de quando e onde trabalhar, as jornadas de trabalham são, em média, 6,5 horas mais extensas que a dos demais ocupados.
Além disso, esse grupo de trabalhadores precisa enfrentar alguns desafios. Segundo o instituto, mais de 60% das pessoas que trabalhavam por meio de aplicativos de serviços não estão asseguradas por instituto de previdência oficial, por exemplo.
Se, de um lado, as plataformas digitais de trabalho têm oferecido oportunidades de geração de renda para muitos trabalhadores e permitido que empresas alcancem novos mercados e reduzam custos, por outro lado, elas também representam um importante desafio, especialmente no que se refere às condições de trabalho.
IBGE