Associação do agro recorre a ex-OMC para recalcular rota de comércio global

O contexto global congrega diferentes desafios simultaneamente. Conflitos geopolíticos, desaceleração da economia da China e reformulação do Parlamento Europeu são alguns exemplos. Sob a ótica do comércio agropecuário, recai ainda a discussão das mudanças climáticas, as exigências do EUDR (Regulamento sobre Produtos Livres de Desmatamento) e o apetite da abertura de mercados na África e Oriente Médio.

Diante de distintas realidades pelo planeta, o agronegócio brasileiro precisa saber como encaixar cada peça no quebra-cabeça do comércio global. É pensando na construção de uma ampla estratégia, dentro e fora do país, que a Abag (Associação Brasileira do Agronegócio) convidou o embaixador Roberto Azevêdo, ex-diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio) e sócio da gestora de recursos YvY Capital, para prestar consultoria internacional.

O diagnóstico dele é de que a percepção sobre o setor agropecuária ainda é vaga, apesar das várias tentativas de abordagem para melhorar a reputação do Brasil frente os consumidores.

"Nada está ajudando, não está havendo um impacto real. É preciso mudar a cultura, a abordagem, a estratégia. Isso passa por mudanças na maneira de atuar dentro e fora do Brasil", disse ele durante evento da Abag realizado nesta segunda-feira (5) em São Paulo.

Azevêdo ressalta que, mais do que o discurso, é preciso definir quais são os princípios do Brasil que devem guiar as ações de políticas públicas no exterior. Afinal, "a realidade externa se impõe, na maior parte das vezes, às discussões de planejamento". Por isso, o país necessita saber mapear seus interesses e "tem que ter sofisticação, caso a caso, em defesa do interesse nacional".

Construção de diálogo

O trabalho de consultoria à Abag tem um longo percurso, mas algumas premissas já estão nítidas ao embaixador. O primeiro ponto é construir um diálogo para esclarecer à União Europeia a diferença entre agricultura temperada e tropical. Algo muito básico para quem acompanha o agronegócio brasileiro, mas um conceito ainda etéreo aos parceiros europeus.

"A agricultura tropical é muito diferente da agricultura temperada. Então, se são diferentes, o diagnóstico e a mensuração têm que ser diferente. Nós não estamos falando essas coisas para negar a necessidade de serem feitas as regras [da EUDR]. Isso não é discurso vazio, não é uma maneira de achar desculpas para não fazer [o que europeu demanda], mas é uma tentativa de dizer como efetivamente cooperar", afirma Azevêdo.

Esse princípio de esclarecimento das condições geográficas é algo relevante não apenas ao Brasil, de acordo com o embaixador, mas é do interesse de todos os países que vivem desconfortos parecidos e são afetados pela imposição europeia, seja o Hemisfério Sul ou mesmo os Estados Unidos.

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"O que a gente quer é que cada geografia tenha métricas que reflitam sua realidade e que otimizem a contribuição delas. Se eu tiver um sistema regulatório que pede que eu haja de determinada maneira, que me imponha determinado comportamento, este comportamento não vai dar os melhores resultados", disse o ex-diretor-geral da OMC.

Foco na COP30

No curto prazo, a consultoria de Azevêdo à Abag deve acompanhar de perto os próximos capítulos da EUDR, prevista para ser colocada em prática em dezembro de 2024. Ingo Ploger, vice-presidente da associação, avalia que a lei anti-desmatamento está sob forte pressão dentro da própria União Europeia e "eles vão mexer nessa medida", inclusive por causa da inflação alimentar.

"Nós podemos construir relações diferenciadas. A pauta ambiental é perfeita, correta, mas temos diferenciais. É um tema complexo, mas é uma nova via para relações comerciais", diz Ploger.

Ao mesmo tempo, o embaixador planeja que o trabalho em conjunto à Abag dê frutos a tempo da COP 30, conferência sobre o clima realizado pela ONU (Organização das Nações Unidas) em 2025, em Belém do Pará.

"Queremos chegar na COP 30 tentando evitar que o comércio agrícola seja tão volátil e imprevisível, em função de medidas unilaterais, seja para o bem e para o mal. Esses canais de comércio precisam ter previsibilidade de abastecimento e demanda, o ideal é ter uma estabilidade. Evitar o excesso de volatilidade é possível com regras", afirma Azevêdo.

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