Mercado, empresas e Bolsa começam a sentir efeitos da taxação de Trump
Felipe de Souza
Colaboração para o UOL, em Campinas (SP)*
18/03/2025 05h30
Aos poucos o mercado e a Bolsa de Valores dos Estados Unidos parecem se dar conta que as medidas anunciadas pelo presidente Donald Trump podem, na verdade, afetar também os próprios americanos.
A avaliação é feita com base em relatórios divulgados nos últimos dias, que apontam retração em algumas estimativas de lucros de algumas empresas e até aumento de preços em produtos mais básicos.
O que aconteceu
Mercado financeiro vive dias de altos e baixos desde o anúncio das taxações. O último dia 10 de março foi o pior dia para a Bolsa de valores americana, após a entrevista veiculada no dia anterior pela Fox News, em que Trump não descartou uma possível recessão na economia. O índice Nasdaq, que reúne as empresas de tecnologia, caiu 4%, o que não ocorria desde 2022. O S&P500 também caiu 2,7% no mesmo dia.
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Wall Street começa a "perder a paciência" com Trump. É o que afirma uma publicação feita pelo jornal Financial Times. A reportagem avalia que a economia norte-americana não precisava de uma "terapia de choque" como essa. O The New York Post conta que os primeiros 45 dias da gestão foram marcados por instabilidade. Uma consequência disso está em um levantamento feito pela consultoria Elos Ayta, em que aponta que as Bolsas já perderam US$ 4 trilhões desde a posse de Trump, em 20 de janeiro, até sexta-feira passada (14).
Efeitos estão sendo vistos diariamente. Aengus Kelly, presidente-executivo da maior empresa de leasing de aeronaves do mundo, a AerCap, disse à emissora CNBC que o preço de um avião Boeing 787 poderia aumentar em US$ 40 milhões "na pior das hipóteses" devido às tarifas — já a Boeing não respondeu. O presidente-executivo da Airbus, Guillaume Faury, em um programa de TV francês, afirmou que está começando a ver "interrupções na cadeia de suprimentos", mas não entrou em detalhes.
Companhias aéreas cortaram estimativas de lucro. A Delta Air Lines "puxou a fila" diminuindo a previsão pela metade, argumentando "que a crescente incerteza econômica levou à retração nos gastos corporativos e de consumo". Já a American Airlines projetou uma perda maior no primeiro trimestre em razão de forte desaceleração na receita. Enquanto a Southwest Airlines também reduziu a previsão de receita para o primeiro trimestre, citando menos viagens ligadas ao governo e um impacto maior dos incêndios florestais na Califórnia. Já a United Airlines disse que seus lucros do primeiro trimestre agora devem ficar na extremidade inferior de sua previsão, por conta da queda de 50% nas reservas de viagens.
BMW disse que vai absorver os custos de importação de carros do México até maio. País foi taxado em 25% por Trump no começo do mês de março. Montadora afirmou, em um comunicado aos concessionários, que, se medidas não forem revistas, os preços serão repassados dentro de dois meses. A montadora importa veículos das Séries 2 e 3, que estão entre os mais vendidos nos Estados Unidos.
Própria Tesla, de Elon Musk, disse que está exposta às taxas de Trump. A montadora de carros elétricos enviou uma carta ao USTR (Escritório do Representante de Comércio dos EUA, em tradução livre), refletindo comentários de muitas empresas norte-americanas preocupadas com as tarifas de Trump. Segundo relato da agência Reuters, a carta é "notável que é da Tesla, mas não está claro quem a escreveu, já que a mensagem não é assinada, embora esteja em papel timbrado da empresa". A Tesla disse que é importante garantir que os esforços do governo Trump para abordar questões comerciais "não prejudiquem inadvertidamente as empresas dos EUA".
Investidores começam a observar outros mercados. O Citigroup e o HSBC rebaixaram as classificações de ações dos EUA de compra para "neutras" e também elevaram as recomendações de compra para China e Europa, respectivamente.
Empresas estão se dando conta que há mais afetados pelas medidas do que os alvos de Trump. Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, considera que a "ficha está caindo" no sentido de observar que os efeitos das taxas e medidas também afetam outros países, e de certa forma até os próprios americanos. "Na avaliação deles, não parecia que todo mundo sofreria com as tarifas, seria mais algo mais direcionado, e agora estão observando que há mais lados sendo afetados", explica.
Um exemplo do efeito é no aço, que tem tarifas de 25% para os produtos vindos do Brasil, Canadá e México. Um levantamento feito pela agência Reuters aponta que os preços de pias de cozinha, fogões, dobradiças e peças usadas no maquinário agrícola podem aumentar no mercado interno americano.
Outras empresas também apontam problemas. A empresa Henkel, da Alemanha, que fabrica os produtos para cabelo Sellotape e Schwarzkopf, e também adesivos, disse que as políticas de Washington estavam prejudicando o mercado dos EUA desproporcionalmente, segundo o CEO Carsten Knobel.
* Com informações da Reuters