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Do ópio às bananas: quatro grandes guerras comerciais que marcaram o mundo

O presidente americano Donald Trump e o presidente chinês Xi Jinping: eles não inventaram as guerras comerciais, mas são seus mais novos adeptos - Kevin Lamarque/Reuters O presidente americano Donald Trump e o presidente chinês Xi Jinping: eles não inventaram as guerras comerciais, mas são seus mais novos adeptos - Kevin Lamarque/Reuters
O presidente americano Donald Trump e o presidente chinês Xi Jinping: eles não inventaram as guerras comerciais, mas são seus mais novos adeptos Imagem: Kevin Lamarque/Reuters

Colaboração para o UOL

13/04/2025 05h30

Com seu tarifaço anunciado nas últimas semanas, o presidente Donald Trump iniciou uma guerra comercial multilateral que envolve pelo menos os EUA, a China, a União Europeia, além de México e Canadá.

Todos planejam ou já anunciaram medidas retaliatórias às taxas impostas pelos americanos aos seus produtos e este pode se tornar um dos maiores —se não o maior— conflito do tipo desde a Grande Depressão, nos anos 1930.

Relembre outras disputas acaloradas no comércio internacional:

Guerras do Ópio

A China enfrentou a Grã-Bretanha e seus aliados durante mais de 20 anos, entre 1839 e 1860. Até o início das hostilidades, a China tinha um superávit de vendas de porcelana, seda e outros produtos para a Europa em troca de prata —o metal valia muito mais por lá. No entanto, o comércio local era fechado para estrangeiros.

Enquanto isso, a Companhia Britânica das Índias Orientais fazia fortuna vendendo a comerciantes (e contrabandistas) chineses o ópio produzido em Bengala. Apesar de a droga ser utilizada como um anestésico em outras partes do mundo, os chineses descobriram que fumar o ópio "dava barato". Com o uso se tornando uma epidemia, a China proibiu não só o consumo como a comercialização da droga, apreendendo carregamentos.

Comerciantes ingleses foram expulsos do país e a Grã-Bretanha declarou guerra à China. O conflito chegaria ao fim em 1842, com os chineses levando a pior e sendo obrigados a abrir suas portas para o livre mercado por meio do Tratado de Nanquim, além de entregarem o território de Hong Kong aos britânicos.

No entanto, em 1856, o governo chinês voltou a tentar a impedir a entrada de um navio inglês e o conflito se reacendeu, desta vez com ajuda dos franceses, americanos e até russos. Novamente, a China perdeu as disputas e teve Pequim ocupada pelos ocidentais, que marcharam pela Cidade Proibida, onde ficava o palácio imperial. Eles se viram forçados a reabrir novos portos aos britânicos.

Guerras das Bananas

Entre 1898 e 1934, os EUA impuseram lutas comerciais, ocupações, intervenções e operações policialescas na América Central e Caribe. Com a saída da Espanha da região após a assinatura do Tratado de Paris, que cedeu Cuba e Porto Rico aos EUA, os americanos decidiram proteger seus interesses econômicos na região, o que resultou até na criação de um "Manual de Pequenas Guerras" pelos fuzileiros navais dos EUA.

À época, o Canal do Panamá estava em construção, mas era considerado estratégico para o comércio e a segurança da América do Norte. Cinco anos após o início das obras, em 1895, os EUA já haviam feito uma intervenção militar no país que culminou, em 1901, com os americanos ganhando o controle da construção iniciada pelos franceses. O Panamá também se separou da Colômbia em 1903, sob a influência militar americana.

Nos anos seguintes, os EUA ocuparam Cuba, República Dominicana, Nicarágua, Haiti e Honduras, além de terem iniciado uma guerra de fronteira com o México. Os locais se rebelaram, mas os conflitos foram (em sua maioria, facilmente) sufocados. Como resultado, surgiram diversas empresas de frutas americanas na região, que ocupavam ou compravam enormes áreas e construíam estradas e ferrovias com o objetivo de controlar o comércio de frutas, especialmente da lucrativa banana —daí o nome da disputa comercial.

Estas operações chegaram ao fim em 1934, quando os EUA estabeleceram a sua chamada "Política da Boa Vizinhança". A proposta do presidente Franklin D. Roosevelt era estabelecer a influência americana na região através de seu soft power, como a chegada da cultura americana na América Latina. Assim, Roosevelt retirou suas últimas tropas do Haiti e colocou um fim ao controle comercial da região com as bananas.

Guerra Comercial de Hawley-Smoot

O Ato Tarifário de 1930 é conhecido pelo nome dos dois parlamentares do Congresso dos EUA que promoveram o projeto de lei: o senador Reed Smoot e o deputado Willis C. Hawley. A medida protecionista foi assinada pelo presidente Herbert Hoover em 17 de junho daquele ano, como estratégia para conter os danos da Quebra da Bolsa de Nova York em 1929 e da crise que se seguiu, período conhecido como a Grande Depressão.

Tarifas foram aumentadas em mais de 20 mil produtos importados, um esforço de proteger a indústria americana da competição com as estrangeiras. O aumento médio dos impostos foi de 20%, o terceiro maior na história dos EUA. Ela só perde para o pacote protecionista de Trump e para as Tarifas de 1828, instauradas ao longo de anos para tentar conter os efeitos da Guerra de 1812 e das Guerras Napoleônicas.

O presidente Hoover assinou a lei contrariando as orientações de diversos conselheiros econômicos experientes. Segundo historiadores, ele acabou cedendo à pressão de empresários afetados pela crise econômica e de membros de seu partido.

Tiro saiu pela culatra. As tarifas aprofundaram a crise econômica porque os parceiros comerciais dos EUA retaliaram, entre eles Cuba, México, França, Itália, Espanha, Argentina, Austrália, Nova Zelândia e Suíça, impondo suas próprias tarifas aos produtos americanos. Grã-Bretanha e Alemanha foram além e formaram parcerias alternativas. Assim, os índices de produtos americanos vendidos caíram no mundo todo e, por isso, economistas e historiadores consideram a lei um erro até hoje.

Exportações dos EUA caíram em 61% entre 1929 e 1933, estima o Censo dos EUA. Só as vendas de produtos americanos aos países que retaliaram e impuseram as próprias tarifas diminuíram cerca de 31% —uma saia justa que estudiosos chamam de Guerra Comercial de Hawley-Smoot, por ter sido consequência direta da lei.

Após Hawley-Smoot, os EUA se viram obrigados a ceder para contornar as perdas. Eles assinaram o Ato dos Acordos Comerciais Recíprocos em 1934, com medidas comerciais mais liberais.

Primeiro Choque do Petróleo

A Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), liderada pela Arábia Saudita, decidiu punir os EUA em 1973 por seu apoio a Israel na Guerra do Yom Kippur. Os judeus tinham nos americanos uma parceria estratégica, já que estavam isolados na disputa contra dois países árabes, Síria e Egito, pela retomada das Colinas de Golã e da Península do Sinai.

Assim, a organização impôs um embargo petrolífero aos americanos e seus aliados: Canadá, Japão, Países Baixos, Reino Unido, Portugal, África do Sul e a antiga Rodésia, hoje Zimbábue. Com a redução nos ritmos de extração, já que o petróleo não era mais vendido a estes grandes consumidores, o preço disparou em mais de 400%.

Diversos países se viram afetados pela guerra comercial entre os aliados americanos e os aliados sauditas membros da Opep, que incluía Irã, Iraque, Kuwait, Venezuela, Qatar, Indonésia, Líbia, Emirados Árabes Unidos, Argélia, Nigéria e Equador. O resultado? Recessão nos EUA e na Europa, que só foi amenizada pelo fim do embargo e da guerra em 1974.

No Brasil, o choque levou o governo a criar o Proálcool em 1975, que substituiu a gasolina por álcool. Cerca de 10 milhões de automóveis a gasolina deixaram de rodar em todo o país, já que a indústria colocou seus esforços nos veículos movidos a combustível alternativo.

*Com informações de matéria publicada em 04/04/2025.


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