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ENTREVISTA-Pré-candidato à Presidência, Bolsonaro se apresenta como Trump brasileiro

27/09/2017 20h05

Por Anthony Boadle

BRASÍLIA (Reuters) - Ele tem fama de ser antigay, é defensor do direito de posse de armas e diz que a China está ocupando o Brasil.

O deputado de direita Jair Bolsonaro não tem partido, mas está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto um ano antes das eleições e espera replicar a ascensão inesperada de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos com o apoio dos brasileiros fartos de políticos corruptos e governos ruins.

"Atacaram Trump com os mesmos temas com que eu sou atacado no Brasil: de facista, homofóbico, racista, nazista. Mas Trump fez um programa de governo dele em que a população acreditou", disse Bolsonaro em uma entrevista esta semana.

Ex-paraquedista do Exército, Bolsonaro vem revoltando compatriotas devido aos seus comentários misóginos e ao seu apoio à ditadura militar, inclusive ao uso que fizeram da tortura. O deputado, que exerce o sétimo mandato, está emergindo como um candidato da lei e da ordem e anticorrupção para a eleição de outubro de 2018, em meio a um surto de crimes violentos e ao pior escândalo de corrupção da história do Brasil, que está implicando grande parte da classe política, incluindo o presidente Michel Temer.

No desacreditado sistema político do país, o apelo que Bolsonaro tem junto a muitos brasileiros é seu histórico impecável --nem uma única acusação de corrupção pesa contra ele.

Duas semanas atrás, um oficial de alta patente do Exército, o general Antonio Mourão, alertou que os militares poderiam tomar o poder novamente se os tribunais não punirem políticos corruptos.

"Ouvi na fala dele que a corrupção tem que ser estancada no Brasil, que continuar como está o jogo de compadres com pouca gente sendo punida, o Brasil perderá seu rumo e perdendo seu rumo alguma coisa terá que ser feita", disse Bolsonaro.

"Ele deu um alerta. Ninguém quer assumir o governo dessa forma. Mas pode até assumir em 2019 um militar, mas via eleições", acrescentou o deputado com um sorriso.

Bolsonaro, de 62 anos, rompeu com o Partido Social Cristão (PSC) porque este não endossou suas ambições presidenciais e está no processo de se unir a uma legenda menor com somente três cadeiras no Congresso --rebatizada para ele, muito a propósito, como Patriotas.

Sem uma máquina partidária e lutando com a repercussão ruim na imprensa --"sou o deputado mais atacado pela mídia brasileira"--, Bolsonaro conta com as redes sociais para levar sua mensagem aos eleitores.

Sua página de Facebook tem mais seguidores do que a de qualquer outro político brasileiro --4,5 milhões, mais do que os 3 milhões do líder mais popular da nação, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e duas vezes mais do que sua adversária mais próxima, a ambientalista Marina Silva.

Uma pesquisa Datafolha de junho mostrou que 30 por cento dos brasileiros votariam em Lula, que foi condenado por corrupção e pode não concorrer novamente, contra 16 por cento de Bolsonaro e 15 por cento de Marina, que já perdeu duas disputas presidenciais.

Analistas políticos alertam que o apelo de Bolsonaro deve recuar à medida que seus oponentes explorarem seus pronunciamentos antigays, antifeministas, xenófobos e pró-ditadura. A taxa de rejeição que mostra os que jamais votariam no ex-militar é de 30 por cento, inferior apenas à de Lula (46 por cento) e do governador tucano de São Paulo, Geraldo Alckmin (34 por cento).

Bolsonaro foi condenado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) por ofensas à deputada Maria do Rosário (PT-RS) a quem disse que não estupraria "porque ela é muito feia".

POLÍTICAS

A fama antigay de Bolsonaro derivou de seus ataques a um programa de educação sexual para escolas que, segundo ele, incentivava a homossexualidade. Ele parece ter suavizado sua posição agora que está de olho na Presidência, e disse à Reuters que a política não tem lugar no quarto de dormir e que aquilo que adultos fazem entre os lençóis é um assunto particular.

Mas ele não cede em outras plataformas políticas, como defender a amenização das leis de controle de armas para que qualquer brasileiro possa comprá-las. Projetos de lei pró-armas que ele patrocinou devem ganhar apoio no Congresso mais conservador que será eleito em 2018, disse.

As opiniões econômicas de Bolsonaro são menos claras. Embora seja ostensivamente pró-mercado e prometa levar adiante os esforços para diminuir a burocracia e o tamanho do Estado, ele não privatizaria empresas que considera estratégicas, como a estatal Petrobras, uma política de desenvolvimento nacional que foi seguida pelo regime militar de 1964-1985.

Se eleito, a prioridade de Bolsonaro na política externa seria fortalecer os laços com Washington, especialmente agora que Trump está na Casa Branca, afirmou, e fazer dos EUA o principal parceiro comercial do Brasil, uma posição que a China ocupa desde 2009.

"A China está tomando conta do Brasil. É um fator preocupante. Estão investindo em subsolo, agricultura, energia, portos e aeroportos", disse Bolsonaro. Ele privilegiaria uma política para limitar a compra de empresas brasileiras por parte de investidores chineses.

Bolsonaro se ergueu para trocar cumprimentos ao final da entrevista diante dos retratos dos cinco presidentes militares pendurados em seu gabinete.

Do lado de fora, pessoas faziam fila para tirar selfies com ele. Gritavam "mito, mito, mito!" "Quero uma foto com ele. É o único político que não roubou", disse Marcos, estudante de 18 anos de Goiás.