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Por retomada, time de Guedes quer 'fábrica de projetos' com dinheiro privado

18.mar.2020 - De máscara, ministro Paulo Guedes (Economia) participa de coletiva sobre o novo coronavírus - Pedro Ladeira/Folhapress
18.mar.2020 - De máscara, ministro Paulo Guedes (Economia) participa de coletiva sobre o novo coronavírus Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Marcela Ayres

04/05/2020 15h40

BRASÍLIA (Reuters) - A equipe do ministro Paulo Guedes quer a estruturação de uma "fábrica de projetos" de baixo risco, com investimentos privados em infraestrutura, como plano A para viabilizar a retomada econômica.

A avaliação, segundo documento interno visto pela Reuters, é de que a forte injeção de liquidez no mundo para combater os impactos negativos do novo coronavírus levará os investidores de longo prazo a apostarem em ativos no País —desde que haja projetos de qualidade para tanto.

Finalizado no dia 28 de abril, o plano foi estruturado por técnicos do Ministério da Economia para ser apresentado ao comitê de crise montado pela Casa Civil. O ministério comandado pelo general Braga Netto é responsável pelo chamado Pró-Brasil, plano que que despertou preocupações pela previsão de utilização de recursos públicos para obras, o que vai contra o que defende Guedes.

O plano do Ministério da Economia, por sua vez, baseia-se na percepção de que a baixa capacidade operacional de elaboração de projetos de concessão é hoje um dos principais gargalos —senão o principal— para o aumento dos investimentos privados no País. E que são eles, e não os investimentos públicos, que terão força suficiente para reativar a economia.

A partir de um cálculo de necessidade de investimentos em infraestrutura de R$ 1,4 trilhão no Brasil nos próximos cinco anos, a equipe de Guedes estimou a necessidade de investir R$ 5,1 bilhões na estruturação de projetos até 2023, sendo R$ 1,1 bilhão só neste ano.

Em função da situação de penúria das contas públicas, o estudo propõe que sejam formadas parcerias com bancos públicos, como Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e Caixa Econômica Federal, além de organismos multilaterais de crédito, como o Banco Interamericano de Desenvolvimento, New Development Bank e Banco Mundial, para bancar esses custos.

Segundo o estudo, a forma de operacionalizar as parcerias seria o contrato de financiamento externo, em que o organismo multilateral empresta recursos ao banco público, com ou sem garantia da União, com o objetivo de aplicá-los na preparação de projetos de concessão.

"Além disso, a carência do empréstimo pode ser calibrada no sentido de garantir que a licitação, que prevê o reembolso do valor dos estudos pelo vencedor, ocorra antes do pagamento do empréstimo, eliminando a necessidade de recursos orçamentários para este fim", diz o estudo.

Para acelerar o tempo de entrega dos projetos, já que sua estruturação hoje supera dois anos, a equipe de Guedes propõe ainda a criação de um modelo padronizado de contrato, com regras tarifárias e de modelagem já em conformidade com recomendações do Tribunal de Contas da União (TCU).

O Ministério da Economia não respondeu de imediato a pedido feito pela Reuters de comentário sobre o estudo.

Rota alternativa

Paulo Guedes - Adriano Machado/Reuters - Adriano Machado/Reuters
Imagem: Adriano Machado/Reuters

Caso o governo entenda ser necessário injetar recursos públicos para impulsionar as obras em infraestrutura, os técnicos da pasta apresentaram um plano B em que o dinheiro do Estado seria aportado num fundo de natureza privada, com gestão de instituição privada e contratada por critério de melhor técnica, com a atribuição de fazer a gestão da carteira de projetos.

"O fundo seria capitalizado pela União, com aporte inicial em dinheiro ou outros ativos, e anualmente, de acordo com a disponibilidade orçamentária. É possível aproveitar a oportunidade para avaliar a possibilidade de encerrar fundos existentes e ineficientes e destinar seus recursos, quando existentes, para o novo modelo", traz o estudo.

Nesse modelo, todas as obras realizadas pelo fundo seriam privatizadas após sua conclusão.

Entre as vantagens do modelo, segundo o documento preparado pelos técnicos, estaria a impossibilidade de o fundo ser atingido por contingenciamentos, o que daria ao gestor maior capacidade de execução.

Investimento privado em xeque

O estudo reconheceu que há uma preocupação crescente quanto à disponibilidade de recursos privados após a pandemia para fazer frente aos investimentos que serão necessários em infraestrutura, num mundo que possivelmente contará com investidores mais receosos.

Em meio à volatilidade provocada pela crise e aversão a ativos considerados de maior risco, estrangeiros retiraram US$ 22,2 bilhões em investimentos em portfólio no Brasil em março, valor recorde da série, conforme dados do Banco Central.

"Contra este argumento, coloca-se a enorme injeção de liquidez que os bancos centrais de todo o mundo realizaram como medida de combate aos efeitos econômicos adversos da covid-19. As medidas monetárias foram agressivas, e a redução dos juros básicos tornou a taxa real livre de risco negativa na maioria dos países de baixo risco", diz o documento.

A avaliação dos técnicos é que os investidores de longo prazo, como fundos de pensão, vão buscar oportunidades seguras para baterem as metas de rentabilidade mínima anual. E que caberá ao Brasil, portanto, estruturar projetos de baixo risco para atrair este capital.

Os técnicos da Economia argumentam ainda que, com exceção dos setores de aviação e de energia, especificamente na geração, não há expectativa de queda forte de demanda à frente, até porque muitos setores já contavam com demanda reprimida.

"Os grandes gaps existentes não devem ser afetados. Em alguns, deve ocorrer até um aumento das necessidades de investimento no futuro, como em telecomunicações, saneamento e transporte urbano, tanto por maior demanda como por necessidades sanitárias", destaca o texto.

Em contraposição, os outros países do mundo que concorrem por investimentos no cenário internacional têm projetos mais voltados para o fluxo da demanda.

"Estes países, mais maduros, possuem uma menor percepção de risco pelo investidor; no entanto, não apresentarão oportunidades no curto e no médio prazos, sendo uma chance para o Brasil apresentar bons projetos e atrair o capital internacional disponível", pontua o estudo.