Cenário nos EUA mudou com dado ruim de inflação, mas efeito no Brasil não é direto, diz Campos Neto
SÃO PAULO (Reuters) - O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse nesta quarta-feira que o dado de inflação dos Estados Unidos publicado mais cedo foi "bastante ruim" e muda a perspectiva de corte de juros na economia norte-americana, o que pode limitar a liquidez global.
Campos Neto ponderou, em entrevista à GloboNews, que o efeito sobre a política monetária do Brasil não é mecânico e será necessário observar a influência desses dados sobre fatores de risco e variáveis da economia doméstica.
"As circunstâncias externas, dado que o grande padrão de liquidez mundial está baseado no que acontece com a taxa de juros norte-americana... eu diria que em termos de taxa de juro americana, mudou", disse.
"Agora, eu não posso dizer que mecanicamente vai afetar aqui (o Brasil)", afirmou, acrescentando que hoje não é possível dizer que o cenário para a política monetária doméstica mudou.
Campos Neto ressaltou que apesar do dado ruim nos Estados Unidos, o resultado da inflação de março no Brasil divulgado nesta quarta é boa notícia.
Os números do IBGE mostram que a inflação no Brasil desacelerou com força no mês passado, com a taxa em 12 meses indo abaixo de 4% pela primeira vez desde julho do ano passado. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu 0,16% em março, ficando abaixo da expectativa em pesquisa da Reuters de avanço de 0,25% no mês.
Enquanto o movimento dos preços no Brasil pode facilitar a atuação do BC em seu ciclo de afrouxamento monetário, dados da inflação dos Estados Unidos divulgados nesta quarta vieram piores que o esperado, lançando mais dúvidas sobre o momento do início do ciclo de cortes de juros na economia norte-americana.
Juros mais altos nos Estados Unidos tendem a valorizar o dólar em relação ao real e pressionar a inflação no Brasil, dificultando a atuação do Banco Central brasileiro para domar os preços ao consumidor.
RELAÇÃO COM LULA
Na entrevista, o presidente do BC afirmou que sua relação com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva "está ótima" e disse estar sempre disponível para conversar com o mandatário, apesar de usualmente fazer contato com o governo por meio do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Questionado sobre sua relação com este governo e o anterior, ele disse ser difícil fazer comparações entre o ex-presidente Jair Bolsonaro e Lula, destacando que são duas gestões diferentes e que isso não muda sua missão técnica no BC.
Ele afirmou ainda que ao longo de sua gestão teve que falar "não" em diversas ocasiões para o ex-ministro da Economia, Paulo Guedes, bem como para o atual ministro Fernando Haddad, ponderando que usa argumentos técnicos que em geral são bem recebidos.
Campos Neto também voltou a defender que o governo não demore a apresentar um nome para assumir a presidência do BC a partir de 2025. Para ele, "seria bom" que a indicação ocorresse entre agosto e setembro para que haja tempo para aprovação no Senado e uma transição suave até dezembro.
Ele acrescentou que não tem nenhuma ambição política para depois do fim de seu mandato no BC e que não refletiu sobre os planos para o próximo ano.
Na entrevista, Campos Neto defendeu novamente a autonomia financeira do BC, argumentando não ser verdade que os servidores da autarquia são contra a proposta, havendo ponto de resistência vindo da fatia de aposentados da instituição.
Em nota divulgada nesta quarta-feira, o Sindicato Nacional dos Funcionários do BC (Sinal) informou que a maioria dos servidores da ativa da instituição se posiciona contra a proposta da autonomia financeira. A votação sobre o tema, segundo a nota, foi apertada, com 51% dos votantes desse segmento se posicionando contra o plano.
(Por Bernardo Caram)
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