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As mil e uma vidas de um empreendedor

Marco Roza

Colunista do UOL, em São Paulo

19/06/2013 06h00

Tem gente que é dono de uma empresa só, muitas vezes, que produz apenas um produto ou serviço. Será, muito provável e rapidamente, um candidato à falência. De cada cem empresas, 27 fecham as portas em dois anos, segundo os acompanhamentos do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa).

As razões são múltiplas. E uma consulta aos especialistas de plantão indica que a falta de conhecimento do negócio, do mercado, do gerenciamento etc. ajudam a complicar a vida do novo empresário.

Como também atrapalha ter entrado numa área de muita concorrência e que exige capacidade de apresentar para uma clientela já cativa uma forma diferenciada dos seus produtos e serviços.

Mas gostaria de levantar aqui os problemas que se acumulam para o dono de uma empresa de um produto (ou serviço) único.

Se o “Samba de uma nota só” pode até ser agradável aos ouvidos, quando nos é apresentado pelo arranjo magnífico do maestro Antonio Carlos Jobim, vender apenas um produto nos torna reféns em vez de gestores de uma empresa.

Pois corremos riscos imensos de sermos abandonados, sem aviso prévio, por nossa clientela. Por uma simples mudança de hábito ou de saturação de ofertas semelhantes e mais atraentes no mercado.

Empresário 1001 utilidades

Mas nem sempre é fácil nos organizarmos para conduzir nossa empresa em várias frentes simultaneamente. Como principiantes, temos dificuldades de acompanhar um só empreendimento, imagina tentarmos cuidar de dois, três ou cinco frentes de negócios ao mesmo tempo.

Mas é importante que coloquemos em nossas expectativas de empreendedores a obrigação sagrada de fechar as contas do mês. Se a gente adotar essa perspectiva, vamos ver nossos negócios como geradores de ganhos também, em vez de ser apenas uma missão de entregarmos aquele produto ou aquele serviço que nos especializamos.

Especialização que geralmente surge como extensão de nossa atividade como empregados por longos anos de uma organização que, se pararmos agora para analisar, era múltipla na sua essência. E que nos deu a oportunidade de especializar naquele nicho, que hoje queremos chamar de nossa empresa.

As várias frentes

Se você é novato nessa área de empreendedorismo invista algum tempo num MBA com as mulheres de sua família. E se for mulher, pare um pouco para refletir sobre suas próprias atividades como mãe, esposa, filha, dona de casa, empregada, ativista social, líder religiosa, cuidadora dos pais e avós etc.

A lista é imensa. E qualquer mulher do nosso convívio desenvolve essas múltiplas atividades com a maior naturalidade, a ponto de acomodar os homens que geralmente só as ajudam a dividir as múltiplas tarefas da família quando pressionados.

O resultado da eficiência gerencial feminina no fim do mês é a harmonização dos conflitos domésticos, o cuidado com os filhos, com os parentes e até mesmo com os amigos. E só vamos perceber a importância dessas mulheres multifuncionais quando elas adoecem ou nos faltam.

Numa empresa que você decide chamar de sua há de predominar essa versatilidade feminina, sendo você homem ou mulher, caso queira fechar as contas por períodos superiores a dois anos. E se transformar numa empresa sobrevivente.

Alguns lembretes

Lembre-se primeiro que se dedicar de corpo e alma a um produto (ou serviço) só é um risco imenso. Até mesmo os garimpeiros de ouro correm risco de o veio secar.

Portanto, diversifique sua produção ou seus serviços desde os primeiros dias de atividade. Tente estabelecer critérios de retornos para cada um dos nichos que constar de seu cardápio. Sim, pense como um dono de restaurante.

Se um prato começa a sair mais do que o outro, com maior retorno financeiro, o coloque mais em cima no cardápio, com letras mais salientes. Dessa maneira você responde aos estímulos de sua clientela e acumula uma margem mais folgada nas suas contas mensais.

Exatamente por adotar essa preocupação, quando um  determinado produto ou serviço começar a cair no desagrado dos seus clientes é hora de, aos poucos, o substituir. Ou até mesmo eliminá-lo se for o caso.

Para que você mantenha vários pratos equilibrados e gerando ganhos ao mesmo tempo é importante criar uma infraestrutura operacional que respeite seus critérios e determinações de qualidade final dos produtos e/ou serviços oferecidos para sua clientela.

Para dar certo, você pode até colocar a mão na massa todos os dias, mas é importante reservar alguns momentos para você mesmo quando terá chances de refletir em tempo real se está conseguindo melhorar seu desempenho em cada um dos produtos que oferece.

Se seus preços continuam competitivos e, principalmente, se ainda consegue surpreender seus clientes, agregando novas experiências no uso de seus produtos ou na satisfação final dos seus serviços.

Descobrirá, por exemplo, detalhes de uma mercadoria ou de um atendimento que chamaram a atenção de determinado nicho de clientes. E se dedicará em buscar maneiras de realçar aqueles aspectos, seja com um produto que o destaque ou um novo design que valorize aquele aspecto que tenha chamado a atenção.

Com o tempo, a dedicação e a prática você gerenciará sua empresa como um malabarista de pratos. Algo extremamente difícil. Mas que o ajudará a escapar das terríveis estatísticas de empresas fechadas.

É algo fácil? Claro que não.

Mas quem foi que te disse que se tornar um empreendedor seria fichinha? Aliás, é a dificuldade inicial de implantação do negócio que, mais tarde, o protege num mercado cada vez mais agressivo. Com clientes cada vez mais exigentes e implacáveis.

E se você, como as mulheres, aprender a ser um empreendedor de mil e uma vidas, tanto melhor. Ainda deixará sua empresa como herança. E sem dívidas.