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Nordeste usa tecnologia de Israel, vence calor de 40°C e produz vinho

Aiana Freitas

Do UOL, em São Paulo

07/05/2013 06h00

A Serra Gaúcha é referência quando se fala em produção de vinho nacional. A milhares de quilômetros de distância dali, no entanto, usando até tecnologia importada de Israel, outra região tem se destacado no setor: o Vale do São Francisco, no sertão nordestino, cenário marcado pelas altas temperaturas (27ºC em média, mas com picos de até 40°C) e pela pouca chuva.

Segundo dados do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), 48,6 milhões de litros de vinhos finos foram produzidos, em 2012, no Rio Grande do Sul, o único Estado que tem estatísticas oficiais sobre o assunto. Estima-se que o Estado seja responsável por cerca de 90% da produção nacional de vinhos finos, que seria, assim, de cerca de 54 milhões de litros.

Não existem estatísticas oficiais sobre a produção do Nordeste. Mas o consultor do Instituto do Vinho do Vale do São Francisco e professor de enologia do Instituto Federal do Sertão Pernambucano, Francisco Macedo de Amorim, estima que a produção da região já chegue a 10 milhões de litros. Há cerca de dois anos, eram cerca de 8 milhões.

"A região produz uma bebida adocicada, fresca e jovem que caiu no gosto do consumidor", diz Amorim.

Em vez de uma, duas safras por ano

As empresas que atuam na região conseguiram transformar o solo pobre do sertão e o clima semiárido em aliados e conseguem obter suas safras anuais. Em outros polos produtores, no Brasil e no exterior, o comum é apenas uma safra anual.

"As uvas brancas se adaptaram muito bem à região. Além disso, o consumo de espumantes tem crescido muito no Brasil, o que ajudou a dar destaque à região", diz Afrânio Moraes Filho, diretor de operações da Miolo. 

A Miolo mantém na cidade de Casa Nova, na Bahia, a Vinícola Ouro Verde, que já é responsável por um terço de sua produção (o restante está do Rio Grande do Sul).

Na Ouro Verde, a cada ano são produzidos cerca de 2 milhões de litros de vinhos e espumantes em 200 hectares. Até 2018, a estimativa é produzir 5 milhões de litros de vinhos e ampliar os vinhedos para 400 hectares.

Sistemas de irrigação suprem falta de chuva

"O maior desafio foi adequar as condições locais à parreira, uma vez que não faz frio, que é um aliado da produção no Sul. Isso fez com que tivéssemos de imitar a natureza por meio da tecnologia de sistemas de irrigação", diz Moraes Filho.

A maior parte da produção na empresa na região está focada em espumantes, especialmente aqueles elaborados com uvas moscatel. Ela é mais adocicada e usada tanto na produção de espumantes como na de vinho branco.

Vinhos tintos também são produzidos lá, como o Testardi Syrah 2010, vencedor da categoria tinto nacional em um concurso realizado na feira Expovinis, em São Paulo, em 2012.

Desde 2008, a fazenda faz parte do roteiro turístico Vapor do Vinho, criado em parceria com a Empresa de Turismo da Bahia (Bahiatursa). Os visitantes fazem uma viagem pelas águas do São Francisco e são convidados a visitar a sede da Ouro Verde, que tem cantina, loja, destilaria e sala de degustação.

Grupo português Dão usa tecnologia de Israel 

Há pouco mais de dez anos, a região atraiu também o grupo português Dão Sul, que instalou em Lagoa Grande, Pernambuco, a Vinícola Santa Maria. Numa área de 200 hectares, todos os pés de uva têm irrigação individualizada, feita com uma tecnologia israelense.

"O fato de a região ser seca ajuda a evitar a proliferação de pragas e o solo é propício para o cultivo. O Sul tem um inverno definido e rigoroso, o que faz com que as uvas parem de se desenvolver nessa época do ano. No Vale do São Francisco, a produção pode ser feita no ano todo", diz André Goldberg, consultor comercial da vinícola.

Goldberg diz que a grande variação de temperatura da região, que pode ser de 40ºC durante o dia e 20ºC durante a noite, é benéfica à produção.

Um dos destaques da empresa é o Paralelo 8, feito com uvas cabernet sauvignon e syrah, que foi eleito por um concurso do Ibravin o terceiro melhor vinho brasileiro em 2011.

Uva moscatel se adaptou ao clima semiárido

Para o diretor da Associação Brasileira de Sommeliers em São Paulo (ABS-SP) Arthur de Azevedo, a uva moscatel foi a que mais se adaptou ao clima semiárido do Vale do São Francisco. "Os espumantes moscatéis da região são extraordinários."

Ele diz que as duas safras registradas por ano na região, apesar de serem interessantes comercialmente para as empresas, fazem com que as parreiras não tenham tempo para acumular nutrientes suficientes, o que é um problema para outros tipos de uva.

"Para outros tipos de vinho, a melhor região produtora brasileira ainda é a Serra Gaúcha", afirma Azevedo.