Do fígado ao filé-mignon: por que o preço da carne está em queda no Brasil?

O preço das carnes tem caído mês a mês no Brasil em 2023. No acumulado do ano até agosto, o recuo médio é de 9,65%, segundo o índice oficial de inflação (IPCA). Todos os cortes pesquisados pelo IBGE ficaram mais baratos e o filé-mignon tem a maior queda no ano (-16,95%). Entenda o que explica a redução dos preços.

O que aconteceu

A queda já era esperada pelo agronegócio. O diretor da HN Agro, Hyberville Neto, afirma que os produtores aproveitaram a valorização de preços de bezerro e gado em 2022 para aumentar a produção. Como consequência, reduziram temporariamente o abate de fêmeas para expandir a criação.

Disponibilidade de carne no mercado interno aumentou. Os criadores passaram a matar mais fêmeas em 2023, diz o analista de proteína animal do Rabobank, Wagner Yanaguizawa. Em Mato Grosso, maior produtor de carne bovina do país, 1,44 milhão de fêmeas foram para o abate no primeiro semestre, 20% a mais do que a média no mesmo período nos últimos dez anos.

A boa safra de soja e milho também favoreceu a redução de preços. Esses grãos são utilizados para alimentar frangos e porcos. Já a principal fonte de alimento de bois são as pastagens, que têm sido beneficiadas por chuvas regulares.

Governo não tem participação direta nos preços. O especialista da HN Agro diz que as perspectivas para o primeiro ano do terceiro mandato do presidente Lula (PT) têm sido positivas, mas que a diminuição nos preços da carne em nada tem a ver com políticas voltadas para o agronegócio. "A expectativa na economia pode influenciar o consumo. Mas não existe estímulo na produção. Temos um ciclo de oferta muito bem definido", afirma.

O filé-mignon lidera as quedas no ano entre todos tipos de carnes. Em seguida aparecem alcatra (-13,46%) e contrafilé (-11,77%). Em relação a outros tipos de proteína animal, o frango em pedaços teve redução de 11,69%, enquanto o frango inteiro apresentou queda de 9,79%. A carne de porco caiu 4,65%. Por outro lado, ovos de galinha tiveram alta de 12,94% até agosto. Pescados subiram 3,12%.

O volume de abate de fêmeas [este ano] é muito atípico porque o macho, que é o grande objetivo do pecuarista, geralmente é usado na produção de carne. Então, esse cenário trouxe um nível de oferta muito acima do que a gente estava preparado para a demanda.
Wagner Yanaguizawa, do Rabobank

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Imagem: Arte/UOL

Vai cair mais?

A expectativa é de que a queda de preços continue nos próximos meses. A redução observada nos açougues ainda não foi suficiente para compensar o longo período de inflação de alimentos registrado desde 2020. "A projeção é que este ano haja deflação nos alimentos no domicílio, após três anos de sequentes altas", avalia a GO Associados.

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O brasileiro ainda não retomou padrão de consumo. Neto afirma que o consumo de carne vermelha ainda está abaixo do desejado e deve demorar para retornar ao patamar de antes da pandemia. No entanto, o segundo semestre costuma trazer um aumento de consumo por causa das celebrações de fim de ano, o que pode resultar em uma ligeira alta no preço das carnes.

Exportações seguem em alta para China, mas desaceleração econômica preocupa. Yanaguizawa reforça que os asiáticos seguirão como maior comprador de carne brasileira, mas lembra que a economia do país tem decepcionado nos últimos meses. Além disso, a incidência de casos de PSA (peste suína africana) acende um alerta que pode favorecer os produtores brasileiros.

O filé-mignon está longe de ser o corte preferido para exportação. Países da Ásia preferem carnes mais gordurosas, como acém e músculo, cupim, peito e paleta. Com isso, a demanda externa tende a segurar mais os preços das carnes de segunda.

O mercado consumidor normalmente é mais forte na segunda metade do ano. Temos contratações temporárias, 13º salário. Apesar de todas as dúvidas com relação à situação econômica, que tem diversos indicadores positivos, mas também tem diversos indicadores que deixam o cenário de cautela.
Hyberville Neto, diretor da HN Agro

O processo de desaceleração econômica só não impacta o consumo de carne bovina, que é a proteína mais cara, porque a China também vem sofrendo interferência do mercado de suínos, com novos casos de PSA, que geralmente voltam a aparecer no final do ano, com a chegada do inverno.
Wagner Yanaguizawa, do Rabobank

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