José Paulo Kupfer

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Opinião

Revisões precoces já elevam PIB de 2024, mas ainda estão mais para chutes

Os departamentos de pesquisa econômica de bancos e corretoras de valores promoveram, já em fevereiro, um carnaval de revisões de suas projeções para os principais indicadores da economia brasileira em 2024. Nem bem o ano começou e, de uma média de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) entre 1,3% e 1,5% para o ano, estimam agora expansão em torno de 1,8%, com muitos prevendo alta de 2% e alguns avançando até 2,5%.

São reações típicas de quem está escaldado, depois dos vexames de 2023. Quando o ano passado começou, projetava-se, no mercado financeiro, um PIB apenas 0,8% acima do registrado em 2022, mas, no fim de 2023, o crescimento, segundo a mediana do Boletim Focus, que reúne as projeções de mais de uma centena de economistas, deve ter chegado a 2,9%, podendo até mesmo superar 3%.

Premissas difíceis de determinar

A verdade, porém, é que essas revisões têm grandes chances de passar por novas revisões, provavelmente um pouco mais para cima, com o decorrer do ano. É que, desta vez mais do que em outras, está ainda mais difícil determinar as premissas a serem incorporadas aos modelos de projeção elaborados por economistas.

As revisões precoces incorporaram informações desconhecidas em parte ou no todo em fins de 2023, bem como estimativas mais precisas do ritmo da atividade econômica no último trimestre do ano. Os números efetivos do trimestre outubro-dezembro, e, portanto, de 2023 como um todo, estão marcados para serem divulgados pelo IBGE daqui a 15 dias.

Com a esperada melhora no comportamento da economia em novembro e dezembro, em relação às previsões anteriores, cresceu a expectativa do tamanho do empuxo econômico que transbordará para 2024. Além disso, e mais relevante, calcula-se agora com mais precisão o efeito positivo na atividade da entrada em circulação de R$ 92 bilhões em precatórios adiados pelo governo Bolsonaro, e pagos pelo governo Lula, no fim do ano.

Peso dos precatórios no PIB

Do total de precatórios pagos, perto da metade diz respeito a pensões alimentícias, recebidos por pessoas físicas. Descontando impostos, venda antecipada do direito e alguma destinação à poupança, o dinheiro vai entrar na economia e impulsionar o consumo, o emprego e, no fim da roda, a atividade.

Só esse impulso de caráter fiscal, na média das estimativas, produziria aumento entre 0,2 e 0,3 ponto percentual nas projeções anteriores para o crescimento do PIB. É o que sustenta, em parte, o avanço das previsões de uma expansão econômica de 1,5%, em 2024, para pelo menos 1,8%.

Puxa-estica entre fiscal e monetário

O problema, para as projeções da marcha da economia, é encontrar o ponto certo entre o nível das restrições da política de juros e o ritmo do impulso expansionista do consumo na contas públicas. O puxa-estica da política fiscal e da política monetária, um movimento com muita tensão, é o que está determinando um crescimento econômico mediano com inflação mediana.

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Já se sabe que o presidente Lula não abrirá mão de empurrar a economia com o dinheiro de programas sociais e investimentos em infraestrutura, mas não é sabido até que ponto avançaria. Também não se sabe até que ponto o Banco Central vai restringir os juros básicos, para evitar uma escapada da inflação, em reação ao impulso fiscal promovido pelo governo.

Nas atuais previsões do mercado, a taxa básica de juros poderá fechar 2024 entre 8,5% nominais ao ano e 9,75%. É um espaço muito grande de dúvidas, com impactos diretos nas estimativas da evolução do crédito, e, em consequência, nas do nível de financiamento de consumo e investimentos — dois componentes cruciais na equação do PIB.

O "x" das previsões

Um bom modelo de previsão da evolução da atividade econômica — como, de resto, nas previsões em geral —, deve dispor de séries consistentes de dados históricos. Mas nem a melhor extrapolação de dados garante projeção confiável sem a moldura de premissas corretas. Encontrar as premissas — econômicas, políticas, sociais, comportamentais etc etc — é o "x" dos exercícios de previsão.

A moral dessa história é que as revisões precoces em fevereiro do PIB de 2024 ainda estão mais para chutes calibrados do que para uma aproximação consistente com o que se concretizará no futuro.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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