Aeroporto tem taxa mais cara do mundo, mas só cobra de africanos e indianos

El Salvador anunciou em outubro o início de uma cobrança considerada polêmica para viajantes em trânsito no aeroporto internacional San Óscar Arnulfo Romero y Galdámez.
Passageiros da Índia e dos países da África terão de pagar uma taxa de US$ 1.000 somada a 13% de impostos (cerca de R$ 5.500) em voos de trânsito pelo aeroporto, que vem sendo considerada a taxa extra mais cara do mundo para uma operação regular.
Qual a razão?
Medida afetará passageiros de 55 países (veja a lista abaixo). De acordo com a Cepa (Comissão Executiva Portuária Autônoma) de El Salvador, a cobrança é uma taxa de melhoria para o local.
Objetivo é o de "prestar um serviço de primeira classe a todos os usuários e passageiros que circulam pelo terminal aéreo", de acordo com a comissão. O governo aponta que há um aumento no número de passageiros que entram, saem e fazem escala no aeroporto nos últimos anos, o que justifica a implementação da taxa para arcar com as despesas de ampliação e modernização do aeroporto.
Apenas passageiros em trânsito no aeroporto serão cobrados. Em nota, a Cepa ainda informou que o país da América Central é um local de conexão com mais de 30 destinos em 14 países.
Companhias aéreas como Avianca já efetuam a cobrança, feita na emissão da passagem. Empresa permite que passageiro seja reembolsado caso desista de viajar por não concordar em pagar a taxa.
Migração para os EUA seria motivo

Embora não esteja explícito, acredita-se que a medida foi tomada pelo governo de El Salvador para frear a migração para os EUA. O país é uma das rotas de estrangeiros que tentam se estabelecer nos EUA.
Uma das rotas é via Nicarágua. Muitos passageiros fazem uma escala em El Salvador antes de seguir para o país vizinho, de onde costumam partir para os Estados Unidos devido às normas de exigência de visto serem consideradas mais fáceis de serem cumpridas.
Encontro em outubro buscou barrar a migração irregular. Brian A. Nichols, secretário adjunto para assuntos do Hemisfério Ocidental dos EUA, visitou El Salvador em outubro, onde se encontrou com o presidente salvadorenho Nayib Bukele. A pauta da reunião foi o fluxo de pessoas de outros países para os Estados Unidos a partir do país da América Central.
Had an excellent meeting with @nayibbukele. We discussed El Salvador's support for the international mission in Haiti, efforts to promote foreign direct investment in El Salvador, bilateral cooperation on rule of law, and mutual efforts to address irregular migration. -BAN pic.twitter.com/cLcCOHYlAT
-- Brian A. Nichols (@WHAAsstSecty) October 26, 2023
Medida é considerada como racismo. A organização de mídia African Stream questionou por qual motivo apenas africanos e indianos estão sendo cobrados, ao mesmo tempo que não foi divulgado um registro formal no aumento do número de passageiros desses países.
A entidade ainda diz em suas redes sociais que El Salvador se uniu à corrida pela afrofobia. Termo é definido como aversão e discriminação à África e aos africanos.
Bem, se parece e cheira a racismo, provavelmente é
African Stream
EL SALVADOR JOINS AFROPHIBIA RACE
-- African Stream (@african_stream) 5 de dezembro de 2023
Any African who has travelled around the world knows how difficult it is getting from point A to point B 'while African.' Before traveling to almost any country outside the continent, Africans are subjected to some of the most cumbersome visa? pic.twitter.com/6h57mt3Img
Com a cobrança antes mesmo do voo, viagens de pessoas dos países listados acaba desmotivada. Antes de efetuar o voo, as companhias aéreas têm de repassar as informações para o governo de El Salvador, incluindo origem, destino, nacionalidade e se as taxas são pagas.
Há tantos voos assim para os EUA?

El Salvador não está nem entre os 10 países com mais voos para os EUA em 2023. Segundo a OAG, provedora de dados e consultoria aeronáutica britânica, são eles:
- México: 22.894.853 assentos e 138.125 voos no ano
- Canadá: 17.803.565 assentos e 159.539 voos no ano
- Reino Unido: 13.029.561 assentos e 48.725 voos no ano
- Porto Rico: 6.674.813 assentos e 36.217 voos no ano
- Alemanha: 6.285.931 assentos e 21.712 voos no ano
- República Dominicana: 5.498.304 assentos e 30.978 voos no ano
- França: 5.238.295 assentos e 18.429 voos no ano
- Japão: 4.925.584 assentos e 19.770 voos no ano
- Países Baixos (Holanda): 3.442.568 assentos e 12.058 voos no ano
- Colômbia: 3.076.780 assentos e 17.633 voos no ano
- Jamaica: 3.044.114 assentos e 17.164 voos no ano
- Coreia do Sul: 3.036.922 assentos e 9.636 voos no ano
- Brasil: 2.888.087 assentos e 10.630 voos no ano
El Salvador registra 10.447 voos em 2023 e 1.208.195 de assentos disponibilizados segundo a OAG.
Aumento no fluxo de africanos para a América Central por via aérea é observado. Segundo Organização Internacional para as Migrações, órgão ligado à ONU (Organização das Nações Unidas), a quantidade de migrantes para a região que abandonaram a via terrestre e passaram a chegar de avião teve um aumento nos últimos tempos. Esses dados não se referem exclusivamente a El Salvador, mas a toda região.
Nacionalidades cobradas

Veja a lista de países de onde passageiros com aquela nacionalidade terão de pagar a taxa extra:
- Índia
- África do Sul
- Angola
- Argélia
- Benin
- Botsuana
- Burkina Faso
- Burundi
- Cabo Verde
- Camarões
- Chade
- Comores
- Costa do Marfim
- Djibouti
- Egito
- Eritréia
- Essuatíni
- Etiópia
- Gabão
- Gâmbia
- Gana
- Guiné
- Guiné Equatorial
- Guiné-Bissau
- Lesoto
- Libéria
- Líbia
- Madagascar
- Malaui
- Mali
- Marrocos
- Mauricio
- Mauritânia
- Moçambique
- Namíbia
- Níger
- Nigeria
- Quênia
- República Centro-Africana
- República Democrática do Congo
- República do Congo
- Ruanda
- São Tomé e Príncipe
- Senegal
- Serra Leoa
- Seychelles
- Somália
- Sudão
- Sudão do Sul
- Tanzânia
- Togo
- Tunísia
- Uganda
- Zâmbia
- Zimbabue
- * A companhia Avianca informa em seu site que passageiros de Somalilândia e Saara Ocidental também serão cobrados pela taxa de melhoria aeroportuária
O UOL entrou em contato com a presidência de El Salvador, com a Comissão Executiva Portuária Autônoma e com a embaixada de El Salvador em Brasília (DF) questionando a motivação da cobrança ser feita apenas de africanos e indianos, qual a porcentagem de passageiros desses países e como se posicionam quanto às acusações de que a medida é racista. Os órgãos não responderam até a publicação da reportagem.
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