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HRW recomenda ao legislativo brasileiro rejeitar reforma da lei dos agrotóxicos

20/07/2018 20h53

São Paulo, 20 Jul 2018 (AFP) - A organização Human Rights Watch (HRW) recomendou nesta sexta-feira (20) que o Brasil rejeite uma polêmica reforma da lei sobre agrotóxicos e estude com urgência um plano para reduzir o uso de pesticidas altamente perigosos.

"Ao invés de enfraquecer ainda mais as suas leis, o Brasil precisa urgentemente de um plano para reduzir o uso de pesticidas altamente perigosos", declarou à AFP o diretor associado do programa ambiental da HRW, Richard Pearshouse, no contexto da divulgação do relatório "Você não quer respirar mais veneno".

O relatório, que reúne 73 testemunhos de sete comunidades rurais coletados entre julho de 2017 e abril deste ano, recomenda estabelecer áreas de habitação humana e escolas livres de agrotóxico e suspender a pulverização aérea desses produtos até que o Executivo realize um estudo sobre o impacto para a saúde humana e ambiental.

Propõe também controlar a presença de pesticidas na água para consumo humano em comunidades indígenas e rurais, avaliar as escolas em risco de exposição a esses produtos químicos e rejeitar projetos de lei que "enfraquecem a estrutura regulatória brasileira de agrotóxico, incluindo o projeto 6.299/2002", batizado pelos críticos como "PL do veneno".

Este polêmico projeto, que visa a flexibilizar o uso de agrotóxicos, foi aprovado por uma comissão legislativa em junho e deverá ser submetido à plenária da Câmara dos Deputados.

O texto - originalmente redigido pelo empresário agrícola e agora ministro da Agricultura, Blairo Maggi, quando senador - deixa nas mãos de seu Ministério a competência para outorgar registros de agroquímicos, uma atribuição que atualmente depende também das pastas da Saúde e do Meio Ambiente.

Durante o debate, personalidades como a modelo Gisele Bündchen e o cantor Caetano Veloso usaram as redes sociais para se opor à aprovação.

Os produtores de pesticidas rejeitaram o relatório da HRW, indicando que o projeto de lei "não exclui o rigor científico e a transparência no processo de registro" destes produtos, segundo um comunicado enviado à AFP pelo sindicato Sindiveg e a associação Andef.

Os deputados que apoiam as mudanças afirmam que a lei que regula o registro e fiscalização de agrotóxicos, de 1989, está desatualizada e não atende às necessidades do setor.

- Problema nacional -"Em áreas rurais do Brasil, pesticidas pulverizados em grandes plantações estão envenenando as pessoas em suas casas e as crianças nas escolas. Este é um problema nacional", adverte Pearshouse, ressaltando a falta de áreas seguras nessas regiões.

Ele admite que o uso indiscriminado de agrotóxicos não é exclusivo do Brasil, mas que esse país é um dos maiores produtores agrícolas do mundo.

"O que acontece no Brasil tem uma escala diferente do que acontece em outros países", explica.

Desde 2008, o Brasil é o maior mercado mundial de agrotóxicos, segundo estudo da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO). Cerca de 80% desses produtos são utilizados na produção de soja, cana-de-açúcar, milho e algodão.

"Dos dez pesticidas mais usados no Brasil, quatro são proibidos na Europa", diz Pearshouse.

No entanto, Sindiveg e Andef, em seu comunicado, negaram que o Brasil seja o maior consumidor de agrotóxicos, citando dados da FAO segundo os quais o país ocupa o 13º lugar no planeta.

O Brasil "consegue fazer um uso racional de defensivos agrícolas e produzir muito mais usando uma quantidade menor" destas substâncias.

Esses cultivos "são utilizados principalmente como matéria-prima para produtos industrializados" como a produção de energia, roupas ou ração para animais, e não para o consumo humano, apontaram.

O relatório da HRW denuncia "a falta de dados confiáveis do governo sobre quantas pessoas no Brasil sofrem intoxicação por agrotóxicos".

Além disso, segundo o porta-voz da HRW, "as pessoas que relatam intoxicação por pesticidas temem ameaças" dos produtores.

Os rostos e nomes das pessoas retratadas no relatório foram protegidos para evitar consequências, as quais, em alguns casos, podem ser fatais, diz Pearshouse.