Por que fala de Bolsonaro sobre Petrobras abriu nova crise para o presidente
O presidente Jair Bolsonaro reafirmou nesta sexta-feira que fará "mudanças" na Petrobras após mais um reajuste no preço dos combustíveis.
Sem detalhar o que exatamente pretende fazer com a estatal, o presidente afirmou ainda, durante visita à cidade de Sertânia, em Pernambuco, que "jamais" interferiria "nesta grande empresa e na sua política de preços, mas o povo não pode ser surpreendido com certos reajustes".
Na quinta-feira (18/02), a Petrobras anunciou novo aumento nos preços da gasolina e do óleo diesel. Eles ficaram, respectivamente, R$ 0,23 e R$ 0,34 mais caros a partir de hoje. Com isso, o litro da gasolina nas refinarias passou a custar R$ 2,48 e o do diesel, R$ 2,58.
O reajuste, segundo a empresa, é reflexo da política de preços da estatal, que está alinhada ao mercado internacional, e "é fundamental para garantir que o mercado brasileiro siga sendo suprido sem riscos de desabastecimento pelos diferentes atores responsáveis pelo atendimento às diversas regiões brasileiras".
Bolsonaro já havia criticado ontem a Petrobras durante sua live semanal nas redes sociais e afirmado que estudava "mudanças", também sem dar pormenores.
Os comentários do presidente foram mal recebidos pelo mercado: as ações da empresa chegaram a cair 5% nesta sexta-feira. O mau humor se deve em parte à experiência recente de interferência do governo na estatal.
Entre 2011 e 2015, durante a gestão Dilma Rousseff (PT), a variação dos preços internacionais era repassada de forma defasada aos combustíveis no país, um mecanismo usado para tentar segurar o aumento da inflação.
Quando a conjuntura externa era desfavorável, a Petrobras chegou a importar combustível mais caro e vendê-lo mais barato no mercado interno.
Essa diferença gerou uma série de prejuízos para o caixa a estatal — uma conta que passou de R$ 75 bilhões no fim de 2014. A política orientada para o controle da inflação é apontada como uma das principais responsáveis pelo alto nível de endividamento da Petrobras no período, que chegou a US$ 124 bilhões.
Política de preços
Desde 2016 a Petrobras orienta sua política de preços pelo Preço de Paridade Internacional (PPI), que leva em consideração a cotação do barril de petróleo e o câmbio.
Quando foi estabelecida, os preços chegaram a variar quase que diariamente, seguindo a flutuação do mercado internacional. Em setembro de 2018, às vésperas da eleição daquele ano, esses reajustes passaram a ser quinzenais. E, em meados de 2019, deixaram de ter prazo fixo, passando a depender da avaliação da companhia sobre as condições de mercado e o ambiente externo.
A fórmula usada pela Petrobras para calcular a relação entre os preços praticados pela empresa no Brasil e o mercado internacional não é conhecida, abrindo a possibilidade para uma série de diferentes projeções sobre o futuro dos preços.
Independentemente do valor exato, analistas ouvidos recentemente pela BBC News Brasil destacaram que os preços internos estão defasados e, por isso, o caminho esperado seria de mais reajustes para cima.
A expectativa é de valorização do barril do petróleo, diante da previsão de manutenção da oferta restrita pela Opep (Organização de Países Exportadores de Petróleo) e pela Rússia e do crescimento projetado da economia mundial, com o avanço da vacinação contra a covid-19. A incerteza com relação ao dólar no Brasil, diante do desequilíbrio das contas públicas nacionais, também foi um fator apontado como combustível para novas altas nos preços.
Inflação ao consumidor
O percentual de reajuste da gasolina e do diesel nas refinarias não chega integralmente ao consumidor. Isso porque o preço ao consumidor é formado pelo valor nas refinarias, pelos impostos federais Cide e Pis/Cofins, o estadual ICMS e pelas margens de lucro da distribuidora e da revenda.
Assim, um mesmo reajuste de R$ 0,10, por exemplo, representa um percentual maior de variação no preço da refinaria, que é mais baixo, do que no preço na bomba, que é mais alto devido a todos esses itens adicionais.
A consultoria Triad Research, que coleta dados em postos de revenda de combustíveis, estima que a gasolina comum fechou janeiro a um preço médio de R$ 4,870 por litro para os consumidores, comparado a R$ 4,714 ao fim de dezembro, um aumento de 3,3%.
Já o diesel S10 estava em R$ 3,905 em 31 de janeiro, ante R$ 3,838 no último dia de 2020, alta de 1,7%.
Durante a transmissão da live na quinta, o presidente afirmou que o governo federal vai zerar os impostos federais sobre o diesel por dois meses a partir de março. Conforme os dados disponibilizados pela Petrobras para o diesel S-10 e coletados entre 31 de janeiro e 6 de fevereiro, esses impostos respondem por cerca de 9% do preço do combustível.
O governo tem sido pressionado há meses por caminhoneiros insatisfeitos com o valor pago pelo diesel na bomba. A categoria já chegou a ameaçar uma greve.
Ao afirma que "algo vai acontecer" na estatal, Bolsonaro disse ainda que "exigiria e cobraria transparência de todos aqueles que eu tive a responsabilidade de indicar".
Nos bastidores, acredita-se que as críticas do presidente sejam direcionadas ao presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco.
Impacto além dos motoristas
No Brasil, a gasolina pesa diretamente no bolso do consumidor de classe média que tem carro e dos trabalhadores que dependem de veículos automotores para seu sustento, como motoristas de aplicativos e entregadores.
Mas o impacto vai muito além de quem enche a tanque nos postos.
O diesel pesa no frete de todos os produtos transportados por rodovias — o principal modal usado no Brasil. Um custo de transporte mais caro é, via de regra, repassado aos preços finais e quem paga a conta são os consumidores.
Ele também influencia o preço do transporte público. Cerca de 30% do custo da passagem do ônibus urbano, principal meio de transporte no Brasil e com peso relevante no orçamento das famílias de baixa renda, é derivado do preço do diesel.
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