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Mercados ignoram incerteza alta no fim do ano

Mohamed El-Erian

05/10/2016 12h58

(Bloomberg) -- Os investidores estão se posicionando para o último trimestre do ano, e os mercados ainda não levaram em conta a incerteza que vem pela frente. Há três motivos para isso; todos estão relacionados com as dificuldades inerentes de definir com precisão os prêmios do risco neste contexto de incertezas econômica, financeira e política, pouco comuns.

1. A maior incerteza é política.

Em termos de risco sistêmico, a Europa é a fonte da maior incerteza política nos próximos meses: o governo da primeira-ministra Theresa May no Reino Unido estará envolvido em negociações tensas com outros integrantes da União Europeia em torno do Brexit, embora a própria UE esteja enfrentando divisões internas cada vez maiores relativas à imigração. Além disso, a Itália realizará em dezembro um referendo que poderia definir o destino do governo do primeiro-ministro Matteo Renzi. Enquanto isso, os problemas de dívida da Grécia continuam piorando, e a popularidade da chanceler Angela Merkel, líder mais influente da região, está sendo colocada à prova pela crise de imigração.

Essa imprevisibilidade é particularmente difícil porque põe em dúvida princípios há muito tempo vigentes de interação econômica regional, inclusive as instituições e normas que governam a circulação transfronteiriça de bens, mão de obra e serviços financeiros.

A eleição presidencial atípica dos EUA também expõe a economia americana a uma incerteza política pouco comum. Embora ambos os candidatos tenham indicado que desejam se afastar da adoção entusiasta do comércio internacional que fortaleceu o papel econômico dos EUA no mundo, Donald Trump foi muito além ao defender impostos de importação punitivos para China e México. Caso ele vença em novembro, e cumpra a promessa de castigar o comércio, haveria um risco significativo de que os parceiros comerciais tomem medidas de retaliação, que poderiam gerar a ameaça de contração da atividade econômica.

Até o momento, os mercados basicamente desconsideraram essas incertezas. A julgar pelo passado, o discurso político, especialmente durante campanhas eleitorais acaloradas, nem sempre se traduz em ação. Além disso, considerando a natureza binária dos resultados possíveis de alguns desses acontecimentos (como o referendo italiano), os prêmios de risco adequados ficam ainda mais difíceis de definir. Por último, há algum tempo os investidores têm podido confiar em injeções de liquidez excepcionais para conter e reverter os surtos ocasionais de volatilidade provocados pela política.

2. Os bancos centrais foram os mais eficientes na repressão da volatilidade.

Com o uso de um conjunto cada vez maior de medidas pouco convencionais, essas instituições têm conseguido dar impulso ao preço dos ativos financeiros e reprimir a volatilidade do mercado -- diretamente, através de compras de ativos em grande escala, e indiretamente, ao induzir os investidores a assumir riscos maiores de investimento e as empresas a recomprar ações. Ambas as influências contribuíram para a mentalidade de "aproveitar a queda dos preços para comprar", que funcionou como um estabilizador interno adicional.

No entanto, agora existe uma sensação cada vez mais forte de que a efetividade dessas medidas tomadas pelos bancos centrais pode estar diminuindo. Um motivo é que há evidências de que aumenta o temor entre algumas autoridades em relação ao risco de gerar instabilidade financeira no futuro (a julgar pelas três que discordaram na última reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto, este temor pode estar provocando uma discussão ativa dentro do Fed). O questionamento da política é muito mais intenso no Japão, onde um número crescente de indicadores sugere que a efetividade da política do banco central ficou seriamente abalada e corre o risco de se tornar contraproducente.

Durante este trimestre, os investidores terão mais indícios sobre se o centro de gravidade do Fed acabará tendendo a um aumento do juro e se as novas medidas de estímulo do Banco do Japão realmente são contraproducentes. Mas o indicador mais importante virá do Banco Central Europeu, que enfrentará uma nova série de obstáculos ao tentar proteger os mercados da política mais complicada na região e de uma economia persistentemente fraca. É possível que se questione por quanto tempo essa instituição poderá desempenhar este papel com eficiência, particularmente ao enfrentar pressões políticas maiores.

3. Os aspectos econômicos de um período prolongado de baixo crescimento estão se tornando mais imprevisíveis.

Mais uma série de revisões desfavoráveis, apesar de relativamente pequenas, às projeções econômicas globais do Fundo Monetário Internacional serve de lembrete de que o crescimento continua baixo no mundo avançado e tem uma repercussão negativa em outros países.

A hipótese de trabalho entre a maioria dos economistas é que esse desempenho medíocre pode persistir durante anos de forma relativamente estável. Não tenho certeza de que essa previsão seja correta porque, quanto mais o "novo normal" persiste -- e ele está entre nós há cerca de sete anos --, mais ele parece estar criando as causas de sua própria destruição.

Um dos grandes riscos econômicos aqui é que as famílias se tornem, assim como as empresas, mais cautelosas e adiem algumas decisões de consumo. Se isso acontecer, contribuirá para uma diferença ainda maior entre a fraca apetite pelo risco econômico e a forte apetite pelo risco no mercado financeiro. Isso acrescentaria um elemento de instabilidade financeira de que a economia global foi essencialmente poupada durante alguns anos.

Esses acontecimentos sugerem maior volatilidade no mercado no último trimestre do ano. O segmento mais sensível será o mercado cambial, principalmente por causa das incertezas políticas e econômicas incomuns que estão afetando relações comerciais profundamente arraigadas nas estruturas econômicas e financeiras. Este é também o segmento do mercado que, pelo menos relativamente, é menos sensível à supressão da volatilidade dos bancos centrais.

Mas o que começa no mercado cambial provavelmente se espalhará para ações, commodities, títulos corporativos e, em menor grau, também para títulos soberanos.

Depois de um terceiro trimestre tranquilo, os mercados deveriam se preparar para uma volatilidade maior nos últimos três meses do ano. Seria prudente que os investidores incorporem em seus cálculos de investimento prêmios maiores de risco de incerteza e que deem preferência a carteiras menos expostas à volatilidade e a saldos de caixa maiores. Desta forma, eles poderão se preparar melhor para uma proposta de mercado enviesada de risco e rentabilidade.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.