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Custo real de voar da Ryanair vem à tona: Bloomberg Opinion

Lionel Laurent

23/07/2018 15h34

(Bloomberg) -- A Ryanair Holdings deveria ser a empresa aérea que todo passageiro ama odiar, mas continua usando mesmo assim. Com passagens tão baratas, quem se importa com um travesseiro confortável ou com os amendoins de cortesia? O CEO Michael O'Leary consegue há anos tirar o foco da insatisfação dos funcionários e dos comentários ruins dos clientes ressaltando que os números de tráfego não param de crescer. Esse fator, aliado à feroz disciplina nos custos, tem mantido os investidores contentes.

Mas assim como os passageiros cansaram do tratamento da empresa há alguns anos, os pilotos e outros funcionários da aérea também parecem cada vez menos dispostos a aceitar salários e condições ruins. A tentativa de encaixar isso com a concorrência intensa nas tarifas no setor está pressionando a empresa aérea, especialmente em meio à sua contínua e vertiginosa expansão.

As ações da empresa, estagnadas há cerca de um ano, chegaram a cair 6 por cento nesta segunda-feira depois que a companhia divulgou um declínio de 20 por cento no lucro do primeiro trimestre. A empresa culpou as greves e a ameaça de futuras disputas trabalhistas, que têm dissuadido os clientes de reservar voos. A aérea foi obrigada a reduzir os preços das passagens e pode ter que repetir a medida.

A questão na maior empresa aérea da Europa é como manter a lucratividade em meio a uma expansão tão rápida. A empresa pretende totalizar 200 milhões de clientes em 2024, contra 130 milhões atualmente. Para isso, precisará efetuar mais investimentos e abrir mais rotas em um momento em que as concorrentes estão reduzindo os preços das passagens e levando adiante expansões agressivas.

Somando a isso as pressões de custos, tanto com salários quanto com os preços crescentes dos combustíveis, se vê por que os investidores da Ryanair estão se preparando para uma ocorrência bastante rara: uma queda nos lucros anuais. O lucro ajustado por ação para o período de um ano até março de 2019 deverá cair 6 por cento, segundo o consenso da Bloomberg para as estimativas dos analistas, algo que ocorreu pela última vez em 2014. Naquela época, O'Leary estava se acostumando à ideia de que ser mais agradável com os clientes não era tão ruim. A subsequente tentativa de conquistá-los ajudou a colocar o lucro de volta nos trilhos.

Ainda existe uma boa chance de que a Ryanair consiga superar essas pressões melhor que a maior parte das outras empresas. O excesso de capacidade, os custos dos combustíveis e os salários crescentes são um problema do setor ligado ao ciclo econômico, e a Ryanair parece um modelo de eficiência quando comparada a algumas concorrentes. Sua margem operacional de 12 meses é de quase 22 por cento, praticamente o dobro da margem da EasyJet, segundo dados da Bloomberg.

Mas o risco do histórico de corte de custos da Ryanair é que ele deixa O'Leary confiante demais em um momento de dinheiro barato e opulência no setor em termos de aumento de capacidade, embora esteja ficando mais difícil reduzir as despesas.

É possível entender por que ele talvez não queira reduzir a expansão cedo demais, por medo de dar uma vantagem às concorrentes. Mas, apesar da expectativa de alta das receitas, essa margem operacional está sob pressão. Daniel Roeska, analista da Bernstein, descreve a Ryanair como uma empresa "fadada a crescer".

O'Leary diz que as chances de ele manter ou deixar o cargo de CEO após seu 25º aniversário na função, no ano que vem, são de 50 por cento, e talvez ele queira sair em alta. Parece que será mais fácil alcançar esse objetivo com os números de passageiros do que com os preços das ações.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial nem da Bloomberg LP e de seus proprietários.