Falta de laranjas pressiona indústria de sucos a lançar sabores misturados

A redução global da oferta de laranja, fruta que domina o paladar do brasileiro, tem feito a indústria de sucos naturais quebrar a cabeça para lançar novos produtos. Agora, a bola da vez são as opções mistas, que adicionam um segundo sabor de fruta, e aos poucos ganham mais espaço na gôndola de supermercados.

Vai laranja com o quê?

O investimento em novos sabores junta inovação e necessidade. A combinação de duas ou mais frutas, chamada pela indústria de "blend", chegou no país na década passada sob influência do mercado norte-americano. Mas foi só agora, com a menor disponibilidade da laranja no Brasil, que as empresas aceleraram a atualização do portfólio. A produção de laranja tem sofrido com condições climáticas desfavoráveis e a presença do greening.

Essa é uma aposta que tem dado certo até o momento. A gerente de marketing da Xandô, Débora Gasperi, afirma que a bebida de tangerina com laranja, lançada em 2023 é o terceiro sabor mais vendido da marca, atrás justamente de laranja e uva, campeões de preferência.

Ela diz que a escassez da fruta cítrica tem forçado a entrada de novos produtos. Tangerina com laranja é apenas um dos sabores mistos da linha de sucos da Xandô, que ainda conta com a opção mix: laranja, abacaxi, cenoura e gengibre, que entrou nas prateleiras em 2021. Mas a versão com tangerina conta com um trunfo: consumidores estão dispostos a pagar um pouco mais por uma bebida industrializada que mais se aproxima do gosto natural da laranja.

Eu tenho acompanhado uma movimentação de algumas empresas na Europa que querem reduzir o percentual de suco nas suas bebidas. Nós na Xandô vamos fazer o suco 100% e buscar outras frutas para misturar justamente para não vendermos refresco ou néctar.
Débora Gasperi, gerente de marketing da Xandô

A Natural One também está de olho nessa fatia de mercado. O diretor de marketing Gustavo Siemsen apostou no lançamento do sabor de laranja com maçã no verão passado, mas se surpreendeu também com a queda na produção dessa segunda fruta. A subida de preços se tornou inevitável.

O que explica a encolhida na produção de laranjas

A quebra da safra em 2023/24 tem duas explicações: clima e greening. Os produtores rurais, concentrados em São Paulo e no Triângulo Mineiro, foram castigados pela falta de chuvas que atrasou o plantio e uma doença transmitida por um inseto que "suga" a produtividade da laranja e se espalha rapidamente pelos pomares.

A combinação desses fatores prejudicou o campo. A safra de laranja do cinturão citrícola—região que compreende São Paulo e Triângulo Mineiro e responde por cerca de 80% da produção nacional— foi de 307,22 milhões de caixas de 40,8 kg, 2,2% a menos do que em 2023, segundo o Fundecitrus (Fundo de Defesa da Citricultura). Essa quantidade equivale a 12,5 milhões de toneladas da fruta.

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Mas nem todas as frutas colhidas são saborosas. Embora seja uma doença preocupante, as laranjas infectadas pelo greening podem ser consumidas sem trazer problemas à saúde. A diferença está no sabor da fruta, geralmente mais ácido, aponta Rodrigo de Mattos, analista e bebida e tabaco da Euromonitor.

Ele diz que o consumidor tem percebido a mudança no sabor. "A indústria tem sofrido um problema de padronização, em especial desde 2023, e começa a introduzir esses blends. Não temos expectativas de que isso vá mudar tão cedo", declara Mattos, que completa: "É reflexo de uma necessidade e ao mesmo tempo de experimentação."

Laranja é carro-chefe

O mercado de sucos naturais movimenta R$ 5,3 bilhões no Brasil. De acordo com a Euromonitor, laranja foi o sabor mais vendido no ano passado. Maçã e uva ocuparam a segunda e terceira posições, respectivamente. Mas um dado chama atenção: a consultoria rastreou um crescimento de 27% na disponibilidade de sucos mistos em 2023 em comparação com o ano anterior.

No passado, a empresa misturou laranja com outros sabores. Mas a complexidade no manuseio da cenoura e a escalada no preço da acerola anteciparam a saída de ambas as opções dos pontos de venda. Portanto, sem previsão de retorno. Mesmo com as limitações, a Natural One lançará em breve um sabor que pretende despertar a curiosidade do consumidor: a mistura da batata yacon com outros ingredientes.

Nós estamos com uma dificuldade enorme em encontrar laranja boa em um preço que o consumidor queira pagar. O clima tem afetado a produção de frutas em todo o mundo. No caso da laranja, pegamos uma fruta mais ácida e ressecada, que não faz mal à saúde, tiramos o suco dela e misturamos com uma mais doce que a média. É um trabalho de louco (risos).
Gustavo Siemsen, diretor de marketing da Natural One

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A empresa tem provado também uma espécie de sabor amargo. Siemsen diz que a Natural One está próxima de atingir a capacidade de produção, de 11 milhões de litros de sucos ao mês, e sobra pouco espaço para pensar em novos produtos. "Eu preciso priorizar o que tem mais volume", finaliza ele, acrescentando que o suco de laranja representa mais da metade das vendas.

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