Até com reabertura, recuperação é muito lenta
O PIB da China veio em linha com o que o sr. esperava?
Sim. A questão agora é quão rápido vai melhorar. As perguntas principais são se a China conseguirá fazer o setor de pequenos e médios negócios voltar e quão pesada será a queda das exportações. As exportações chinesas para Europa e EUA podem cair entre 20% e 40%. Hoje, a China está rodando entre 80% e 90% do nível de sua atividade normal. Isso não parece tão ruim, mas há dados que sugerem que apenas 40% dos negócios pequenos voltaram. A China parou quase todas as atividades há três meses. Depois de seis semanas, começou a reabrir algumas coisas e, outras seis semanas depois, ainda está rodando abaixo do nível normal. Voltar a 100% pode levar vários meses. A mensagem básica é que, até se você começar a reabrir a economia, a recuperação é muito lenta.
Que mudanças devem ocorrer no comércio e nas organizações internacionais após a crise?
Há um argumento que diz que a crise prova que a globalização é um problema, que é preciso fazer mais coisas em casa. O outro argumento, como o qual concordo, é que você precisa ter cooperação global e que instituições internacionais ajudam a gerenciar uma pandemia. Nessa linha, é preciso de cadeias de fornecimento que não sejam fragmentadas, pois, se cada país tiver sua própria rede, alguns países terão muito, outros pouco e conseguir as coisas em alguns lugares vai ser difícil e caro. Deve haver um grande debate sobre isso daqui em diante.
O anúncio de que os EUA não vão mais colaborar com o financiamento da OMS já não indica que estamos caminhando para uma menor colaboração?
O que vejo nos EUA é um governo controlado por um nacionalismo econômico aliado a um lobby de segurança nacional. Mas, contra isso, você tem uma comunidade empresarial forte que investe na globalização. Haverá uma discussão entre esses grupos, mas não se pode prever o que acontecerá.
Podemos prever como será a relação entre EUA e China depois disso tudo?
Isso sim, porque está piorando e vai ficar ainda pior. Há uma briga para controlar a narrativa. Os EUA estão ocupados em levantar narrativas de que a culpa da epidemia é da China ou da OMC, e isso é apenas um discurso para desviar a atenção da incompetência de resposta dos EUA. Na China, o governo tem uma narrativa de que fez tudo pelos cidadãos e que é maravilhosa, o que subestima os erros que cometeu antes de dar uma resposta ao vírus. Acho que a visão linha dura dos EUA é de aproveitar essa oportunidade para reforçar a ideia de que a China não é confiável. E, na China, eles estão pensando: tudo bem, isso enfatiza que não temos de focar em cooperar com os EUA. Se você olhar a campanha presidencial, Trump quer fazer com que Joe Biden pareça mais fraco quando o assunto é China. O papel que a China terá na campanha é o de uma força negativa. Por isso, a relação entre os países vai piorar. Isso é preocupante, porque, se você quer mais coordenação global, EUA e China têm de liderar esse caminho.
Isso muda se Trump perder a eleição?
Se Biden ganhar, não deve haver ênfase em guerra comercial e tarifas, mas não sei se ele será capaz de reverter a situação. A relação pode parar de piorar, mas a melhora será modesta.
Analistas acham que a China pode se tornar um líder global depois da crise, dado que respondeu melhor ao vírus. Concorda?
Não. Na crise financeira de 2008, muita gente previu um declínio dos EUA e que, em dez anos, a China seria a líder global. Dez anos depois, os EUA continuaram sendo uma economia maior e, de longe, mais poderosos que a China. A China teve ganhos, mas foram moderados. Agora deve ocorrer algo parecido. Inicialmente, a China parece estar indo muito bem, conseguiu controlar as coisas, enquanto os EUA parecem estar no caos. O sistema americano é dinâmico e resiliente. Depois de um período confuso, ele descobre como colocar as coisas de volta aos trilhos, enquanto a China é fundamentalmente mais rígida. Mas, claro, a China deve ganhar um pouco mais de prestígio e credibilidade depois de mostrar que seu sistema é eficiente. É um ganho para a China, mas não muda a relação de poder entre os dois países.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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