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Eletrobras tem interesse em permanecer nos ativos nucleares pós-privatização

Luciana Collet e Wellington Banhemann

São Paulo

02/10/2020 15h02

O presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Junior, demonstrou o interesse em continuar com uma participação nos ativos de energia nuclear após a privatização da companhia, cujo projeto de lei está em tramitação no Congresso Nacional. "Não tenha dúvida. A Eletronuclear era uma empresa que estava com muitas dificuldades e fizemos tudo o que tinha que ser feito para deixar a empresa na condição que está agora", afirmou o executivo, que participou nesta sexta-feira do Encontro Nacional dos Agentes do Setor Elétrico (Enase), promovido pelo Canal Energia.

Como exemplo, o executivo citou que, há pouco mais de um mês, o conselho de administração da estatal federal capitalizou todas as dívidas que a Eletronuclear tinha com a Eletrobras. "As duas usinas, Angra 1 e 2, estão entre as dez nucleares com maior nível de disponibilidade no mundo nos últimos dois anos. Essas duas usinas produzem R$ 1,2 bilhão de Ebitda por ano", afirmou Ferreira Junior. "Já é uma operação viável e, com Angra 3, fica extremamente viável", acrescentou.

O grande desafio da Eletronuclear é a conclusão das obras de Angra 3, hoje paralisadas. Ferreira Junior lembrou que o Conselho de Administração da Eletrobras aprovou um programa de aceleração do caminho crítico, que prevê a conclusão das obras até 2026. "Estamos investindo em torno de R$ 3,5 bilhões nos próximos 18 meses e vamos chegar com 70% das obras concluídas, quando faremos uma licitação internacional de um EPC para concluir de forma definitiva a obra", afirmou.

Segundo o executivo, a publicação da medida provisória (MP) nº 998/20, também em tramitação no Congresso Nacional, traz mais segurança jurídica para a construção de Angra 3. No que diz respeito à usina nuclear, a MP teve por finalidade possibilitar a estruturação financeira do empreendimento para a sua conclusão. Entre as propostas contidas no texto estão a concessão de uma outorga de autorização para a usina, o estabelecimento de critérios para a definição do preço de energia, a assinatura de um novo contrato para a comercialização, a previsão de cláusulas de reajuste e revisão extraordinária, entre outros pontos.

"Angra 3 é uma obra possível, é uma obra viável e uma obra financiável", reforçou Ferreira Junior. Em 2018, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) fixou em R$ 480/MWh o preço de referência da energia da usina. "Temos um enorme interesse em continuar esse projeto, que nós conseguimos resgatar. É uma fênix mesmo", disse o executivo, em referência à ave mitológica que renasce das cinzas.

Recentemente, a Eletrobras anunciou, no âmbito do processo de capitalização, que a União deve comprar 25,5% do capital total da Eletronuclear, participação equivalente a 51% das ações ordinárias, assumindo o controle acionário da empresa - como a exploração da atividade nuclear é monopólio da União, a Eletrobras privatizada não poderia ter o controle acionário da Eletronuclear.

"Nos debates anteriores, a forma de você fazer a retomada de Angra 3 era atrair um investidor privado. Ele já vai lá estar sentado, que é a Eletrobras. Com esses aperfeiçoamentos da MP 998, que dá segurança aos PPAs (contratos) da companhia e as condições tarifárias, isso é perfeito. Acreditamos muito no projeto. Temos condições de ser o investidor privado", argumentou.

Capitalização

Os ajustes discutidos no projeto de lei sobre a capitalização da Eletrobras visando atender a pleitos de bancadas regionais, como a do Norte, são a solução para avançar no projeto, avalia o presidente da Eletrobras.

Ferreira Junior disse não ter preocupação com os ajustes, que vem sendo discutidos com o Senado desde o início do ano, em movimento encabeçado pelos ministros de Minas e Energia, Bento Albuquerque, e da Economia, Paulo Guedes, quando passaram a reforçar a importância do destravamento da pauta no Senado. "O governo agiu em criar condições e mostrar disponibilidade de seguir em um debate positivo da agenda para que seja finalmente colocada em solução", comentou.

Segundo o executivo, deverão ser incorporados no projeto as "convergências que tenham sido obtidas da conversa, do diálogo e do debate com as principais lideranças do Senado", comentou. Ele evitou citar prazo para apresentação dos ajustes, mas sugeriu que a questão tenderia a ser tratada após as eleições municipais.

Ferreira Junior reforçou a possibilidade de o tema passar a avançar primeiramente no Senado, e então na Câmara, afastando o entendimento de que o tema teria que ser obrigatoriamente apreciado inicialmente pelos deputados. "Existe, tanto em uma Casa como na outra, hoje, uma consciência critica que pode iniciar processo e ser complementado na outra Casa. Aquela que puder iniciar com mais brevidade é melhor, e a outra vai se preocupar em complementar projeto no que for necessário para que seja aprovado", disse.

Dentre os temas já trazidos a público estão a criação de um fundo para o Norte, para questões ligadas à energia na Amazônia, e a criação da "golden share".

Ferreira Junior também comentou que a Medida Provisória 998 já trouxe questões, relacionadas às tarifas distribuidoras privatizadas da região Norte, que vinham sendo discutidas para avançar. "Essa discussão já vinha em já em curso e houve sensibilidade do governo em propor essa medida e criar condições", disse. "Esse é um mitigador, mas existem outros temas. Acho que isso é só uma demonstração de que está havendo as discussões necessárias, está havendo as deliberações e isso é algo que, feito mesmo agora, antecipa essas soluções e torna mais fácil o transcorrer desse processo de aprovação, na sequência (da MP), em uma das duas casas", completou.

Sobre a Golden share, o presidente da Eletrobras lembrou que inicialmente a medida foi proposta, e minimizou a possibilidade de que a reintrodução da ação especial tirar valor da companhia. "O que esta sendo demandado é condições de manter o nome da Eletrobras, que tenha poder de evitar qualquer tipo de operação de aquisição hostil dentro da companhia, são poderes que, se bem administrados, não tem problema nenhum, temos isso aqui na própria Embraer e na Vale", avaliou.

Ferreira Junior reiterou sua visão de que seria possível efetivar a operação de aumento de capital no segundo semestre do ano que vem, como anteriormente já indicado. "Podemos fazer no segundo semestre (de 2021) com absoluta tranquilidade, se a gente tiver a aprovação no primeiro semestre", disse, salientando que a empresa precisa de cerca de 120 a 150 dias para realizar a capitalização, dado o tamanho da companhia e o fato de se planejar uma operação no Brasil e no exterior.