Em 15 anos, indústria brasileira vai de 9ª para 14ª no mundo
Nos últimos 15 anos, a indústria brasileira foi da 9ª posição, entre as maiores do mundo, para a 14ª No mesmo período, a participação do país na manufatura global caiu quase pela metade: de 2,2% para 1,3%, segundo o Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial).
Entre outros problemas, duas crises fortes e sequenciais — a de 2015/2016 (do governo Dilma) e a de 2020 (da pandemia) —, ceifaram empregos, lançamentos, inovação e investimentos, que de tão pequenos foram incapazes de repor a depreciação das fábricas.
Com menos força, o valor que adicionam à economia encolheu 1,5% ano após ano, entre 2005 e 2020.
Parte considerável dos países emergentes foi na direção oposta, como mostra o amplo estudo do Iedi. Agora, o pós-pandemia tende a agravar a situação, com as nações desenvolvidas trabalhando para levar a indústria de volta a seus territórios.
"Em poucos meses, a pandemia criou um pandemônio em toda a cadeia global de produção, logística e comércio", diz Glauco Arbix, coordenador da área de humanidades do Centro de Inteligência Artificial da USP (Universidade de São Paulo).
As grandes economias perceberam a importância de ter fábricas perto do consumidor, para depender menos da logística globalizada. Glauco Arbix, coordenador do Centro de Inteligência Artificial da USP
A resposta das grandes potências, diz Rafael Cagnin, economista do Iedi, foi rápida.
A estruturação dos planos de Joe Biden, nos EUA, o de recuperação da União Europeia e o quinquenal de crescimento da China, com ações práticas, detalhadas — e um volume gigantesco de dinheiro —, reforçou o dinamismo econômico do hemisfério Norte, que tende a ganhar musculatura e a dar um novo salto.
"Longe geograficamente desse eixo econômico dinâmico, todo o restante do mundo é coadjuvante, inclusive o Brasil e a América Latina", diz Cagnin. "Nessa nova realidade, ser um mercado potencial não basta: é preciso concretizar e tornar realidade a promessa", afirma.
O fechamento de fábricas de multinacionais no país em plena pandemia é um dos sinais dessa mudança de eixo e dessa espécie de "cansaço" — e o reposicionamento das cadeias globais.
Para ficar em alguns exemplos, encerraram linhas de montagem no Brasil: Ford, Mercedes-Benz, LG e Sony.
"A pandemia só reforçou um movimento dos últimos dez anos, de recalibragem do processo tecnológico, que é a essência da indústria 4.0, com a modernização de todas as atividades econômicas", diz Cagnin.
Com a mudança estrutural, dizem os especialistas, o risco é a manufatura brasileira passar de pequena para totalmente irrelevante.
Ao se tornar ainda mais suscetível às instabilidades das commodities, o país tende a manter o crescimento pífio e a criar vagas mal remuneradas.
"Não menos honrosos, os empregos de baixa qualificação têm salários condizentes com o que produzem", diz Arbix. "Essa situação condena o Brasil a ser um País de renda média — e à profunda desigualdade", pontua.
Básico
Apesar de parte dos fabricantes locais tentarem acompanhar a indústria 4.0, nem tudo depende da iniciativa privada. Como em várias outras frentes, faltam políticas de Estado que deem condições para a execução de estratégias.
"Qual o sentido de colocar sensores, robôs e inteligência artificial na produção, se a internet ou a energia caem quando chove?", afirma Cagnin.
"Como é possível avançar em direção à sustentabilidade, se é preciso ligar um gerador movido a óleo com a ameaça de falta de energia?", indaga.
Na prática, além da falta de infraestrutura, a agenda do governo voltada à inovação, produtividade, competitividade e integração internacional também tem tido pouca efetividade. "A Câmara Indústria 4.0, por exemplo, não teve ações efetivas de impacto", diz Cagnin.
"O programa Brasil Mais, para melhorar a produtividade de micro, pequenas e médias empresas, é tímido e não deslancha", acrescenta.
O ambiente de negócios e a redução do custo Brasil continuam travados. Também não há uma estratégia clara e ordenada para a integração internacional. "Esses programas sempre têm muito marketing, mas poderiam oferecer alguma ajuda", diz Arbix.
"Mas, com o governo em situação de paralisia e preocupado com a reeleição, o aparato público é desmobilizado e o setor empresarial, que cresceu sob as asas do Estado, mas tem muitos obstáculos, sofre", pontua.
Se deixa de ajudar por um lado, o governo prejudica até mesmo em uma das áreas na qual o setor produtivo nacional se modernizou: o financiamento privado.
Com a mudança de direcionamento dos recursos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), que reduziu empréstimos a grandes grupos, as empresas tiveram de aprender a captar recursos no mercado.
"Foi um aprendizado, possível quando os juros entraram no lugar e o BNDES saiu: muitas empresas passaram a entender o mercado de dívidas, quem são os agentes, os procedimentos e critérios econômico-financeiros a serem considerados", afirma Cagnin.
"Não é algo que acontece da noite para o dia, principalmente quando a pandemia joga areia no processo", diz.
Após seis anos de ambiente adverso, quando as empresas começaram a avançar, a volatilidade causada pelos ruídos políticos e o maior risco fiscal ameaça esse caminho.
Um banqueiro de investimentos, que pede para não ser identificado, enxerga o próximo ano com empresas fazendo menos ofertas de ações e emitindo mais títulos de dívida, mas sem crescimento da demanda por recursos, por conta de uma alta do PIB quase nula.
Além disso, com a Selic e os riscos mais altos, o dinheiro fica mais caro.
"É uma trajetória de fôlego curto porque o setor financeiro, para investir e liberar crédito, precisa ter garantia de retorno e previsibilidade — nada que esteja no radar", diz Arbix.
"O Brasil tem exceções, mas suas empresas têm pouco músculo e não conseguem quebrar esse ciclo perverso sozinhas, para a recuperação da confiança", conclui.
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