Bolsonaro adia repasse da cultura para 2023, mas não inclui recursos no orçamento
O presidente Jair Bolsonaro (PL) adiou os repasses da Lei Paulo Gustavo para 2023, mas não colocou os recursos necessários para cumprir as despesas no Orçamento do ano que vem. Na prática, o setor cultural ficou sem o dinheiro garantido mesmo com o adiamento.
No final de agosto, Bolsonaro assinou uma medida provisória prorrogando o repasse de R$ 3,862 bilhões destinados ao setor cultural, aprovados por meio da Lei Paulo Gustavo, para 2023, mas colocou apenas R$ 300 milhões na proposta orçamentária. A lei anterior, alterada pela MP, obrigava o governo a transferir os recursos ainda neste ano.
Ao editar a medida provisória, o Executivo não só adiou as despesas, mas também tornou o repasse meramente autorizativo, sem obrigação com o valor estabelecido. A mesma medida provisória prorrogou os repasses da Lei Aldir Blanc 2 - um total de R$ 3 bilhões - para 2024. A manobra abriu espaço para o governo liberar imediatamente verbas do orçamento secreto que estavam travadas.
"Importante observar que a medida provisória não apenas adiou o pagamento, mas de fato alterou o montante. A redação original era de um valor certo de despesa. Com a MP, isso passou a ser um teto. Para todos os fins práticos, houve um esvaziamento da Lei Paulo Gustavo", afirmou o consultor do Senado Vinicius Amaral. A MP autoriza o governo a adiar o repasse novamente no ano que vem, para 2024.
A mesma medida provisória adiou outros R$ 2,5 bilhões destinados ao setor de eventos, dinheiro que seria repassado como indenização a empresas do segmento que perderam faturamento durante a pandemia de covid-19. O governo, no entanto, não colocou os recursos necessários na proposta orçamentária, que recebeu apenas R$ 300 milhões para a despesa.
Tanto o dinheiro da Lei Paulo Gustavo quanto o socorro ao setor de eventos ficaram no guarda-chuva das emendas de relator-geral, que alimentam o orçamento secreto. Na prática, vincular esses repasses às emendas deixam os recursos sem garantia de execução. A verba é controlada pelo Congresso, que pode colocar o dinheiro em outras áreas, conforme o interesse dos parlamentares.
Se o Congresso quiser recompor os repasses do setor cultural e de eventos integralmente, terá que cortar outras despesas durante a votação do Orçamento, que deve avançar só depois das eleições presidenciais. "O Congresso teria que fazer cortes em outras despesas primárias sujeitas ao teto ou alterar o teto para conseguir expandir essas despesas", diz o consultor.
Ciência e tecnologia
Uma segunda medida provisória assinada por Bolsonaro limitou os repasses da ciência e tecnologia estabelecidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), após o Congresso ter aprovado uma lei que proibiu cortes nesse financiamento. Com isso, o governo colocou R$ 4,2 bilhões do fundo em uma reserva financeira que, na prática, não será usada.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), é pressionado a devolver as duas medidas provisórias, o que obrigaria o governo federal a honrar os repasses ainda em 2022. Na semana passada, ele se reuniu com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para conversar sobre o assunto, mas os dois não chegaram a um acordo.
Pacheco não devolveu as medidas provisórias, o que, na avaliação da Advocacia do Senado, só poderia acontecer com flagrante descumprimento da Constituição, e deu o pontapé para a tramitação das propostas. Ainda assim, o senador cobra a liberação dos recursos ainda neste ano, conforme as leis aprovadas pelo Congresso. Pacheco vai aguardar uma solução da equipe econômica antes de decidir o que fazer com as medidas provisórias. Uma nova flexibilização no teto de gastos, regra que atrela o crescimento das despesas à inflação, em 2022 entrou no radar.
Depois de assinar as duas medidas provisórias, o presidente Jair Bolsonaro editou um decreto na véspera do feriado de 7 de Setembro e permitiu a liberação de verbas do orçamento secreto que estavam bloqueadas em função do teto de gastos. A manobra fez o governo liberar R$ 3,5 bilhões em emendas até esta terça-feira, 13, dinheiro que começará a ser empenhado (fase anterior ao pagamento) pelos ministérios. Parlamentares querem garantir os recursos antes do primeiro turno das eleições, marcado para 2 de outubro. O PSOL entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) para barrar esse decreto.
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