Navios-usina recebem cerca de R$ 300 milhões por mês, mas não pagam multa de R$ 843 milhões
Paralelamente, a companhia foi à Justiça e conseguiu liminares que impediam a cobrança de multas pelo descumprimento do cronograma previsto nas regras do leilão.
Em meio à celeuma jurídica, a Karpowership acabou por concluir as instalações para transmitir a energia a partir das usinas térmicas instaladas sobre seus navios e, assim, passou a ser remunerada por isso. Em janeiro, a empresa recebeu R$ 394 milhões. Em fevereiro, estavam previstos mais R$ 259 milhões para o caixa. Paralelamente, porém, a companhia deixou de pagar R$ 843 milhões devido ao atraso nas operações e o descumprimento dos compromissos assumidos em contrato.
A Aneel reagiu. No início deste mês, a Justiça Federal atendeu aos pleitos da agência para garantir recursos para o pagamento das multas. Pela decisão liminar, os navios da empresa não podem sair do Porto de Itaguaí, no Rio de Janeiro, até uma nova decisão judicial. O juiz determinou ainda que 25% das receitas que a KPS recebe pela geração de energia devem ser retidos.
A Justiça autorizou a empresa a receber os R$ 259 milhões previstos para fevereiro, mas já com o abatimento de 25%. A Aneel afirmou, no processo judicial, que a situação poderia "trazer danos irreversíveis à administração, bem como aos cidadãos, caso permanecessem os repasses mensais à empresa turca, que não paga as multas com respaldo de decisões judiciais".
"De um lado, a KPS começou a gerar energia elétrica e a receber a receita de venda dos contratos. De outro lado, a KPS tem se esquivado do cumprimento das obrigações editalícias e contratuais de pagamento de penalidades apuradas em razão do atraso", afirmou a agência.
Por meio de nota, a KPS declarou que "cumpre todas as suas obrigações com as autoridades brasileiras" e que "opera seu projeto no Porto de Itaguaí, no Rio de Janeiro, em estrito cumprimento da legislação nacional".
Em outubro de 2021, o governo Bolsonaro assinou acordo para instalação de 17 usinas no País, por meio de um contrato simplificado, que driblava diversas etapas comuns a processo de licenciamento ambiental, por exemplo. Foram contratadas 14 usinas movidas a gás, duas a painéis solares e uma a biomassa.
Todas tinham de estar em operação plena no dia 1º de maio de 2022, com possibilidade de prorrogação até 1º de agosto. O prazo apertado tinha como meta gerar energia nos meses de seca e preservar os reservatórios das hidrelétricas. O que aconteceu é que muitos dos empreendimentos contratados não cumpriram o cronograma e não foram acionadas, alegando uma série de dificuldades de todo tipo.
Paralelamente, como houve muita chuva, os reservatórios ficaram cheios e essas usinas, na prática, passaram a não ser mais necessárias. Naquela ocasião, governo concordou em pagar um preço médio de R$ 1.563 pelo megawatt-hora dessas usinas, mais de sete vezes o valor médio contratado em outros leilões. Mais do que isso, o contrato prevê que essas usinas fiquem 100% do tempo ligadas, e até dezembro de 2025.
Quem paga a conta são todos os consumidores do País. Nos cálculos da Aneel, está previsto o pagamento de R$ 11,7 bilhões por ano para essas empresas.
Instituto Internacional Arayara pede fim de concessões
O Instituto Internacional Arayara, organização que atua na área ambiental, enviou pedido à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), para que o órgão regulador confirme o cancelamento das concessões dos navios-usina.
Em carta enviada à agência na semana passada, a organização pede que a diretoria da Aneel tome uma decisão final sobre as alegações da empresa Karpowership para os atrasos de suas usinas, sob risco de o cenário implicar em mais custos para os consumidores de energia.
"A medida é mais urgente do que nunca, haja vista que caso a situação permaneça, em breve a KPS irá receber nova quantia multimilionária", afirma o Instituto Arayara, que pede o "indeferimento do pedido de reconsideração feito pela KPS, com a consequente revogação das autorizações e aplicação de todas as penalidades cabíveis".
Os processos relacionados a empresa turca chegaram a ser pautados no mês passado, mas o julgamento foi adiado e não há previsão de quando acontecerá. O relator dos processos, diretor Ricardo Tili, aguarda o posicionamento da Procuradoria Federal junto à Aneel para submeter o tema à análise do colegiado. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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