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Preços causam indignação no Brasil, onde a pizza de queijo custa US$ 30

Simon Romero

Em São Paulo

23/07/2013 15h33

Os consumidores aqui com uma ideia de quanto os produtos custam no exterior precisam se segurar quando compram um telefone Samsung Galaxy S4: o mesmo modelo que custa US$ 615 nos Estados Unidos custa quase o dobro no Brasil. Um choque ainda maior aguarda os pais que precisam de um berço: o mais barato na Tok & Stok custa mais de US$ 440, mais de seis vezes o preço de um semelhante vendido pela Ikea nos Estados Unidos.

Para brasileiros fervilhando de ressentimento com os gastos perdulários da elite política do país, os preços altos que pagam por quase tudo –uma pizza grande de queijo custa quase US$ 30– apenas alimentam sua ira.

"As pessoas ficam furiosas porque nós sabemos que as coisas podem ser mais baratas; nós vemos isso em toda parte, então sabemos que tem algo errado aqui", disse Luana Medeiros, 28, que trabalha no Ministério da Educação.

Os protestos de rua no Brasil nasceram de uma campanha popular contra os aumentos das passagens de ônibus. Os moradores de São Paulo e do Rio gastam uma proporção maior de seus salários em transporte público do que os moradores de Nova York ou Paris, apesar de geralmente ganharem muito menos. Mas o preço dos transportes representa apenas um exemplo das dificuldades enfrentadas por muitos brasileiros para pagar suas contas, dizem os economistas.

Alugar um apartamento em áreas cobiçadas do Rio se tornou mais caro do que em Oslo, a capital da Noruega rica em petróleo. Antes dos protestos, a alta dos preços de alimentos básicos, como tomates, provocou paródias da presidente Dilma Rousseff e seus assessores econômicos.

A inflação está em aproximadamente 6,7% ao ano, com muitos na classe média queixando-se de que estão arcando com o maior impacto dos aumentos de preços. Limitando o espaço de manobra das autoridades, a indignação popular está inflamando em um momento em que os grandes projetos de estímulo estão fracassando em tirar a economia de sua desaceleração, aumentando o fantasma de uma estagflação na maior economia da América Latina.

"O Brasil está à beira da recessão agora que terminou o boom das commodities", disse Luciano Sobral, um economista e sócio de uma empresa de gestão de ativos em São Paulo, que mantém um blog econômico irreverente sob o apelido de "The Drunkeynesian". "Isso torna impossível ignorar os preços altos que atormentam os brasileiros, especialmente aqueles que não podem pagar para viajar para o exterior para fazer compras onde as coisas são mais baratas."

Os custos altíssimos do Brasil podem ser atribuídos a uma série de fatores, incluindo gargalos nos transportes, que encarecem a chegada dos produtos aos consumidores, políticas protecionistas, que defendem os fabricantes brasileiros da concorrência, e um legado de consumidores um tanto habituados a uma inflação relativamente alta, que continua muito abaixo dos 2.477% atingidos em 1993, antes da reestruturação drástica da economia.

Mas os economistas dizem que grande parte da culpa pelos preços atordoantemente altos pode ser atribuída ao sistema tributário altamente disfuncional, no qual o governo prioriza os impostos sobre o consumo, que são relativamente fáceis de coletar, em vez dos impostos sobre renda.

Alexandre Versignassi, um escritor especializado em decifrar o código tributário do Brasil, disse que as empresas lidam com 88 impostos federais, estaduais e municipais, vários deles cobrados diretamente dos consumidores. Mantendo os contadores em alerta, as autoridades brasileiras emitem cerca de 46 novas regras tributárias por dia, ele disse.

Para piorar ainda mais para os muitos brasileiros pobres e de classe média, brechas permitem que os ricos evitem pagar impostos sobre grande parte de sua renda; renda de dividendos, por exemplo, não é tributada no Brasil, e os sócios de empresas privadas pagam uma taxa muito menor do que muitos funcionários comuns.

O resultado é que muitos produtos feitos no Brasil, como automóveis, custam muito mais aqui do que nos países distantes que os importam. Um exemplo é o Gol, um carro subcompacto produzido pela Volkswagen em uma fábrica na área metropolitana de São Paulo. Um Gol quatro portas com ar-condicionado é vendido por cerca de US$ 16.100 aqui, incluindo impostos. No México, o modelo equivalente, fabricado no Brasil mas vendido aos mexicanos como Nuevo Gol, custa milhares de dólares a menos.

A capacidade de muitos brasileiros poderem pagar por esses carros reflete as mudanças econômicas positivas da última década, como a saída de milhões de pessoas da miséria e a queda do desemprego, que atualmente se encontra em níveis historicamente baixos. Os salários subiram no mesmo período, com a renda per capita atualmente em aproximadamente US$ 11.630, segundo o Banco Mundial, em comparação a US$ 6.990 na vizinha Colômbia. Mas o Brasil se vê bem abaixo de países desenvolvidos como o Canadá, onde a renda per capita é de US$ 50.970.

Como resultado, um morador de São Paulo, a capital financeira do Brasil, precisa trabalhar em média 106 horas para comprar um iPhone, enquanto uma pessoa em Bruxelas trabalha 54 horas para comprar o mesmo produto, segundo um estudo global dos salários pelo banco de investimento UBS; para comprar um Big Mac, um morador daqui precisa trabalhar 39 minutos, em comparação a 11 minutos para um morador de Chicago.

Caminhar por qualquer aeroporto internacional no Brasil deixa esses desequilíbrios vividamente em exposição, com milhares de moradores lotando voos diariamente para viagens de compras onde os produtos são substancialmente mais baratos. Apesar da desvalorização da moeda brasileira, o real, frente ao dólar neste ano (o dólar está cotado atualmente em cerca de R$ 2,20), os brasileiros gastaram US$ 2,2 bilhões no exterior em maio, o maior valor registrado no mês desde que o Banco Central começou a monitorar esses dados, em 1969.

De olho nesse mercado, alguns agentes de viagem começaram a preparar viagens para Miami para clientes ávidos em comprar produtos para bebês, como babás eletrônicas, andadores, chupetas e, até mesmo, lenços Pampers, que no Brasil custam quase três vezes mais do que nos Estados Unidos.

Buscando impedir que essas farras de compras saiam de controle, a polícia federal revista os viajantes ao chegarem, selecionando pessoas cuja bagagem parece carregada de itens demais. Se puder ser provado que os brasileiros gastaram mais que certo limite no exterior, eles são imediatamente forçados a pagar impostos sobre suas compras.

Essas revistas também pegam estrangeiros. Em maio, a polícia no aeroporto internacional de São Paulo prendeu dois comissários de bordo da American Airlines, ambos cidadãos americanos, sob acusação de contrabando, após serem encontrados passando pela alfândega com um total de 14 smartphones, quatro tablets, três relógios caros e vários videogames. Os smartphones, disse a polícia, estavam escondidos nas suas cuecas e seriam vendidos no mercado negro.

Antes do início dos protestos, o governo do Brasil começou a tentar combater os aumentos de preços. O Banco Central elevou as taxas de juros após a revolta com os preços dos alimentos neste ano contribuir para os temores de inflação. As autoridades removeram alguns impostos sobre alguns produtos, como carros. Mesmo assim, a inflação permanece alta, enquanto o crescimento econômico está caindo, deixando muitos brasileiros irados com os altos impostos embutidos no preço dos produtos que compram.

Uma nova lei federal que exige que os comerciantes passem a detalhar nas notas fiscais os impostos pagos pelos consumidores ajudou a alimentar a revolta. Fernando Bergamini, um designer gráfico de 38 anos, ficou atônito após gastar US$ 92 recentemente em produtos como tomates, feijão e bananas, e perceber na nota fiscal que US$ 25 daquele valor foram pagos em impostos.

"É chocante diante dos serviços que recebemos após darmos nosso dinheiro ao governo", ele disse. "Ver isso no papel me deixa indignado."

Tradutor: George El Khouri Andolfato