Conta de luz caiu 16% em 2013, mas subiu 58% desde então; o que deu errado?
No intervalo da novela Avenida Brasil, em 2012, a então presidente Dilma Rousseff fez um pronunciamento em rede nacional para dar à população uma boa notícia. A conta de luz ia ficar mais barata para as famílias brasileiras.
De fato, em 2013, as contas caíram 15,66%. Mas, muitas novelas e sucessivos aumentos depois, a conta de luz disparou e, de 2014 até fevereiro deste ano (data do dado mais recente), já subiu 57,46%.
E o aumento não vai parar por aí. A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) aprovou repassar para a conta de luz uma indenização de R$ 62,2 bilhões às empresas de transmissão de eletricidade. O valor será pago em oito anos e, só em 2017, deve ter impacto de 7,17% nas contas.
A disparada da conta de luz mostra que a política de redução do preço da energia deu errado, mas especialistas divergem sobre quais foram os motivos do fracasso.
O único consenso é o papel fundamental da seca, sobretudo a partir de 2014, que esvaziou os reservatórios das hidrelétricas e forçou o acionamento das usinas térmicas, mais caras.
Por que a conta caiu em 2013?
Para explicar o que aconteceu com a conta de luz nos últimos anos é preciso voltar a 2012 e entender como a ex-presidente Dilma conseguiu reduzir as tarifas em 2013.
A medida provisória anunciada por Dilma, a MP 579, convertida na Lei 12.783, em 2013, permitia que as empresas de energia antecipassem a renovação das concessões que venceriam nos próximos anos, sem ter que passar por licitação. Em troca, deveriam reduzir as tarifas.
Como o fim dos contratos foi antecipado, as empresas receberiam uma indenização pelos investimentos que já haviam feito no setor. É o pagamento dessa indenização que a Aneel acaba de autorizar, resolvendo uma pendência de mais de quatro anos.
'Lei incentivou consumo na seca'
Para Cleveland Prates, economista da FGV (Fundação Getúlio Vargas), a lei deu errado porque foi uma intervenção indevida no setor de energia. "O preço é um sinal. Se você acha que está barato, acaba consumindo mais. Estava começando uma crise hídrica, e a medida incentivou o consumo", diz.
Com menos energia das hidrelétricas, o governo precisou acionar as usinas térmicas, que são mais caras. Como resultado, o custo da produção de energia subiu. O problema, segundo o economista, é que as empresas não puderam repassar esse aumento para o consumidor por causa do acordo feito em 2012.
Para cobrir essa diferença, o governo usou, a princípio, recursos de fundos do setor elétrico e do Tesouro Nacional. "Depois, passou a emprestar dinheiro do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), com juros menores, para as empresas, que acabaram se endividando", afirma Prates.
A partir de 2015, quando a ex-presidente Dilma coloca Joaquim Levy no Ministério da Fazenda e adota uma política de redução dos gastos públicos, o governo decide parar de cobrir o rombo e autoriza aumentos na conta de luz. Começa a cobrar, inclusive, a bandeira vermelha, uma taxa extra adotada quando há seca.
Fracasso da política econômica
Guilherme Mello, economista da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), afirma que o fracasso não foi da política de redução de preços da energia, mas sim de uma estratégia econômica mais ampla adotada pelo governo Dilma para tentar diminuir os custos de produção.
"Historicamente, a rentabilidade do capital no Brasil é muito alta", diz. Isso quer dizer que é mais vantajoso para um investidor comprar títulos públicos, por exemplo, do que investir na produção de bens ou serviços, visto que a taxa de juros elevada vai garantir um retorno alto. O governo Dilma fez cortes na taxa básica de juros, a Selic, que chegou ao patamar de 7,25%, nível mais baixo já registrado --para referência, hoje a Selic está em 12,25%.
"Ao mesmo tempo, o governo tentou diminuir os custos de produção, e uma reclamação recorrente dos empresários era a de que a energia no Brasil era muito cara", diz o economista. Assim, fazendo com que dinheiro "parado", investido em títulos públicos, rendesse menos e os custos para produzir caíssem, a expectativa era estimular a economia.
A estratégia teria dado errado devido a "fatores de natureza política e institucional" que, segundo Mello, fizeram com que a taxa básica de juros passasse a subir. "Houve uma reação muito forte do mercado financeiro [a favor de maior rentabilidade], por exemplo, e o governo não foi capaz de vencer a queda de braço", diz.
No caso do setor elétrico, veio a seca, que encareceu a energia. Com o fracasso da estratégia econômica, ao não estimular a economia, o país mergulhou em recessão, a arrecadação federal despencou e o governo não foi capaz de continuar cobrindo o rombo das empresas de energia. A partir de então, o custo maior passou para a conta do consumidor.
Agora, além de ter que pagar a indenização de R$ 62,2 bilhões, o consumidor voltou a ser assombrado pelo fantasma da bandeira vermelha, que pode encarecer ainda mais as contas de luz neste ano.
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