Brasileiro passa a se endividar mais com carro, cartão, consignado e cheque
O repasse da queda de juros ao consumidor é o menor desde 2003. Mesmo assim, com o início da recuperação econômica e alguma redução nos juros, as famílias brasileiras decidiram sair às compras e estão realizando mais empréstimos.
Levantamento do UOL com base nos dados do Banco Central mostra que as concessões de crédito em geral para as pessoas físicas cresceram 8,3% no último ano. Um dos destaques foi o financiamento de carros, que saltou 39% em relação a um ano atrás. Pode ser um bom sinal, mas também há risco de mais endividamento.
No período de 12 meses até abril, em média, o total de crédito aprovado aos consumidores foi de R$ 149,741 bilhões por mês. No período anterior, essa média havia sido de R$ 138,235 bilhões. Os números já desconsideram o efeito da inflação.
Os cálculos dizem respeito a contratos com taxas negociadas livremente entre os bancos e os consumidores. Entre eles, estão o crédito consignado, cheque especial, cartão de crédito e financiamento de veículos.
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Dívidas não podem virar uma bola de neve
Na avaliação de economistas, o apetite maior do brasileiro pela contratação de crédito reflete não apenas a redução nas taxas de juros, mas também uma recuperação lenta da economia e do emprego.
Mesmo com a alta recente na tomada de empréstimos, analistas dizem que o brasileiro está mais consciente, melhorou seu perfil de endividamento e está recorrendo ao crédito, sobretudo, para consumir mais. No entanto, eles recomendam cautela para que as dívidas, mesmo destinadas a novas compras, não virem uma bola de neve.
Empréstimos para carros crescem 39,4% em abril
Segundo os últimos números do Banco Central, em abril, as famílias financiaram mais veículos e usaram muito mais o cartão de crédito à vista.
Ao todo, os brasileiros tomaram R$ 8,48 bilhões em crédito para comprar carros em abril. O valor representa uma alta de 39,4% na comparação com os R$ 6,08 bilhões registrados no mesmo mês de 2017.
No cartão de crédito na modalidade à vista, o valor utilizado passou de R$ 57,45 bilhões em abril do ano passado para R$ 67,22 bilhões no quarto mês deste ano, uma alta real de 17%. No caso do cartão de crédito parcelado, subiu de R$ 2,75 bilhões para R$ 3,73 bilhões ou 35,7%.
No cheque especial, com taxas mais elevadas, a alta foi de R$ 8,40% na mesma base de comparação. O total passou de R$ 29,27 bilhões para R$ 31,73 bilhões. Todos os cálculos já descontam a inflação do período.
Saque do FGTS ainda representa alívio para os consumidores
O economista Gabriel Leal de Barros, um dos diretores da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, disse que, além da redução dos juros, a liberação das contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) em 2017 ainda se reflete sobre o comportamento dos consumidores.
Ao todo, os saques dessas contas colocaram R$ 44 bilhões no bolso das famílias no ano passado. “Os brasileiros usaram os recursos para quitar dívidas antigas e, agora, ainda possuem espaço no orçamento para contratar novos empréstimos”, afirmou Barros.
Até março, a instituição do Senado já calculava uma alta real de 7,1% nas concessões de empréstimos às pessoas físicas. Na avaliação dos economistas da instituição, esse movimento, que se consolidou em abril, acompanha uma recuperação gradual da economia.
Inflação controlada aumenta poder de compra
Barros disse também que, embora as condições do mercado de trabalho ainda estejam fragilizadas, a queda acentuada na inflação aumentou o poder de compra da população. Com a manutenção da renda e os preços mais baixos, as pessoas têm mais dinheiro para consumir.
Outro ponto positivo é a redução dos juros ao consumidor. Na média, essa taxa chegou a 56,8% ao ano em abril. No mesmo mês do ano passado, ela estava em 67,8%.
“A diminuição dos juros reduz o comprometimento da renda das famílias e abre espaço para a ampliação do consumo”, afirmou o economista.
Consumidor deve fazer contas antes de tomar empréstimos
A economista da CNC Marianne Hanson disse que o aumento na concessão de crédito está relacionado a uma recuperação do consumo das famílias e à queda na inflação.
“Além de o crédito estar mais barato, o varejo também reduziu o preço de alguns produtos, como eletrodomésticos, móveis e até mesmo carros. Isso estimula as compras e o uso do crédito”, afirmou.
Na avaliação de Marianne, embora estejam recorrendo mais ao crédito, os brasileiros estão mais cautelosos com relação aos seus gastos. Ela enxerga consumidores mais responsáveis na hora de realizar empréstimos, mas aconselha as pessoas a colocar as contas na ponta do lápis para não se afundarem em dívidas.
Cartão de crédito ainda é a principal dívida
Pesquisa da CNC mostra que o percentual de famílias com dívidas caiu de 60,7% em maio de 2017 para os atuais 59,1%. Entre as contas a serem pagas, estão as com cheque pré-datado, cartão de crédito, carnê de loja, empréstimo pessoal e prestação de carro.
“Nós vemos que as pessoas estão se endividando menos e comprometendo menos a sua renda. Elas também têm menos contas em atraso”, disse Marianne. “O perfil do endividamento também melhorou. Por exemplo, as pessoas usam menos o cheque especial”, afirmou.
De acordo com a CNC, o cartão de crédito continua sendo a principal dívida dos brasileiros, abrangendo 75,7% das famílias entrevistadas. Em seguida, vêm os carnês (16,3%) e o financiamento de carros (11,1%).
O delegado Flávio Souza Braga, 39, recorreu ao mercado de crédito em outubro do ano passado para comprar um carro. Ele disse que não possuía dívidas e aproveitou a queda nos juros para fechar negócio. Ao todo, ele parcelou R$ 85 mil em 36 vezes.
“Foi um financiamento oferecido pela própria concessionária e com juros baixos. Eu estava usando um veículo da minha família e quis aproveitar a oportunidade”, afirmou.
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