Empresas devem inspirar, mas sem cair na vala comum, alertam especialistas
A pandemia do novo coronavírus mudou a rotina do brasileiro, e também a comunicação das empresas às vésperas do Dia das Mães. A questão foi trazida à tona no UOL Debate de hoje, que discutiu o desafio das marcas e a importância da comunicação em meio à covid-19. Segundo os especialistas ouvidos, a crise obrigará as marcas a reinventarem a forma como se apresentam ao consumidor.
"Dois mil e vinte não vai mais ser como 2020. Há três meses, se alguém falasse 'como vai crescer o consumo de mídia?', todo mundo ia falar que estava indo na contramão do que está acontecendo", analisou Luiz Sanches, presidente da agência lmapBBDO.
"As marcas têm o papel de inspirar. Óbvio que elas têm o dever social de produzir álcool gel e respiradores, quem pode. Mas como mensagem, elas têm que sair da vala comum e a promessa que elas adotarem agora têm que ser o que realmente faz diferença na vida das pessoas e que têm a identidade dela."
Segundo ele, a pandemia ofereceu a possibilidade de novos rumos em meio a "um mundo polarizado", trazendo uma realidade na qual grupos diferentes têm que se unir. E as marcas têm um papel no cenário em questão.
"As marcas são porto seguro das pessoas hoje. O Boticário, Volkswagen, Havaianas... As marcas são esse porto seguro que dá essa segurança, que nesse primeiro momento é de uma certa forma informativo. As marcas têm que inspirar o novo consumidor, trazer a perspectiva de novos tempos que estamos vivendo", avaliou.
"(A sociedade) vai se repensar o jeito que a gente trabalha. É o momento que a gente mais queria estar conectado pessoalmente. O nosso negócio é feito disso. A gente vai repensar nosso jeito de trabalhar, mas nada vai substituir o contato humano, que é o que faz diferença para os nossos clientes", acrescentou Sanches.
O programa reuniu ainda Carlos Pitchu, vice-presidente de mídia e comunicação da Natura; Melissa Vogel, CEO da Kantar Ibope Media no Brasil; e Silvana Balbo, diretora de marketing do Carrefour. Segundo Pitchu, o futuro pós-pandemia já vem sendo debatido pelos meios de comunicação.
"A Natura, considero que foi uma das pioneiras em ter uma posição humana em sua comunicação. Nesse momento, a gente entra em uma fase que a gente precisa construir esperança nas pessoas. As marcas precisam ajudar as pessoas a ver uma luz no final do túnel, de que isso é algo transitório e de que tudo vai dar certo", acredita, reforçando esse caráter humanizado de sua empresa.
"Se a gente for pensar que, há 50 anos, a Natura já funcionava como uma rede social, um sistema de venda direta, é uma empresa que gosta de discutir visão de futuro. Existe uma lógica que precisamos fazer as mudanças urgentes, mas a discussão de futuro sobre esse novo normal entrou com tudo nas nossas pautas — mas sem sensacionalismo."
Para Luiz Sanches, a mudança na forma do consumo de conteúdo "colocou as agências nas cordas, tentando se defender". Por isso, é preciso ser mais criativo do que nunca.
"Eu acho que, no final do dia, o que a gente vai produzir é criatividade, e isso faz diferença", disse. "Temos visto o crescimento do e-commerce, mas de marcas e produtos que já estão aí. Quero ver você criar desejo por marcas só pelo e-commerce. Você precisa de todas as ferramentas que a comunicação dá para as pessoas."
"A criatividade é uma forma de você fazer isso. O formato é adaptável e tem que mudar, mas temos que olhar isso de uma forma 'o que a gente quer no produto final?'", completou.
Para Carlos Pitchu, no entanto, embora o cenário seja novo, a publicidade já vinha se preparando para uma nova mudança de rumos.
"Tudo nesse novo normal são coisas que a gente estuda faz tempo", disse. "Vejo esse novo normal como uma aceleração de processos que já estavam em andamento, é mais do que decifrar o que seria esse novo normal."
Ainda segundo Pitchu, entre as novidades dos tempos de pandemia, "é impressionante como o aspecto live no final das contas volta a ser tão importante". "Eu jurava que, com todo mundo em casa, a febre seria pelo video on demand, mas as pessoas querem ver as pessoas reagindo no improviso. Isso aquece mais os corações."
Questão de sobrevivência
Embora a comunicação tenha sido afetada pela pandemia, as empresas sabem: toda a cadeia produtiva foi impactada pelo novo coronavírus. É o que explicou Carlos Pitchu, da Natura.
"Nossa prioridade está sendo manter as pessoas em segurança. Todo mundo precisa estar em segurança, é a regra número um. Talvez o ano todo vá ser muito dedicado a isso. A gente precisa aprender rapido e tomar decisão rápido", disse Pitchu.
"A gente tem uma missão neste ano, que é manter nossa rede de negócios viva. Temos mulheres que se beneficiam dessa renda, a gente precisa encontrar soluções para que essa rede de negócios continue vivendo. Nosso foco está nisso e a gente está muito positivo."
Segundo Silvana Balbo, diretora de marketing do Carrefour, consumos essenciais continuarão fortes, mas a cadeia produtiva de categorias supérfluas devem demorar mais para recuperar o fôlego.
"O que a gente espera é uma mudança gradual. As categorias essenciais vão permanecer mais fortes por um tempo. O que a gente chama de supérfluo deve demorar mais para se recuperar. Então, com o bolso mais curto, o cliente vai tender a permanecer com o que é mais básico, essencial", acredita Silvana.
Para Melissa Vogel, da Kantar Ibope Media, a pandemia resultou em uma explosão no consumo de vídeo e de notícias. "Entendo que essa tendência vai continuar. É esperar um 2020 com uma volta gradual e com esses aceleradores no consumo de mídia."
Por fim, Luiz Sanches viu um papel grande das empresas de comunicação neste padrão de consumo, "porque a gente não pode ficar apegado a verdades absolutas".
"Vão surgir muitas oportunidades em mídias", aposta o presidente da AlmapBBDO. "Acho que todas as marcas têm oportunidades. Para todas as marcas, sempre vai ter uma oportunidade. As pessoas têm desejos — estando em uma realidade presa em quatro paredes, elas continuam tendo desejos. A gente vai sair mais forte dessa pandemia."
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