Jornal: Guedes tentou usar reforma administrativa para privatizar estatais
O ministro da Economia, Paulo Guedes, tentou incluir na proposta de reforma administrativa um dispositivo para facilitar a privatização de estatais de todos os entes da Federação, revelam documentos da pasta. Segundo reportagem do jornal O Globo, a ideia estava na versão da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que o ministro enviou ao Planalto em fevereiro.
O UOL informou no início de setembro que o governo planejava enviar um texto facilitando as privatizações.
O trecho foi retirado antes do envio da proposta ao Congresso, que ocorreu no mês passado. O texto original tentava ainda suspender o salário de servidores de carreira que concorressem a um cargo político durante as eleições, o que não acontece atualmente, e previa exoneração dos ocupantes de cargos de confiança que registrassem candidaturas.
Os documentos sobre a tramitação da reforma administrativa haviam sido mantidos em sigilo pela pasta chefiada por Guedes — o pedido de acesso feito pelo jornal foi negado. Com a divulgação da restrição, no entanto, o ministério liberou parte dos documentos.
Segundo a reportagem, uma das minutas da proposta da reforma, assinada por Guedes, mudava o artigo 173 da Constituição. O dispositivo prevê que "a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo".
O texto da Economia retirava o "relevante interesse coletivo" do artigo e estabelecia prazo de três anos para a privatização das empresas estatais caso o chefe do Poder Executivo do ente Federativo não ratificasse "o interesse público na manutenção da empresa". Assim, ao invés de o presidente propor a venda de uma empresa, o governo ficava previamente autorizado a privatizar todas as empresas, a não ser que houvesse manifestação expressa pela necessidade de manter o controle da atividade estatal. A proposta foi retirada da versão enviada ao Congresso.
Outro trecho retirado determinava que, ao se candidatar nas eleições, o servidor seria afastado do cargo, sem remuneração — atualmente, as licenças são remuneradas.
A proposta também proibia aproveitar empregados de estatais em cargos na administração direta. A Secretaria de Desestatização desistiu da ideia ao ser informada de que o plano não tinha sido bem recebido.
De acordo com o jornal, o ministro também pretendia criar comitê consultivo, em cada ente federado, composto por representantes do Poder Público e da sociedade, "para proposição de políticas remuneratórias com vista a endereçar, com maior tecnicidade, a questão das diferenças remuneratórias existentes entre o serviço público e o setor privado", mas o trecho foi vetado pelo Planalto.
Procurado pelo UOL, o Ministério da Economia afirmou que as propostas são submetidas às equipes que atuam na pasta e que as informações da matéria foram obtidas por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação), dispositivo de transparência do governo federal.
"Propostas em fase de formulação no âmbito interno do governo sempre passam por discussão, aprimoramento e avaliações de caráter técnico, jurídico e político, nas quais pode haver acréscimos ou retirada de dispositivos, conforme entendimentos entre as várias equipes que trabalham na consolidação das políticas públicas. As informações da referida reportagem foram fruto de solicitação ao Serviço de Informação ao Cidadão (SIC), com base na Lei de Acesso à Informação e respondidas diretamente ao autor, conforme orientação e prazos estabelecidos em lei."
Troca de e-mails
Entre os documentos aos quais o jornal teve acesso, há e-mails trocados entre técnicos e secretários da pasta indicando que o texto foi encaminhado no começo de 2020 para a Casa Civil.
Uma mensagem do dia 4 de fevereiro, com aviso de urgente, informava que era preciso colher manifestações das áreas envolvidas dando aval à proposta, mas o texto encontrou resistências por parte do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
"Informo que a proposta de PEC da Reforma Administrativa retornou ao Ministério da Economia, devido a entendimentos com a Presidência da República", diz e-mail de uma servidora no dia 19 de fevereiro.
O assunto foi tratado como prioridade no ministério da Economia, que fez ajustes no texto. No dia 22 de fevereiro uma nova versão voltou ao Planalto, ficando por ali até setembro.
Os documentos também mostram que na primeira semana de setembro, mais uma vez foi feita manifestação às pressas para avalizar o texto alterado pelo Planalto. Arquivos da Secretaria Geral da Presidência revelam que a PEC foi enviada ao Congresso sem que a assessoria jurídica pudesse emitir parecer.
Somente após o envio um ofício foi assinado. A responsável pelo setor relata a falta de tempo, mas informa que não havia problemas no texto encaminhado ao Legislativo.
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