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Rússia x Ucrânia: sanções econômicas afetam economia global e do Brasil

João José Oliveira

Do UOL, em São Paulo

22/02/2022 13h45Atualizada em 24/02/2022 19h49

Resumo da notícia

  • Países do Ocidente reforçaram comunicados de sanções econômicas contra a Rússia
  • Economistas dizem que Rússia tem grande peso na economia mundial e, por isso, sanções também afetam outros países
  • Mais inflação, menos exportações e desvalorização de real e de ações podem ser impactos sofridos pelo Brasil

Países do Ocidente reforçaram comunicados de sanções econômicas contra a Rússia depois que o presidente russo, Vladimir Putin, anunciou formalmente na segunda-feira (21) que reconhece como independentes as regiões separatistas localizadas no leste da Ucrânia. Segundo economistas, as medidas podem afetar a economia russa diretamente, mas também terão impactos sobre a atividade econômica global.

Veja abaixo o que são sanções econômicas, por que são usadas como instrumento diplomático e quais impactos podem ter na economia global, incluindo o Brasil.

O que são as sanções econômicas?

As sanções econômicas representam instrumentos diplomáticos usados por governos contra outros países de modo unilateral, ou multilateralmente. O objetivo é enfraquecer a posição do Estado tido como alvo e, assim, encaminhar uma negociação em meio a um conflito.

Entre as sanções econômicas mais comuns estão a interrupção de comércio internacional, com suspensão de importações e exportações, corte de linhas de crédito e de empréstimos internacionais, veto à atuação de empresas de nacionalidade do país alvo das sanções e bloqueio de contas bancárias internacionais.

No caso do conflito que acontece no leste europeu, os países do Ocidente pretendem usar as sanções econômicas para fragilizar a economia russa e, assim, pressionar Vladimir Putin a seguir na via da diplomacia, ao invés de partir para uma ação de militar e de invasão de parte da Ucrânia.

Quais sanções foram anunciadas contra Rússia?

Os governos de Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha já apresentaram algumas medidas contra a Rússia.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, impôs ontem uma série de sanções econômicas por meio de uma Ordem Executiva. O documento inclui a proibição a qualquer cidadão ou empresa americanos de fazer aprovar, financiar ou facilitar transações para uma pessoa estrangeira em Donetsk e Lugansk —regiões separatistas da Ucrânia reconhecidas como independentes por Putin.

Há também o cancelamento de novos investimentos nas duas regiões separatistas e a suspensão de importação, exportação, reexportação, venda ou fornecimento, de forma direta ou indireta, de quaisquer bens, serviços ou tecnologia de Donetsk e Lugansk para os Estados Unidos.

O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, anunciou nesta terça (22) sanções contra cinco bancos e três oligarcas da Rússia. Os bancos afetados são: Rossiya, IS Bank, General Bank, Promsvyazbank e Black Sea Bank; e os executivos são os bilionários Boris e Igor Rotenberg, coproprietários de um grupo de obras de infraestrutura, e Gennady Timchenko, dono de um grupo de investimento privado - todos aliados próximos de Putin.

Já a Alemanha anunciou a suspensão do acordo para a implementação do gasoduto russo Nord Stream 2, também nesta terça. Essa estrutura passa pelo território alemão até Berlim e tem capacidade para dobrar o fornecimento de gás da Rússia para a Europa.

Impactos na economia russa

Os impactos dessas medidas sobre a economia russa poderão afetar a atividade de consumidores, empresas e bancos, apontam economistas, pois reduzem o comércio internacional, o acesso ao crédito de companhias e das famílias e ainda interrompem novos investimentos.

Em 2021, o PIB (Produto Interno Bruto) da Rússia cresceu 4,7%, após retração de 2,7% em 2020, em desempenho puxado principalmente pelo crescimento de 9,6% no consumo das famílias e de 8,7% nos investimentos. Esses dois motores podem sofrer com as sanções econômicas se elas forem levadas adiante e por muito tempo, aponta o estrategista de comércio exterior do Banco Ourinvest, Welber Barral, em um relatório.

Além disso, sem linhas de crédito e sem mercados, as importações e exportações russas — que respondem por cerca de 20% do PIB (Produto Interno Bruto) do país —, tendem a sofrer mais.

Impactos na economia global e brasileira

As sanções contra a Rússia terão repercussões que ultrapassam as fronteiras do leste europeu, já que o país tem grande peso na atividade global.

Petróleo e gás: A Rússia é é o principal exportador e segundo maior produtor de gás natural do mundo. É ainda o segundo maior exportador e terceiro maior produtor de petróleo global, respondendo por cerca de 12% da oferta global.

Assim, um abalo nas cadeias de produção e de financiamento no país repercutem diretamente na oferta dessas commodities em todo o mundo, destacam economistas.

Essa crise da fronteira entre Rússia e Ucrânia coloca em risco a distribuição do petróleo no mundo. O barril já atingiu a máxima em sete anos nessa madrugada, chegando a US$ 97,70 o barril.
Pietra Guerra, especialista em ações da Clear Corretora

Fertilizantes e adubo: A Rússia está entre os maiores produtores de fertilizantes e adubo do mundo, sendo importante fornecedor de Amônia, Rocha Fosfática e Cloreto de Potássio. O Brasil é um dos principais clientes. A interrupção ou redução na oferta desses itens na cadeia global de comércio afeta os custos dos produtores de alimentos e, por tabela, gera inflação.

Trigo: Se somadas as produções e vendas nos mercados internacionais, Rússia e Ucrânia respondem por quase 30% das exportações mundiais de trigo. Uma redução ou mesmo interrupção da oferta dessa parcela da commodity tem impacto direto sobre diversas cadeias de alimentos.

Na indústria alimentícia, por exemplo, afeta o suprimento dos fabricantes de massas. E, na criação de porcos e aves, a escassez desse insumo eleva os custos dos criadores, afetando o preço final ao consumidor.

Para além da tragédia humana, o movimento significa não apenas maior aversão ao risco de investidores, que fogem para ativos mais seguros, como o dólar e os títulos americanos, mas também maior pressão sobre essa onda de inflação que já vem marcando a economia nos últimos meses.
Rachel de Sá, chefe de economia da Rico Investimentos

Brasil sofre impactos diretos e indiretos

Inflação: A inflação representa o impacto indireto mais preocupante que a economia brasileira pode sofrer devido às sanções econômicas impostas à Rússia, destacam economistas.

Combustíveis e alimentos são dois dos itens que mais pressionaram a inflação ano passado e, já este ano, seguem elevando os índices de preços.

A cotação mais alta do barril do petróleo acelera os preços dos combustíveis, enquanto trigo e fertilizantes valorizados impulsionam os custos dos alimentos por aqui.

Esse conflito tem potencial para gerar novas pressões inflacionárias em todo o mundo e no Brasil.
Matheus Peçanha, economista Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV)

Exportações: Na pauta de exportação brasileira para a economia russa, os destaques são grãos e carnes, casos da soja, aves, café não torrado, açúcar, amendoim e cortes bovinos.

Uma redução das compras da Rússia desses produtos reduziria as exportações e, portanto, a entrada de dólares aqui no país. Por outro lado, o fechamento do mercado russo pode levar os produtores brasileiros a escoarem esses itens no mercado local. Nesse caso, os preços da cesta de compras do brasileiro poderiam ceder um pouco.

Bolsa e dólar: Outro tipo de impacto indireto que a economia brasileira sofre das sanções econômicas impostas pelo Ocidente à Rússia está nos preços dos ativos.

Segundo profissionais de mercado, as sanções ampliam as incertezas que já existem entre empresas e investidores sobre o desenrolar desse conflito e os impactos na economia global. E quando há dúvidas nos mercados, tradicionalmente, as moedas fortes, como dólar, os metais valiosos, como ouro, e mesmo ativos de renda fixa de governos de países mais desenvolvidos, como os títulos do tesouro americano, passam a ser mais procurados pelos investidores globais.

Na ponta contrária, as moedas, as ações e outros ativos de países de economias emergentes, como é a brasileira, passam por ondas de vendas.

Os preços dos ativos brasileiros já estão sentidos esse aumento da tensão, com a redução da recente valorização do real e queda das ações no final do pregão de ontem.
Igor Graminhani, analista da Genial Investimentos