CVM absolve o bilionário Barsi por suposta informação privilegiada; entenda

A CVM (Comissão de Valores Imobiliários) absolveu o empresário Luiz Barsi Filho por suposta prática de insider trading. Barsi é o maior investidor pessoa física no país, conhecido como o "Warren Buffet brasileiro", e acumula uma fortuna de aproximadamente R$ 4 bilhões. O julgamento aconteceu na sede da CVM no Rio de Janeiro na tarde desta terça-feira (26). Ao UOL, a assessoria do investidor disse que a absolvição "reafirma a integridade e o compromisso de Barsi com as práticas de governança corporativa e o respeito às regulamentações do mercado de capitais".

O que aconteceu

O caso envolve a Unipar (UNIP6), empresa da indústria química. Barsi é vice-presidente do Conselho de Administração desde 2017. A CVM apura se o investidor teve acesso a alguma informação privilegiada antes da divulgação de um fato relevante no dia 2 de junho de 2021, referente a um acordo de confidencialidade com a Compass para analisar informações para uma possível operação entre as companhias.

A prática de insider trading é, basicamente, o uso de informações privilegiadas para obter vantagem. Essas informações, ainda não divulgadas ao mercado, seriam usadas para comprar ou vender ações e obter algum tipo de lucro ou algum tipo de vantagem no mercado. Trata-se de um crime contra o mercado de capitais.

Em nota, a assessoria de Barsi afirma que a defesa do empresário estava convicta que as acusações "eram infundadas" e que processo era uma apuração rotineira da CVM.

Esta absolvição reafirma a integridade e o compromisso de Barsi com as práticas de governança corporativa e o respeito às regulamentações do mercado de capitais. A conclusão do processo reforça a confiança dos investidores e do mercado em geral na conduta empresarial de Barsi e na consistência de sua estratégia de dividendos.
Assessoria de imprensa de Barsi

Quando a Unipar se valorizou?

A investigação acompanhou a evolução das cotações das ações da companhia, que teve um período de forte valorização a partir do pregão do dia 27 de maio de 2021. Ao investigar os motivos que deram origem a essas oscilações atípicas, a CVM apurou três datas relevantes em que a companhia divulgou informações ao mercado.

A primeira foi no dia 27 de maio de 2021, após o encerramento do pregão. A Unipar divulgou, na época, a ata da reunião do Conselho de Administração e um aviso aos acionistas, informando sobre a distribuição antecipada de dividendos no montante de R$ 250 milhões para os detentores das ações em 1º de junho de 2021.

A próxima data analisada foi o dia 1º de junho. Na ocasião, ao responder um ofício de questionamento da B3 a respeito das oscilações atípicas nos pregões realizados no período de 18 a 31 de maio de 2021, a companhia disse ter verificado que não havia fato ou ato relevante que justificava o movimento das ações nos pregões mencionados.

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Por fim, no dia 2 de junho de 2021, o jornal Valor Econômico publicou uma matéria com o título "Unipar perto de comprar fábrica de cloro-soda da Compass Minerals por R$ 300 milhões". Ao final do pregão do mesmo dia, a companhia publicou um fato relevante sobre a celebração de um NDA (Non Disclosure Agreement, ou Acordo de Não Divulgação, na tradução para o português) com a Compass. O intuito era analisar informações para uma possível operação entre as duas empresas.

A CVM detectou que Barsi adquiriu 13.900 ações UNIP3 no dia 28 de maio de 2021, no volume total de R$ 1.124.745. O órgão solicitou à companhia a cronologia detalhada dos eventos que levaram à conclusão sobre o assunto do fato relevante do dia 2 de junho de 2021: cópia das atas de eventuais reuniões do Conselho de Administração, da Diretoria, Gerencias e/ou qualquer órgãos, setores ou equipes em que porventura tenham participado de discussões sobre quaisquer questões relacionadas, direta ou indiretamente, às informações divulgadas no referido fato relevante; e a lista de empresas, assessores ou pessoas que, de alguma forma, tomaram conhecimento de informações relacionadas ao assunto antes de sua divulgação pública.

Com base nos dados enviados pela Unipar, foi identificado que Luiz Barsi teve acesso às informações relativas às negociações com a Compass no dia 11.11.2020, quando participou da 653ª Reunião do Conselho de Administração da Companhia, que contou com a presença de todos os seus membros, e na qual foi aprovada a contratação da Essentia Partners para a prestação de serviços de consultoria e assessoria estratégica à Companhia visando as novas oportunidades de negócios.
Trecho do relatório da CVM

Acusação

O empresário foi acusado de utilizar indevidamente informações privilegiadas para adquirir ações da companhia antes da divulgação do fato relevante do dia 2 de junho. Segundo a SMI (Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários) da CVM, as informações fornecidas pela companhia comprovam que Barsi acompanhou as tratativas e tinha conhecimento de informações relativas às negociações entre a Unipar e a Compass.

Segundo a SMI, o caso se encaixaria na definição de insider trading por cumprir quatro requisitos:

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  • A existência de uma informação relevante pendente de divulgação ao mercado;
  • O acesso privilegiado a tal informação;
  • A utilização desta informação na negociação de valores mobiliários;
  • A finalidade de auferir vantagem para si ou para terceiros.

O que diz Barsi

O relatório traz a defesa de Barsi, que alega falta de elementos ou provas mínimas para a tipificação da conduta de insider trading. A defesa destacou a importância de considerar a forma pela qual a companhia realizou as divulgações de seus atos e fatos relevantes e, assim, "compreender que a motivação do acusado em adquirir, em 28 de maio de 2021, as ações da Unipar, não está vinculada à operação com a Compass, tendo em vista que tal discussão não havia sido tratada no âmbito do Conselho de Administração".

Barsi também é conhecido por ser o "rei dos dividendos". A defesa ressaltou isso, destacando que e a distribuição de proventos é um dos principais direcionamentos estratégicos adotados na composição do portfólio de ações do empresário nos últimos 50 anos. A divulgação de distribuição antecipada, em montante mais alto do que o usual (o maior desde 2018, na ocasião), estaria dentro dessa estratégia reconhecida pelo mercado e justificaria a compra das ações.

O empresário também diz que os documentos disponibilizados para o Conselho de Administração, incluindo o conteúdo do fato relevante, não abordavam a possível compra da fábrica. Até então, a Unipar não havia realizado nenhum movimento concreto para aquisição, com exceção da contratação de assessoramento.

Além disso, a divulgação do fato relevante se deu, justamente, por conta do que havia sido publicado, "não significando que o fato era relevante na época da negociação". A defesa alega que a companhia buscou esclarecer o estágio da tratativa, que havia sido "erroneamente divulgado pela imprensa, o que, portanto, poderia causar impacto na cotação do ativo da companhia em razão da correção de falsa expectativa".

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A defesa também afirma que a quantidade negociada representa um número considerado "irrelevante frente a quantidade e o volume de negócios totais registrados no dia 28 de maio de 2021". Barsi diz que falta base de prova mínima - que não se confunde com a presunção de ganho financeiro - para dar sequência à acusação.

Investidor perde R$ 14 milhões após comprar ações IRB

Essa não é a primeira polêmica envolvendo Barsi. Em dezembro do ano passado, o investidor Maurício Ferrentini, de 56 anos, viu seu patrimônio de R$ 21 milhões ser praticamente dilapidado após comprar R$ 15,9 milhões em ações do IRB, em 2021. Ele teria adquirido os papéis por orientação de Barsi.

Ferrentini, que tinha uma relação próxima a Barsi, o procurou para pedir uma recomendação de investimento. Ele tinha R$ 21 milhões e queria uma renda passiva mensal de R$ 150 mil. Mas, do total investido (entre 2021 e 2023), Ferrentini resgatou R$ 1,5 milhão.

O prejuízo foi de R$ 14,4 milhões. A história foi revelada no dia 30 de novembro pelo site NeoFeed. Barsi teria orientado a compra dos papéis da resseguradora IRB em junho de 2021. O megainvestidor, que sozinho detém 1,5% das ações do IRB, pediu de um "voto de confiança", porque a companhia estaria passando por um processo de reestruturação.

Em entrevista à coluna Painel S.A., da Folha de S.Paulo, Ferrentini disse que seguiu a recomendação do amigo. Ele destacou que a promessa era de que seu dinheiro seria triplicado. O assessor da carteira de Ferrentini teria ficado contrariado e demonstrado preocupação — afinal, ele quis comprar R$ 15,9 milhões em ações da resseguradora, o que correspondia a 80% do seu patrimônio total. Mesmo assim, o investimento foi feito.

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O investidor protocolou na CVM um pedido de apuração do caso. O documento também foi entregue ao MPF (Ministério Público Federal). Ele alegava que Barsi, por meio da corretora Boa Vista Investimentos, podia ter praticado insider trading e front running.

Em nota divulgada à imprensa na época, Barsi negou a interferência nos investimentos do amigo. O comunicado destacou que o empresário não cuida ou administra carteira de terceiros, além a própria.

O texto ainda dizia que o investidor tem "vasta experiência no mercado de investimentos, em especial em negócios de longo prazo". E que é sempre esteve consciente de que "o mercado de valores mobiliários é um mercado de renda oscilável, portanto sujeito a diversas variáveis, de ordem econômica, políticas, sociais, endêmicas, dentre outros múltiplos fatores".

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