Governo federal promete a gaúchos prorrogação de prazo de dívidas

Depois de encontro com produtores rurais atingidos pela catástrofe climática no Rio Grande do Sul, o ministro Carlos Fávaro, da Agricultura e Pecuária, anunciou linha de crédito com prorrogação de oito anos para pagamentos de dívidas, com um ano de carência e juros chegando ao máximo de 10%.

''Já tem alinhamento com diretorias dos bancos em Brasília, agora vamos falar com os superintendentes aqui no estado, para que eles tenham uma força-tarefa de implementação disso. Não pode demorar, as medidas estão tomadas'', afirmou Fávaro a jornalistas.

O anúncio foi feito nesta sexta-feira (30), na Expointer, feira tradicional do agro gaúcho, que ocorre em Esteio, região metropolitana de Porto Alegre. Outra reunião com representantes dos bancos ocorreu logo após o encontro. A medida deve passar pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) na próxima semana.

''Daqui até segunda [2], pode ser que algum ajuste fino seja feito no que já está redigido e foi apresentado a todos'', disse Fávaro.

A medida atende produtores, cooperativas, cerealistas e revendedores de insumos. As empresas devem comprovar que 70% do recurso recebido é destinado aos produtores, e pode capitalizar os outros 30%.

Na quinta (29), o Congresso Nacional aprovou um projeto de lei para facilitar o acesso ao crédito para produtores afetados pela catástrofe, que altera a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e dispensa que agências financeiras de fomento observem impedimentos e restrições legais para quem está em municípios em estado de calamidade. O projeto ainda deve ser sancionado pelo presidente Lula (PT).

O movimento anunciado nesta sexta busca atender produtores endividados não contemplados por medidas anteriores. Um pleito apresentado pela Farsul (Federação da Agricultura do RS) ainda em maio pedia linha de crédito especial com pagamento em até 15 anos, dois anos de carência e juros de 3%, para viabilizar o retorno dos produtores na próxima safra.

Manifestante do SOS Agro na Expointer
Manifestante do SOS Agro na Expointer Imagem: Fernanda Canofre/UOL

''O governo não consegue executar isso. O que ele consegue executar é algo ao redor de dez anos, talvez um pouco menos, com uma taxa de juros plausível'', afirmou o presidente da Farsul, Gedeão Silveira Pereira, após a reunião na feira. ''Perguntamos aos produtores se isso ajudaria, e para quem não sobra nada, é um recurso que vem muito bem. O produtor tem um período longo para pagar, embora tenha juros e o subsídio seja menor do que tínhamos a expectativa, mas dá sobrevida ao produtor e temos a preocupação que seja o mais ágil possível.''

A medida provisória que liberou R$ 1,9 bilhão em créditos para apoiar produtores atingidos, publicada na semana passada, já atenderia 93% dos produtores gaúchos, na avaliação do governo. Para os outros 7%, a medida de agora deve permitir que troquem o perfil da dívida e acessem R$600 milhões do chamado Fundo Garantidor, até então liberado apenas para comércio e indústria atingidos.

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''O que vamos falar com os bancos é que, como tem Fundo Garantidor, tirou o risco, então, não tem porque os bancos ficarem com spread de 5,5%. Já há um entendimento com as presidências dos bancos em Brasília de que vão reduzir'', afirmou Fávaro.

O governo também apresentou uma linha para custeio e investimento com previsão de 10 anos para pagamento, com três de carência, e juros a 3% para novos investimentos. A medida é voltada a Pronamp (Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural) e Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar).

Polarização

Em discurso na abertura da feira, no final da manhã de sexta (30), Eduardo Leite (PSDB-RS) fez reverência ao Movimento SOS Agro, que se formou em apoio ao pleito da Farsul, e ressaltou o fato de não ter ligação com partidos políticos, nem pedir ''fora alguém''. Na última visita do presidente Lula ao RS, em 16 de agosto, o governador gaúcho foi alvo de vaias durante um evento de entregas do Minha Casa, Minha Vida.

''Esse clamor que está aqui não é de hostilidade a ninguém, não é contra ninguém, é a favor do Rio Grande, a favor do agronegócio, a favor da produção, não pode ser entendido como qualquer movimento que está tentando fustigar qualquer personalidade política'', afirmou.

Carlos Joel da Silva, presidente da Fetag-RS (Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul), disse reconhecer avanços nas negociações com o governo federal e defendeu que ''diferenças políticas não atrapalhem'' a busca por soluções.

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''A Fazenda tem que abrir a mão do cofre para que a gente possa fazer as coisas chegarem até aqui. Mais do que isso, os agentes bancários têm que fazer a sua parte'', afirmou ele também na abertura da feira.

O que é o movimento

Movimento SOS Agro pede medidas para apoiar agricultores do RS após enchentes destruírem lavouras
Movimento SOS Agro pede medidas para apoiar agricultores do RS após enchentes destruírem lavouras Imagem: Fernanda Canofre/UOL

O SOS Agro RS, presente na Expointer e no encontro que discutiu as medidas, começou a se mobilizar em torno do pleito da Farsul por medidas de socorro para o agronegócio ainda durante a catástrofe.

Na avaliação dos produtores, a medida provisória 1247/2024, publicada no final de julho, não conseguiu atender todas as necessidades do setor. O movimento realizou protestos nas cidades de Cachoeira do Sul e Rio Pardo, e levou um tratoraço com mais de 300 veículos a Porto Alegre, no início de agosto.

Graziele de Camargo (40), uma das coordenadoras, conta que a mobilização se iniciou em conversas entre amigos e cresceu em contato com produtores que sofreram perdas na catástrofe climática. Eles contataram 245 prefeituras e reuniram cerca de 750 ofícios em apoio ao pleito da Farsul, que foram enviados ao Ministério da Agricultura e Pecuária.

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''Hoje nosso movimento representa em torno de 25 mil produtores, nós temos oito grupos de WhatsApp, sete grupos com mil e poucas pessoas. O oitavo abriu agora e temos mais grupos por municípios. Nós estamos reunindo as dificuldades de todo mundo e levando para o governo federal'', conta ela.

O perfil dos produtores do movimento são de propriedades a partir de 80 hectares, que perderam entre 50% e 100% das lavouras, alguns se classificando como Pronamp (Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural).

Produtora de soja há 14 anos, Graziele conta que perdeu 370 dos 560 hectares que planta no município de São Sepé, região central do estado. Um prejuízo estimado em R$ 2,5 milhões. As perdas na lavoura dela foram causadas pelo excesso de chuvas, que apodreceu os grãos na planta, antes da colheita. Segundo ela, a propriedade registrou cerca de 1.200 milímetros de chuva, volume equivalente ao ano todo no intervalo de um mês.

Entre os pontos não atendidos pelas medidas já anunciadas, explica ela, está o prazo para pagamento das dívidas, período de carência e juros mais baixos, com linha especial de crédito para a próxima safra.

''Se tivessem mais tempo com os prazos, as pessoas poderiam trabalhar e prorrogar suas dívidas'', diz ela.

''Nos últimos 5 anos, eu já perdi quatro vezes, três para seca e uma para enchente. A enchente te incapacita de sanar as tuas dívidas. Já era difícil depois das estiagens, mas piorou. Não consigo pagar o que prometi pagar o ano passado, porque a chuva arrasou com tudo. É uma situação caótica, uma calamidade pública, uma situação humanitária, só que a demora de uma solução está trazendo mais insegurança'', afirma.

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