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Eleições e novo governo devem dominar debate sobre riscos à estabilidade financeira, diz BC

03/10/2018 10h50

BRASÍLIA/SÃO PAULO (Reuters) - As eleições presidenciais, a agenda do próximo governo eleito e o cenário internacional deverão dominar o debate sobre riscos à estabilidade financeira ao longo do segundo semestre de 2018 e no início de 2019, apontou o Banco Central em seu Relatório de Estabilidade Financeira, publicado nesta quarta-feira.

Para tanto, o BC considerou os dados coletados em sua última Pesquisa de Estabilidade Financeira, feita junto a 55 bancos que respondem por 95 por cento dos ativos do sistema financeiro.

No levantamento, os riscos políticos foram citados como os mais relevantes dentre os demais por 51 por cento das instituições em agosto de 2018, ante 36 por cento em fevereiro, com probabilidade médio-alta e alto impacto no sistema financeiro.

"Os riscos políticos apontados pelas instituições referem-se basicamente às incertezas associadas às eleições presidenciais, como o resultado das eleições, o programa do candidato eleito e as condições de governabilidade", afirmou o BC.

Em coletiva de imprensa, o diretor de Fiscalização da autoridade monetária, Paulo Souza, avaliou que essa é uma leitura natural num cenário de disputa ao Palácio do Planalto, sendo que os próprios tomadores de crédito colocam o pé no freio à espera de definições.

"O risco político que eu percebo claramente é em relação a quem é que venha a ser eleito, qual vai ser a reforma que vai ter no aspecto fiscal. Logicamente isso vai ter impacto inclusive na taxa estrutural de juros", disse.

"O próprio sistema financeiro fica um pouco mais apreensivo. Vou ser mais agressivo no sistema de crédito agora sem saber qual vai ser o comportamento dos números fiscais e até o comportamento da própria taxa de juros?", completou ele, afirmando que há "claramente" um reflexo nos mercados "dependendo daquilo que eles consideram que vai acontecer".

Souza também afirmou que, independentemente do vencedor do pleito, o importante é que o BC mantenha sua isenção, entregando o país com inflação dentro da meta, taxas de juros em níveis historicamente baixos e com um sistema financeiro apto a suportar o crescimento.

O mercado vem reagindo fortemente às pesquisas de intenção de voto, com o humor sendo ditado por maiores chances de vitória para candidatos vistos como reformistas.

Nesta quarta-feira, o dólar operava em queda ao mesmo tempo em que a bolsa chegou a disparar acima de 85 mil pontos, após nova pesquisa eleitoral reforçar o momento mais favorável a Jair Bolsonaro (PSL) na corrida presidencial e aumento da rejeição ao petista Fernando Haddad, endossando especulações no mercado de uma possível vitória do candidato do PSL no primeiro turno.[nL2N1WJ0IJ][nL2N1WJ0FV]

Se essa preocupação entrou com mais força no radar dos bancos, a frequência de citação dos riscos fiscais como os mais importantes caiu a 16 por cento em agosto, sobre 31 por cento em fevereiro, mostrou o BC, apesar da situação das contas públicas seguir desequilibrada, com o Brasil caminhando para o seu quinto ano consecutivo de déficit primário, em meio ao forte crescimento das despesas obrigatórias.

Quando os bancos foram questionados livremente a respeito dos riscos, aqueles associados ao quadro externo saltaram a 76 por cento, sobre 51 por cento, na mesma base de comparação. Quando instados a apontar os riscos mais importantes dentre os destacados, contudo, os bancos seguiram vendo os ligados ao cenário externo como os menos relevantes, embora essa fatia tenha subido a 9 por cento, ante 5 por cento em fevereiro.

"Antes mais limitada à retirada de estímulos monetários nos Estados Unidos e seu impacto sobre as economias emergentes, como depreciação cambial e aumento do custo de captação, a citação de riscos passou a englobar também preocupações com a escalada das tensões comerciais e contágio das tensões verificadas nas economias da Turquia e da Argentina", disse o BC.

"Muitos respondentes destacaram que a guerra comercial, especialmente entre os Estados Unidos e a China, poderá reduzir o volume do comércio internacional, tendo reflexos no preço de commodities e no nível de atividade mundial" acrescentou.

TESTES

No relatório, referente ao primeiro semestre deste ano, o BC afirmou que o crédito bancário às famílias avança desde o início de 2017, com concomitante percepção de redução do risco da carteira. O crédito às empresas, por sua vez, apresenta sinais de melhora, sendo que os ativos problemáticos das companhias de grande porte na carteira dos bancos recuaram após três anos consecutivos de ascensão, mas ainda se encontram em patamar elevado.

O BC também apontou que testes de estresse "seguem atestando a resiliência do sistema bancário, que se mostra capaz de absorver as perdas estimadas em todos os cenários simulados".

Em outra frente, o BC sublinhou que o sistema bancário dispõe de capital robusto, em nível e qualidade, "estando plenamente aderente às regras de Basileia III e com capacidade de suportar a tendência de crescimento da carteira de crédito".

Segundo o BC, a rentabilidade dos bancos avançou, principalmente pela significativa redução das despesas com provisão. Entretanto, a perspectiva é de estabilização das despesas de provisão e de desaceleração da trajetória de aumento da rentabilidade nos próximos semestres, "mas ainda em condições favoráveis para a evolução do Retorno sobre o Patrimônio".

Apesar do aumento do dólar frente ao real no acumulado do ano, o BC afirmou que o estoque da dívida em moeda estrangeira das empresas que não possuem nenhum tipo de proteção cambial restringe-se a apenas 3 por cento do Produto Interno Bruto (PIB).

De acordo com o diretor de Fiscalização do BC, este nível vem se mantendo bastante estável.

"A gente não percebe nenhum tipo de aumento de risco de crédito ou comportamento de instabilidade por parte dessas empresas em função de ter dívida no exterior, e isso é uma situação bastante confortável", avaliou Souza.

(Por Marcela Ayres e Stefani Inouye)