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Governo brasileiro endossa sem ressalvas plano Trump para Oriente Médio

29/01/2020 18h57

Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) - O governo brasileiro decidiu endossar sem ressalvas o plano apresentado pelo presidente norte-americano, Donald Trump, para o Oriente Médio, apesar das críticas dos palestinos e de seus aliados entre os países árabes à proposta, em mais uma guinada em relação às tradicionais posições diplomáticas brasileiras.

Depois de uma audiência com o presidente Jair Bolsonaro e o embaixador de Israel, Yossi Shelley, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, autorizou a divulgação de uma nota do Itamaraty louvando o acordo.

Shelley, que desenvolveu uma relação próxima com o presidente brasileiro, foi quem apresentou a proposta de Trump a Bolsonaro.

Na nota, o Itamaraty classifica o plano Trump de "uma visão promissora" depois de sete décadas de "esforços infrutíferos" e um documento "viável" e "ambicioso", que contemplaria as aspirações de palestinos e israelenses.

"Trata-se de iniciativa valiosa que, com a boa-vontade de todos os envolvidos, permite vislumbrar a esperança de uma paz sólida para israelenses e palestinos, árabes e judeus, e para toda a região", diz o texto.

Apesar de supostamente contemplar as aspirações de ambos os lados, os palestinos não participaram da formulação da proposta e o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, classificou o plano como "a bofetada do século", ironizando o que Trump chamou do "acordo do século".

"O plano ignora o direito internacional. Ainda se assumirmos que há boas intenções detrás do comunicado, faltaram várias colocações referentes à legalidade internacional. A autodeterminação dos povos mencionada no comunicado brasileiro, só para citar um exemplo, não se impõe. O povo da Palestina não foi consultado", afirmou à Reuters o embaixador palestino no Brasil, Ibrahim Alzeben.

O plano norte-americano aumenta o atual território palestino e congela novos assentamentos israelenses, além da promessa de um investimento dos Estados Unidos de 50 bilhões de dólares no território.

No entanto, reconhece os assentamentos israelenses na Cisjordânia e, principalmente, colocar Jerusalém como "capital indivisível de Israel", algo que nunca foi aceito pelos palestinos, que também reivindicam a cidade histórica como sua capital.

O Brasil, histórico defensor da solução de dois Estados para israelenses e palestinos, sempre condenou o avanço dos assentamentos israelenses. Em relação à Jerusalém, a diplomacia brasileira defendia que a situação da cidade fosse tratada apenas depois de uma solução para os territórios palestinos.

A nota da chancelaria brasileira, assim como o apoio presidencial explícito ao plano --marcado ainda pela presença do embaixador israelense no Planalto-- causou perplexidade entre alguns diplomatas brasileiros.

O alinhamento total com o plano norte-americano, que foi recebido sem entusiasmo por países árabes, é visto como um prejuízo à tradicional posição neutra brasileira e com poder de impactar, de novo, as relações com países árabes, grandes importadores de produtos brasileiros.

Até agora, apenas o Reino Unido endossou o plano norte-americano. De um modo geral, os países europeus foram cautelosos, indo da promessa de analisá-lo com cuidado a advertências de que as negociações precisam fazer concessões aos palestinos.