ANÁLISE-Compromissos ambientais do Brasil são genéricos e cumprimento não resolve impasse com europeus
Por Caroline Aragaki
SÃO PAULO (Reuters) - Apesar de o Brasil ter firmado uma série de compromissos internacionais e adotado uma vasta legislação relacionada a florestas, incluindo a Amazônia, o cumprimento do que foi prometido não seria suficiente para reverter a ameaça de investidores europeus de desinvestir no país frente ao desmatamento, segundo analistas ouvidos pela Reuters.
“As promessas de governos sempre são genéricas. Assim, o impasse somente será resolvido com uma rápida diminuição dos desmatamentos e queimadas”, resumiu Carlos Nobre, pesquisador do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP.
“Se o Brasil não conseguir rapidamente mudar a rota atual, irá gradativamente perder mercados europeus e, posteriormente, mercados em todo o mundo”, alertou o pesquisador, acrescentando que a preocupação com a redução de desmatamento é global.
O desmatamento na floresta amazônica subiu 34,5% no acumulado em 12 meses, apesar de ter registrado queda em julho, enquanto o número de focos de incêndios na região aumentou 28% no mês em relação a um ano atrás, segundo dados preliminares do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
O próprio vice-presidente da República, Hamilton Mourão, que presidente o Conselho Nacional da Amazônia, reconheceu que o Brasil precisa apresentar resultados melhores nesses índices para conseguir reverter a má vontade crescente de investidores internacionais.
Mesmo quando há metas específicas, como as do Acordo de Paris --que são para 2025--, o professor da USP Paulo Artaxo, especialista em questão ambiental na Amazônia, pondera que “faltam políticas públicas em implementação que possam garantir, subsidiar a aplicação dessas metas”.
Para o professor de Economia e de Relações Internacionais Vinícius Rodrigues Vieira, da Faculdade Armando Alvares Penteado (Faap), os compromissos internacionais de meio ambiente são amplos a fim de possibilitar uma margem de diferentes interpretações caso haja alguma disputa internacional.
Além da atuação do país frente aos compromissos firmados, Vieira, lembrou que há um protecionismo típico da Europa como pano de fundo e que a questão ambiental funciona como uma estratégia de baixo custo para fortalecer protecionistas.
“Ainda que o Brasil fizesse a lição de casa e cumprisse o que foi prometido, nunca será o suficiente”, avaliou, acrescentando que o país é visto como um grande celeiro agrícola e competidor internacional, um argumento muitas vezes usado pelo presidente Jair Bolsonaro.
COMPROMISSOS EM MEIO A AMBIGUIDADES
Para Ademar Ribeiro Romeiro, membro do Núcleo de Economia Agrícola e do Meio Ambiente da Unicamp, existe "uma contradição" entre os acordos firmados e a legislação brasileira e a mentalidade política.
”Ao mesmo tempo em que existem esses compromissos todos, há uma mentalidade de desenvolver que significa desmatar”, disse.
Para Romeiro, essa mentalidade perpassa diferentes governos brasileiros, tanto de direita como de esquerda. Dois exemplos mostrariam que a ideologia política não altera esse comportamento.
Quando da assinatura do Tratado de Cooperação Amazônia, de 1978 e que teve iniciativa nacional por meio do governo Ernesto Geisel, durante a ditadura militar, o Brasil construía a rodovia Transamazônica. Já em 5 de maio de 2016, durante o governo Dilma Rousseff, Belo Monte foi inaugurada.
O professor afirmou que a contradição decorre de uma dupla pressão: externa e interna. O governo multiplicou iniciativas para dar uma resposta à pressão internacional, enquanto permanece com pressões no cenário interno, como as de grileiros e posseiros que pedem, por exemplo, uma melhoria e asfaltamento da rodovia Porto Velho-Manaus.
As pressões internas, de acordo com Ribeiro, ganham terreno porque o país segue uma mentalidade de desenvolvimento para ele ultrapassada e não sabe como lucrar com a biodiversidade da Amazônia. “Ninguém sabe como funciona isso, criar gado todo mundo sabe”.
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