Em meio a recorde de mortes e "volta" de Lula, Bolsonaro muda discurso de enfrentamento à pandemia
Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - O presidente Jair Bolsonaro decidiu mudar o discurso do governo no enfrentamento à pandemia do coronavírus, com uma defesa enfática da vacinação em massa e das ações federais em favor de Estados e municípios, em meio aos recentes recordes de mortes no país pelo vírus e com o retorno de um competitivo adversário político para sua sucessão, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Nesta quarta-feira, o Brasil superou o patamar de 2 mil mortes em um único dia em decorrência da Covid-19 pela primeira vez desde o início da pandemia, com o registro de 2.286 novos óbitos, o que eleva o total de vítimas fatais da doença no país a 270.656, segundo o Ministério da Saúde.
O país tem sido alvo de críticas de autoridades sanitárias pela gestão da pandemia em razão da explosão de casos e da livre circulação de variantes de Covid-19 que seriam mais transmissíveis e poderiam reduzir a eficácia das vacinas.
Em outra frente, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, é alvo de uma investigação criminal no Supremo Tribunal Federal, por suposta omissão no enfrentamento à pandemia e há ainda um pedido de abertura de CPI para apurar a ação federal que ainda não houve definição pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
ESFORÇO
Recentemente, Bolsonaro passou a reconhecer a gravidade da pandemia e ressaltou que seu governo --apesar de questionamentos de governadores, prefeitos e parlamentares-- tem se esforçado ao máximo para conter a pandemia e se empenhado para evitar mortes por Covid-19.
Em cerimônia de sanção de projetos para acelerar a vacinação, Bolsonaro falou em seriedade e responsabilidade do seu governo na disponibilização de vacinas com o aval do órgão regulador, a Anvisa.
"Fomos e somos incansáveis no combate à pandemia de coronavírus", disse.
Personagem que outrora minimizou os efeitos da vacinação, o presidente também exaltou os esforços federais para conseguir novas doses de imunizantes e até participou de uma reunião virtual na segunda-feira com o presidente mundial da Pfizer, Albert Bourla, para discutir aquisições.
A vacina da Pfizer --a única com registro definitivo da Anvisa, mas não adquirida pelo governo-- já foi alvo de críticas e chacota do presidente, quando chegou a dizer que "se você virar jacaré" tomando ela, o problema era de quem recebeu.
"Temos adquirido mais de 270 milhões de doses de vacina, a maioria para o primeiro semestre", disse Bolsonaro, na cerimônia. Ele também disse que o país já tem mais de 10 milhões de pessoas vacinadas, quantitativo maior do que a população de Israel, comparou.
Essa fala do presidente destoa da atuação do governo federal até recentemente quando não se mostrava empenho para aquisição de imunizantes, e o próprio Bolsonaro chegava a duvidar da eficácia das vacinas publicamente.
O percentual de vacinados no Brasil caminha a passos lentos, com apenas 4% da população imunizada com a primeira dose, e a velocidade da vacinação é fundamental para conter a epidemia e reduzir a alta mortalidade.
MÁSCARA
Na cerimônia desta quarta, numa cena incomum, todos os presentes participaram da solenidade usando máscara. Bolsonaro só a retirou para fazer o seu discurso.
É um sinal de mudança para quem, em novembro passado, chegou a falar que o uso da máscara --uma das medidas mais eficazes para evitar a contaminação por Covid-19-- era o "último tabu a cair".
A mudança no tom do presidente ocorreu após uma piora na pandemia no país registrada desde a virada do ano, que contou inicialmente com o colapso na saúde do Amazonas e outros Estados do Norte e posteriormente se alastrou país afora, em razão do alastramento da variante de Manaus, que, segundo estudos, é mais transmissível.
Ao mesmo tempo, gestores regionais começaram a cobrar a ampliação na vacinação de forma a aumentar a imunização dos habitantes e reduzir medidas drásticas de restrição de atividades, tão criticadas por Bolsonaro.
O ajuste no tom do presidente também ocorreu após pesquisas de popularidade terem apontado uma piora na avaliação do governo. No início de fevereiro, por exemplo, a popularidade dele seguiu tendência de queda que vinha sendo registrada desde setembro de 2020, segundo pesquisa XP/Ipespe.
O levantamento mostrou oscilação entre os consideram a administração ruim ou péssima, parcela que passou de 40% em janeiro para 42% neste mês.
Ainda assim, Bolsonaro continua a criticar governadores e prefeitos que adotam restrições mais duras às atividades e continua a defender o tratamento com medicamentos sem eficácia comprovada no tratamento contra a Covid.
O presidente rebateu as críticas de Lula quanto à gestão federal no enfrentamento à Covid-19. "Imagine a pandemia com Lula presidente da República?", questionou ele, ao afirmar que iria ocorrer roubo de recursos.
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