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Depois de "ruídos desnecessários", Lula pretende usar viagem à Europa para ajustar discurso sobre guerra na Ucrânia

21/04/2023 09h36

Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) - Depois de enfrentar críticas por suas recentes declarações sobre a guerra na Ucrânia --em que acusou Estados Unidos e Europa de incentivarem o conflito--, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai usar a visita a Portugal e Espanha, nos próximos cinco dias, para recalibrar o discurso e deixar claro que condena de forma inequívoca a invasão por parte da Rússia, disseram à Reuters fontes do governo.

No Palácio do Planalto e do Itamaraty admitem que as últimas falas de Lula trouxeram um "ruído desnecessário" e desequilibraram a posição que o Brasil tenta manter, de equidistante dos dois lados do conflito para ser capaz de se sentar à mesa como um dos negociadores da paz.

Segundo um auxiliar muito próximo do presidente, ele mesmo admite ter passado do ponto e ter passado uma ideia que não é sua posição real.

A viagem à Europa servirá para ajustar o discurso, em uma sequência do que começou já na terça-feira quando, ao receber o presidente da Romênia, Klaus Iohannis. Ao fazer o brinde na recepção, Lula condenou claramente a invasão e defendeu a integridade territorial da Ucrânia.

"Em Portugal e na Espanha ele vai reafirmar essa questão da paz, ajustar um pouco a fala. Não nos interessa passar a ideia de que ele é favorável ao que a Rússia fez ou que ele tem algum lado em um conflito", disse a fonte. "Vai ajustar um pouco a fala, vai reafirmar a questão da defesa da paz. O Brasil não tem lado nesse conflito."

As reações à fala do presidente, vindas especialmente dos Estados Unidos, foram estridentes. Na segunda-feira, o porta-voz do Conselho de Segurança da Casa Branca, John Kirby, acusou o governo brasileiro de "repetir como papagaio" a propaganda russa e soviética.

No dia seguinte, a porta-voz da Casa Branca afirmou que o governo norte-americano fora "surpreendido" pelo tom do governo brasileiro, que não parecia ser de neutralidade.

Fontes diplomáticas e do Planalto ouvidas pela Reuters admitem que as falas do presidente na China e depois em Abu Dhabi, e o fato dele ter considerado que a Crimeia possa ser mantida em poder da Rússia, causaram um ruído desnecessário. O que foi potencializado pela presença do chanceler russo, Sergei Lavrov em Brasília, na segunda-feira.

Ao lado do chanceler brasileiro, Mauro Vieira, Lavrov aproveitou para afirmar uma similaridade entre Brasil e Rússia nas visões sobre a guerra, o que causou mais incômodo aos europeus e norte-americanos. O Itamaraty se apressou a confirmar que o chanceler da Ucrânia, Dmytro Kuleba, havia sido também convidado por Vieira para vir ao Brasil antes mesmo do convite a Lavrov, mas ainda não havia marcado uma data. O estrago, no entanto, estava feito.

"O timing não foi bom", diz a fonte palaciana.

Às vésperas de embarcar para a Europa, explicou a fonte, o presidente fez questão de participar da Cúpula Virtual de Grandes Economias sobre Energia e Clima, chamada pelo presidente norte-americano Joe Biden, para demonstrar que não há, do lado do Brasil, nenhuma mudança na relação com os Estados Unidos, apesar das críticas recentes --mesmo sem ter sido avisado com antecedência da doação de 500 milhões de dólares em cinco anos ao Fundo Amazônia anunciada por Biden.

Do lado norte-americano, de acordo com uma fonte, apesar das surpresa com as falas de Lula - e de até ter-se questionado internamente se o Brasil poderia de fato ser um mediador na crise --, a avaliação é de que a relação dos dois países é maior que isso. A crise momentânea teria sido um "tropeço" que não irá abalar o restante da relação.

(Reportagem de Lisandra Paraguassu)