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Parceria com Atala faz pequeno produtor de arroz atingir público chique

Afonso Ferreira

Do UOL, em São Paulo

29/04/2013 06h00

Filho e neto de agricultores, Francisco Ruzene, o Chicão, 47, resolveu mudar a forma como outras gerações administravam a produção agrícola da família para conquistar novos mercados. Ele deixou de plantar arroz-agulhinha, o mais consumido pelos brasileiros, para apostar em um tipo quase desconhecido por aqui: o arroz preto.

A novidade foi parar nas mãos do chef Alex Atala e, a partir daí, as vendas da Arroz Preto Ruzene decolaram.

Atala é dono do D.O.M., restaurante na capital paulista que ocupa o sexto lugar na lista dos 50 melhores do mundo, elaborada pela revista inglesa "Restaurant", segundo editores de publicações gastronômicas. A lista foi divulgada nesta segunda-feira (29). No ano passado, o chef ficou com o quarto lugar.

Enquanto participava de uma feira de alimentos em São Paulo (SP), em 2006, o produtor concedeu uma amostra do seu arroz preto a um consultor gastronômico que disse que levaria o produto até Atala.

No dia seguinte, Chicão recebeu um e-mail do chef dizendo que gostaria de conhecê-lo pessoalmente. “Não sabia quem ele era. Quando fui pesquisar, percebi que ele era o ‘cara’ que poderia me ajudar”, afirma.

Atala diz que, ao provar o arroz percebeu que era um produto diferenciado e de alta qualidade. “Experimentei, gostei do sabor, da qualidade e de saber que era produzido por um pequeno produtor.”

Durante o encontro, Atala disse que o arroz preto tem grande valor na alta gastronomia e que ajudaria o produtor a divulgá-lo. O D.O.M. se tornou o principal cliente de Chicão.

Posteriormente, outros restaurantes voltados às classes A e B –como o Cantaloup e o Mocotó, na capital paulista, e o Frontera Ipanema, no Rio de Janeiro (RJ)– também passaram a comprar o arroz do agricultor.

“Com um bom ‘padrinho’ é mais fácil apresentar seu produto. Quando deixava amostras nos restaurantes e dizia que o Alex Atala era meu cliente, ganhava mais credibilidade”, diz o produtor.

Inicialmente, o arroz preto era cultivado em uma área de cinco hectares na fazenda em Pindamonhangaba (a 156 km da capital paulista). Hoje, a área cresceu para 170 hectares, equivalente a 238 campos de futebol.

Além do arroz preto, o empreendedor cultiva outros tipos do grão, como o vermelho, arbóreo, basmati, jasmini, cateto e miniarroz. Por ano, a fazenda produz 1,5 tonelada de arroz. O valor do faturamento não foi divulgado.

Arroz preto é mais lucrativo

Chicão diz que conheceu o arroz preto em 2005, quando o IAC (Instituto Agronômico de Campinas) procurava um produtor para cultivar tipos de arroz especial.

Na época, o agricultor estava em dificuldades financeiras e aceitou plantar o grão. Segundo ele, o arroz-agulhinha, cultivado pela família há gerações, não dava lucro.

“Se o produtor de arroz [tipo agulhinha] sobe o valor em um centavo, a mídia já diz que o arroz é o grande ‘vilão’ na cesta básica e faz pressão para baixar o preço”, declara.

Já o arroz preto não tem o preço tão controlado. Chicão diz que pode cobrar mais caro e ter uma margem de lucro maior. O quilo do grão é vendido pelo produtor por R$ 18, mas pode ser encontrado em alguns empórios por até R$ 25, de acordo com o empresário.

Já o quilo do arroz tipo agulhinha custa, em média, R$ 2 nos supermercados, segundo pesquisa mensal divulgada pelo Procon. 

Além disso, o agricultor declara que o produto é mais saudável e saboroso do que o arroz-agulhinha.

No início, Chicão afirma que foi motivo de piada para outros produtores da região. Hoje, seis fazendas locais produzem dez tipos de arroz especial para sua empresa.

“O produtor rural é muito tradicional. Para ele, mudar de variedade é muito difícil. Ele espera o vizinho plantar para ver se vai dar certo.”

Chef cria marca para ajudar pequenos produtores

Chicão e Atala atuam juntos também em outro projeto. Para ajudar o, agora, amigo e outros pequenos produtores rurais, o chef criou a marca Retratos do Gosto, que comercializa produtos destes agricultores voltados à alta gastronomia.

A iniciativa tem a participação societária da MIE Brasil, empresa de desenvolvimento de marcas de alimentos, que fica com 75% da receita gerada. A parte do faturamento destinada ao chef (25%) é revertida para o produtor rural investir em pesquisas de melhorias das técnicas de plantio.

“É importante que o pequeno produtor seja incentivado a manter seu negócio, receba remuneração justa, seja valorizado e, principalmente, seja o protagonista de sua empresa perante os consumidores”, afirma Atala.

"Padrinho" famoso dá credibilidade ao negócio

Para o professor do curso de administração da ESPM Adriano Gomes, quando uma pequena empresa é apadrinhada por uma pessoa famosa ou formador de opinião –como é o chef Alex Atala–, ela ganha o respeito do público que acredita nesta celebridade.

Segundo Gomes, uma celebridade só aceita ajudar uma empresa, sem cobrar cachê, quando ela possui boas práticas de funcionamento e é politicamente correta.

Isso implica ter licenças de funcionamento, autorizações de órgãos públicos e certificados de qualidade. “Nenhuma celebridade vai colocar o nome dela em uma empresa que tem trabalho escravo, não paga tributos ou polui meio ambiente”, diz o professor da ESPM.