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Empresa da Amazônia investe na produção de "bacalhau" de pirarucu

Priscila Tieppo e Janice Kiss

Do UOL, em São Paulo

07/08/2013 06h00

Dentro de dois meses, a comunidade ribeirinha da Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamirauá, no interior amazonense, irá se preparar para fazer a pesca do pirarucu.

Cerca de 350 toneladas desse peixe, considerado um dos maiores da Amazônia, chegarão ao mercado local com o nome de "bacalhau" - referência controversa em relação ao processo de salga usada pelos ribeirinhos para prolongar a conservação da carne.

  • Jimmy Christian/Divulgação

    Pirarucu é pescado na Reserva de Mamirauá, no AM

Por tradição, apenas cinco espécies de peixes de águas profundas e frias podem se transformar em bacalhau. Por isso os exemplares mais famosos saem da Noruega e de Portugal, cujo quilo custa em torno de R$ 45 no mercado brasileiro.

Há três anos, a comunidade de Mamirauá foi envolvida em um projeto do governo estadual na implantação de uma fábrica de salga do pirarucu (a Agroindústria de Maraã) dentro da reserva, capaz de produzir 1.500 toneladas de peixe por ano. A capacidade está prevista para subir para 5.000 toneladas por ano com a inauguração, em outubro, de uma unidade localizada no município de Fonte Boa (AM).

"É um passo importante para a produção regional do Amazonas, ainda muito dependente da Zona Franca de Manaus", diz Eron Bezerra, da Secretaria de Estado da Produção Rural (Sepror).

O pirarucu proveniente da agroindústria chega ao mercado com a marca "Bacalhau da Amazônia". Por enquanto, o produto só pode ser comercializado no Estado (preço final de R$ 20 a R$ 25 por quilo) pela falta do carimbo do SIF (Serviço de Inspeção Sanitária).

Na reserva, a pesca é controlada

A retirada do pirarucu na reserva de Mamirauá é feita de forma controlada. O Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis) fica responsável pela determinação de uma cota anual de pesca, que se baseia na evolução da população de pirarucus.

Só é permitido retirar 30% dos adultos contados no levantamento feito todos os anos de estoques de peixes, para que não se corra o risco de pesca em excesso. O pirarucu, que pode chegar a 200 kg, corre risco de extinção por conta desse exagero.

Por lei, a pesca só é permitida entre outubro e dezembro.

  • Jimmy Christian/Divulgação

Pirarucu fresco também tem mercado

Diferentemente da experiência do pirarucu salgado, a Mar &Terra, tradicional empresa de pescados localizada em Pimenta Bueno, em Rondônia, investe na comercialização do peixe fresco. Por mês, são processadas em torno de 40 toneladas.

Segundo o diretor Thiago Tetsuo Ushizima, cerca de 70% da produção é voltada para o mercado externo, e o restante é direcionado para seis capitais do país (São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Campo Grande, Curitiba e Porto Alegre). No mercado, o consumidor paga entre R$ 17 e R$ 30 pelo quilo do peixe.

A produção da Mar & Terra é garantida por meio da parceria com 65 produtores de Rondônia. A empresa encaminha os filhotes (alevinos) para os piscicultores fazerem a engorda do peixe em cativeiro. É necessário cerca de um ano para os filhotes alcançarem o peso de abate (10 kg a 12 kg).

Conforme Ushizima, 100 mil pirarucus estão em processo de engorda para o ano que vem, quando 1.000 toneladas de carne serão colocadas no mercado.

Há cinco anos, o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) mantém um projeto de criação do peixe em cativeiro com 200 piscicultores de sete Estados da região amazônica (Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Tocantins, Rondônia e Roraima).

Segundo Newman Costa, diretora de Pesca e Aquicultura do Sebrae, a intenção é chegar a um modelo para a atividade que tem criações esparsas pelo país e que não são contabilizadas pelo Ministério da Pesca.

"Os melhores avanços têm sido constatados em Rondônia, com produção de 100 toneladas anuais", informa.

Bacalhau e pirarucu, peixes diferentes

Para a chef Mara Salles, do restaurante Tordesilhas, em São Paulo, o consumidor precisa estar ciente de que o pirarucu salgado não tem semelhança alguma com o tradicional bacalhau. "São incomparáveis", diz.

Segundo ela, o pirarucu só nada em água morna, a carne é gorda e de consistência mole. Por outro lado, o bacalhau é proveniente de águas frias e a carne é fibrosa. "Por isso não podem ser preparados da mesma forma", afirma.

Mara Salles diz que o preparo do peixe tradicional da Amazônia está atrelado a outros ingredientes brasileiros, como a banana e a farinha de mandioca. "E o par do legítimo bacalhau é o azeite".