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Entenda por que o BC está subindo juros mesmo com o consumo desacelerando

Luiza Calegari

Do UOL, em São Paulo

21/01/2015 20h02

O Banco Central subiu a taxa básica de juros (Selic) em 0,5 ponto percentual, de 11,75% para 12,25% ao ano. A taxa de juros é o instrumento mais conhecido do governo para controlar a inflação. O processo funciona desestimulando o consumo: com juros mais altos, os financiamentos ficam mais caros, e as famílias tendem a gastar menos.

Ao longo do ano passado, no entanto, o consumo das famílias já desacelerou (o que é diferente de estar caindo: desacelerar quer dizer subir cada vez menos).

No primeiro trimestre de 2014 em comparação com o mesmo período de 2013, o consumo subiu 2,2%; no segundo trimestre, subiu 1,2%; e, no terceiro, teve só uma leve alta de 0,1%. Os dados do quarto trimestre só serão divulgados em março.

Na comparação com o trimestre imediatamente anterior, a variação é menor: houve queda de 0,1% no primeiro trimestre em relação ao quarto trimestre de 2013; estabilidade no segundo em relação ao primeiro trimestre; e queda de 0,3% no terceiro em relação ao segundo.

Em 2010, por exemplo, quando a economia como um todo cresceu 7,5%, o consumo das famílias chegou a aumentar 8,5% só no primeiro trimestre (na comparação com o mesmo período de 2009).

Fica a pergunta: por que, então, subir os juros, se o consumo não está subindo tanto? O UOL ouviu especialistas para tentar entender a estratégia do governo.

Sacrificar o consumo

Segundo analistas, a prioridade máxima do governo agora é o controle da inflação, mesmo que isso signifique que o consumo tenha que cair.

“Em termos de inflação, não existe terapia sem dor”, afirma o professor dos MBAs da FGV Mauro Rochlin. “A ideia é desestimular ainda mais o consumo”.

Quando o consumo desacelera ou cai, a renda das pessoas acompanha esta tendência, e o crédito tende a ficar mais restrito também.

Nesse caso, a intenção é fazer com que a indústria segure os aumentos de preço e não os repasse aos consumidores; assim, a inflação fica controlada porque os preços param de subir.

O processo funciona pela lei da oferta e da procura: quando há oferta de um produto no mercado, mas a procura por ele é baixa (porque as pessoas estão sem dinheiro, neste caso), a tendência é que o preço caia.

Incentivo de poupança

Além do motivo já citado, que afeta a vida cotidiana, ainda há outro incentivo para a alta dos juros. Segundo Otto Nogami, professor de economia do Insper, os juros mais altos tornam a poupança mais atraente.

Ele não se refere à poupança dos cidadãos comuns, mas à dos investidores, bancos, e grandes empresários. Os grandes investidores não guardam o dinheiro na mesma poupança que os pequenos'. Em vez disso, investem em títulos públicos.

Esses títulos são “fatias” da dívida que o governo vende para ter dinheiro agora, comprometendo-se a devolver a quantia com juros no longo prazo.

Com juros mais altos, a rentabilidade dos títulos públicos aumenta, ou seja, eles ficam mais atraentes aos investidores do mundo todo.

Tiro no pé

Com mais investidores comprando títulos da dívida, e com o comprometimento em pagar juros por ela, o governo acaba se endividando ainda mais.

Segundo o professor do Mackenzie Pedro Raffy Vartanian, no entanto, essa alta no endividamento é inevitável no curto prazo.

No médio prazo, para balancear esse efeito, o governo precisa aumentar a arrecadação (subir impostos) e cortar outros gastos.

‘Remédio amargo’

Não existe outra fórmula conhecida para controlar a alta dos preços, segundo Vartanian.

O ideal é que haja crescimento econômico aliado a inflação controlada, mas diferentes países em diferentes momentos econômicos tendem a priorizar uma das variáveis.

Para os economistas, o primeiro passo do Brasil deve ser domar a inflação, para depois poder voltar a crescer. De outro modo, a inflação alta só piora as expectativas das pessoas e das empresas, o que também acaba travando o crescimento.