Empresários criticam governo por crise na hidrovia Tietê-Paraná, em SP
A maior seca a atingir São Paulo em 84 anos colocou empresários do setor de transporte fluvial em rota de colisão com o governo federal. Associações que representam o setor acusam o governo de, diante da crise hídrica, ter priorizado a geração de energia elétrica, o que diminuiu o calado (profundidade) das embarcações que navegam pela hidrovia Tietê-Paraná, e que inviabilizou a navegação comercial na região e causou prejuízo de pelo menos R$ 685 milhões entre 2014 e 2015.
Procurada pelo UOL, a ANA (Agência Nacional de Águas), órgão que regula a gestão dos recursos hídricos no Brasil, não respondeu às críticas dos empresários.
A hidrovia do Tietê-Paraná tem 2.400 quilômetros e liga centros produtores de commodities rurais como soja e milho ao corredor de exportação que termina no Porto de Santos, no litoral do Estado de São Paulo. Como boa parte do trecho da hidrovia fica entre barragens utilizadas para a geração de energia elétrica, o nível dos lagos depende da gestão da água.
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Água é disputada entre energia, transporte e consumo
Em um cenário de abundância, a geração de energia não chega a atrapalhar a navegação. Quando a estiagem é severa, no entanto, a água liberada para as turbinas das usinas diminui o nível dos lagos e prejudica o fluxo de embarcações. Em 2014, pela primeira, a navegação na hidrovia foi interrompida.
Para o diretor-executivo da Fenavega (Federação Nacional das Empresas de Navegação), Paulo Leismann, a ANA não respeitou o princípio do “uso múltiplo” dos recursos hídricos.
“O governo se viu diante de uma crise hídrica e energética e priorizou a geração de energia em detrimento à navegação. Só no Tietê-Paraná, os empresários investiram R$ 6 bilhões e agora esperam a retomada da navegação. Isso cria um cenário de desconfiança para o investidor”, afirmou Leismann.
Para o presidente do Sindasp (Sindicato dos Armadores de Navegação Fluvial do Estado de São Paulo), Edson Palmesan, não é possível ignorar a extensão da crise hídrica na região Sudeste, mas ele argumenta que o gerenciamento da água na região poderia ter sido feito de uma forma menos traumática para as empresas de transporte.
“É claro que a estiagem é severa. Muito forte. Mas o governo tomou suas decisões sem considerar o impacto que isso teria tanto para os armadores [empresários de barcos] quanto para o setor produtivo que dependia da hidrovia”, disse.
Procurada do UOL, a ANA informou, por e-mail, que uma reunião sobre o tema foi realizada nesta terça-feira (11), mas que não foram encontrados porta-vozes para responder às acusações feitas pelos empresários ligados ao transporte na hidrovia citados na reportagem.
Empresa processa por prejuízos
O desentendimento sobre o destino da água da hidrovia Tietê-Paraná chegou até a Justiça. Em setembro de 2014, a Caramuru Alimentos S.A, uma das principais transportadoras e processadoras de grãos do país pediu uma indenização à CESP (Companhia Energética de São Paulo) e ao ONS (Operador Nacional do Sistema) no valor de R$ 24 milhões pelos prejuízos causados pela interrupção da navegação na hidrovia.
A Justiça ainda não decidiu a questão, e a empresa disse ao UOL, por e-mail que não iria se pronunciar sobre o assunto.
Desequilíbrio climático é a causa, diz pesquisador
O pesquisador-sênior e co-fundador do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), Beto Veríssimo, afirma que o conflito de interesses entre governo e empresários é apenas uma demonstração da natureza das crises que os eventos climáticos extremos vão criar.
“É claro que num momento de escassez de água, o governo vai priorizar energia elétrica e o abastecimento humano, mas é importante que se tenha em mente a causa disso. E a causa disso é global. O aquecimento global não depende do que se faz na região do Tietê-Paraná. É muito mais amplo e mais complexo”, afirmou.
Beto Veríssimo alertou para o risco de que a continuidade de eventos climáticos extremos como as secas na região Sudeste possa contribuir ainda mais para a emissão de gases do efeito estufa, que, segundo os cientistas, agravaria ainda mais o cenário de mudanças climáticas.
“Se continuar a chover pouco, corre-se o risco de que não se ter água suficiente para gerarmos energia com as hidrelétricas. Aí, a saída vai ser usar as usinas termelétricas, o que vai sujar ainda mais a nossa matriz energética”, afirmou.
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