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José Paulo Kupfer

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Medo de que inflação gere mais inflação faz juro ter maior alta em 18 anos

04/08/2021 19h51

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A taxa básica de juros (taxa Selic) avançou de 4,25% nominais ao ano para 5,25%, com a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), na reunião desta quarta-feira (4). A alta de um ponto percentual é a primeira em mais de 18 anos, mas deve ser considerada como mais dura do que a anterior, visto que, naquela ocasião, o valor absoluto da Selic, então em 25,5%, era muito maior.

Na última vez em que a taxa básica foi elevada nessa magnitude, em fevereiro de 2003, vivia-se um período de turbulência na economia. A perspectiva de vitória do líder sindical Lula, nas eleições de 2002, confirmada pelas urnas, causou instabilidades no mercado financeiro, levando a uma explosão da cotação do dólar, nos meses finais do governo de FHC e nos meses iniciais do primeiro mandato do petista.

No comunicado divulgado logo após o encerramento da reunião de agosto, os diretores do Banco Central que compõem o Copom mostraram preocupação com a existência de pressões inflacionárias acima das usuais. Na decisão unânime de elevar a taxa básica em um ponto percentual, pesou a "percepção de que a piora recente em componentes inerciais dos índices de preços, em meio à reabertura do setor de serviços, poderia provocar uma deterioração adicional das expectativas de inflação".

Além de pressões inflacionárias, embora de forma genérica, o Copom menciona temores fiscais. De fato, o espaço fiscal, representado pela folga prevista na regra do teto de gastos e no aumento da arrecadação, entrou em regime de incerteza com o inesperado e pesado vazamento nas contas públicas de um volume de R$ 90 bilhões em precatórios a serem pagos em 2022. Manobras para parcelar e adiar os pagamentos estão sendo criticados no mercado, considerando se tratar simplesmente de aumento de dívida e riscos para o teto de gastos.

No mercado financeiro, os temores na área fiscal também são alimentados pelos riscos de aumento nos gastos públicos em pelo menos duas vertentes. De um lado, a presença do Centrão, que tem fama de usar dinheiro público no interesse direto de seus componentes, no coração do governo e na liderança do Congresso. De outro, o desejo conhecido do presidente Jair Bolsonaro em pisar no acelerador dos gastos, de olho na reeleição em 2022, turbinando o Bolsa Família, salários de servidores públicos e obras de infraestrutura.

Economistas de fora do mercado financeiro consideram que uma alta da Selic de 0,75 ponto seria suficiente, neste momento, para acomodar as expectativas inflacionárias. Ainda que as expectativas de mercado tenham avançado, esses economistas avaliam que as pressões inflacionárias já começam a se dissipar e que o Copom deveria olhar para frente, não para trás. Argumentam com o exemplo do Fed (Federal Reserve, banco central americano), que, apesar da alta dos preços nos Estados Unidos, tem resistido a subir a taxa de juros de referência, ainda considerando trata-se de um choque temporário.

Embora incomum, a alta de 1 ponto decidida agora era a esperada pela quase unanimidade dos analistas de mercado. Se prevalecer a projeção do Boletim Focus, ainda faltarão 1,75 ponto para os 7% previstos. Entre os analistas, porém, a expectativa é de que o Copom leve a taxa Selic a 7,5%, no fim do ano. Já há mesmo previsões de que a taxa básica feche 2021 em 8%.

É esperado, assim, que o ritmo de alta da Selic permaneça forte nas três reuniões restantes do Copom, neste ano. Na média, seriam altas de 0,75 ponto em cada decisão de setembro, outubro e dezembro. Mas a tendência é a de que o Copom repita a alta de 1 ponto em setembro, como antecipado no comunicado da reunião de agosto, ajustando o ritmo nas duas reuniões finais do ano.