Copom erra, expõe racha político e aumenta incertezas sobre juros
A reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) desta quarta-feira (8) conquistou lugar entre as mais polêmicas e, possivelmente, erradas da história. A decisão de reduzir o ritmo de corte da taxa básica de juros (taxa Selic) em 0,25 ponto percentual, sob o argumento de que aumentaram as incertezas na economia global e doméstica, deve causar ainda mais incertezas sobre a condução futura da política de juros.
Ao reduzir a taxa Selic para 10,5% nominais ao ano, o BC (Banco Central) quebrou parâmetros e padrões. Mais do que isso, deu margem a interpretações de que os membros do Comitê estão rachados — e que divergem menos em termos técnicos do que em termos políticos. Nada pior do que isso poderia ocorrer.
Decisão dividida
A ninguém escapou que, além da decisão dividida — cinco diretores votaram pelo corte de 0,25 ponto, enquanto outros quatro pela manutenção do ritmo de redução em 0,5 ponto —, a votação reuniu do lado mais duro os diretores indicados pelo então presidente Jair Bolsonaro, enquanto os votos pela manutenção do ritmo de redução da Selic vieram todos dos novos diretores indicados já em 2023, no governo Lula. Coube ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, o voto de desempate em favor do corte menor.
Essa divisão será o ponto de maior repercussão nas avaliações sobre o futuro da política de juros. O racha revelado no Copom de maio ganha ainda mais dimensão quando se recorda que são bem raras as decisões divididas no Copom. Decisões do Copom só não foram unânimes em 34 oportunidades —pouco mais de 10% —, nas 262 reuniões do colegiado desde a introdução do sistema de metas de inflação em 1999.
Quebra de padrões
As "anormalidades" do Copom de maio não pararam por aí. Na decisão desta semana, o Copom quebrou padrões ao dispensar o "forward guidance" (orientação para frente, em tradução livre) — ou seja, a orientação sobre suas projeções para os juros básicos. Bancos centrais — o brasileiro entre eles — usam o instrumento do "forward guidance" na tarefa de "ancorar" expectativas sobre os caminhos da inflação e sua condução para o alvo estabelecido no sistema de metas para a inflação.
Confirmar o "forward guidance", em princípio, não é uma obrigação a ser inapelavelmente seguida nas decisões da política de juros. Há situações em que o ambiente e o cenário econômicos mudam rápido e sem prévio aviso, exigindo também mudanças na orientação do roteiro futuro dos juros básicos.
Mas, quando não há elementos de convencimento fortes o suficiente para indicar alterações, abandonar o "forward guidance" tende a ser prejudicial à formação da "ancoragem" das expectativas de inflação em direção à meta.
Não há consenso de que, entre março e abril, as perspectivas da economia, global e doméstica, mudaram o bastante para sustentar a quebra do "forward guidance", que indicou pelo menos mais uma redução de 0,5 ponto na taxa básica, em maio. O próprio Copom, no comunicado divulgado ao fim da reunião de maio, repetiu, em linhas gerais, o balanço de riscos já conhecido para a inflação futura.
Cenários não mudaram tanto
No período, sinalizações do Fed (Federal Reserve, banco central americano) de que não só poderia reduzir o ritmo de cortes dos juros de referência, mas até mesmo elevá-lo, promoveram instabilidades mundo afora, com impactos negativos, principalmente em economias emergentes, nas cotações do dólar. No Brasil, o dólar chegou a escalar a R$ 5,30, mas, aos poucos, refluiu para uma posição em torno de R$ 5.
Os efeitos desse repique do dólar nas projeções de inflação, com novas indicações de que o Fed manterá política de cortes de juros, ainda que em passo mais lento, terminaram sendo mínimos. As projeções para a variação do IPCA, em 2024, continuaram abaixo de 4%, com recuo, em 2025, agora o alvo relevante do Copom, para vizinhanças de 3,5%, perto do centro da meta de 3%. Nem mesmo a calamidade climática no Rio Grande do Sul, que afetará, negativamente, a oferta e a inflação de alimentos, mudou as estimativas para o conjunto da inflação, medida pelo IPCA.
Comunicado pouco explicativo
Não há indicações no comunicado sobre o que teria levado à divisão nas decisões dos membros do Copom. O texto, duro na avaliação dos problemas e riscos dos gastos públicos para o controle da inflação, permite concluir que os diretores antigos e mais "falcões" apoiaram manter a Selic em campo mais restritivo, em resposta à eventual leniência do governo com as contas públicas.
Vai levar muitos outros a também concluir que o Copom, com nova composição a partir de 2025, com presidente e maioria de membros nomeados no governo Lula, será mais leniente com a política fiscal, e, em consequência, com a inflação.
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Quero receberTudo pesado, é de se pensar se um acordo pela manutenção do ritmo de corte em 0,5 ponto, com um comunicado mais duro sobre as perspectivas futuras da política de juros, não teria sido mais adequado, limitando as incertezas no ambiente e nos cenários da política de juros. Prova disso é a indicação, destacada no comunicado da reunião de maio, de que é unânime a avaliação do Copom sobre a necessidade de manter a política de juros em terreno restritivo.
Pelo visto, porém, Campos Neto, em fim de mandato e depois de tantas refregas com Lula, preferiu atuar na direção de marcar posição — reforçando em muitos a visão de que é um oposicionista ao governo Lula.
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