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Sul petroleiro argentino está estrangulado pela crise

18/09/2019 13h38

Comodoro Rivadavia, Argentina, 18 Set 2019 (AFP) - Escolas fechadas, estradas bloqueadas, hospitais com funcionamento mínimo e funcionários públicos em pé de guerra. Chubut, a principal província petroleira da Argentina, é uma das faces mais dramáticas da crise argentina.

A província patagônica, polo de atração turística nesta época do ano, está imersa em dívida e não pode pagar integral e pontualmente professores, médicos, funcionários judiciais, administrativos, aposentados e forças de segurança.

"Não sei quando isso vai acabar", lamenta, angustiada, Yael Matos, que recebe seu salário de professora a conta-gotas.

Chubut é uma das províncias mais afetadas pelo furacão econômico da Argentina, um país de 44 milhões de habitantes que atravessa uma nova crise, com ingredientes antigos: inflação elevada, peso desvalorizado e uma dívida gigantesca.

- 'Não temos data para receber' -Situada em um amplo planalto entre a cordilheira dos Andes e o oceano Atlântico e visitada por centenas de turistas para avistar a baleia franca austral, a província está parada.

Mais de 60.000 funcionários públicos, professores e aposentados não receberam o pagamento de agosto, e nem sabem quando isso vai acontecer.

Na noite de terça, manifestantes fizeram fogueiras em frente à Prefeitura, após duas professores morrerem em um acidente na estrada na volta de um protesto na capital do estado.

Mais cedo, a apresentação do orçamento havia acirrado os ânimos, ao revelar que incluía um aumento de 100% do salário do governador.

"Não temos data para receber. Íamos receber hoje, mas não aconteceu. E, além disso, vamos receber sem aumento, escalonado e em cotas", acrescenta Matos.

"Há empatia na sociedade", afirma a professora, admitindo que o ano escolar está praticamente perdido.

- Saúde precária -Os cuidados públicos de saúde estão reduzidos ao mínimo no Hospital Regional de Comodoro Rivadavia, cidade petroleira onde, em 1922, foi fundada a estatal YPF, 1.800 km ao sul de Buenos Aires.

No hospital antigo, não há lençóis limpos suficientes, e os elevadores estão precários. Um caiu há alguns anos e, desde então, o buraco permanece coberto com madeira.

"Aqui, o único conflito é que queremos receber para trabalhar", queixa-se Anita Fernández, funcionária do depósito do Hospital Regional, onde mil funcionários estão em greve.

A "obra social" (prestação médica sindical) dos funcionários públicos atende três vezes por semana. "Tem que calcular o dia em que pode ficar doente", ironiza Gladys Díaz, do setor de saúde mental do hospital.

Na necrotério, as necropsias estão limitadas por escassez de insumos e, na porta, acumulam-se recipientes com resíduos patológicos, luvas de borracha e seringas usadas.

"Este hospital está sem receita, sem insumos, sem infraestrutura", afirma Díaz.

- 'As pessoas não podem pagar' -A queda da atividade comercial é palpável. "As pessoas não conseguem mais pagar, porque não recebem", diz à AFP María, vendedora de uma loja em "liquidação para fechar".

Com quase 600 mil habitantes, Chubut tem 45% das reservas comprovadas de petróleo da Argentina e 9% das de gás natural. Cerca de 18 mil operários trabalham para 17 empresas que exploram suas jazidas, onde se produz 30% do petróleo do país e 50% do gás natural.

"O parque industrial sofreu uma queda de entre 30% e 40%", indica David Klappenbach, do sindicato do Petróleo.

- Encruzilhada -Chubut é uma tragédia dentro da crise econômica da Argentina. A terceira maior economia da América Latina está em recessão, com 32% da população atingida pela pobreza, 10% de desemprego e uma inflação que acumulou 30% até agosto de 2019.

Como o governo do presidente Mauricio Macri se endividou com o Fundo Monetário Internacional (FMI) por 57 bilhões de dólares, Chubut buscou auxílio de 700 milhões de dólares, a ponto de se tornar a província com maior dívida por habitante.

O salva-vidas se tornou uma âncora, porém. Quase 80% de sua dívida é composta de títulos em dólares em um país, cuja moeda se desvalorizou mais de 65% desde janeiro de 2018.

"As receitas não caíram tanto, mas os gastos aumentaram 80% no primeiro semestre de 2019 em relação ao mesmo período do ano anterior, e grande parte se deve aos serviços da dívida pública", explicou à AFP o diretor do Departamento de Economia da Universidade Nacional da Patagônia, Facundo Ball.

Quase 70% de sua receita petroleira é usada no pagamento da dívida.

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