Pandemia obriga mulheres dos EUA a voltar para casa
Washington, 7 Out 2020 (AFP) - Aracelis Bonet teve de abandonar o emprego para se dedicar totalmente ao filho. Como ela, milhares de mulheres nos Estados Unidos foram forçadas a deixar seus empregos, devido à falta de escolas abertas em razão da pandemia da covid-19.
"Se eu fosse mãe solo, provavelmente estaria sem teto hoje", afirmou essa corretora imobiliária, de 50 anos, de sua casa em Orlando, Flórida.
Seu filho Adam, de 14 anos, é autista. Precisa de cuidados constantes, de manhã, à tarde e à noite, conta Aracelis. Uma situação incompatível com sua profissão, que exige disponibilidade e flexibilidade.
A pandemia da covid-19 está pondo fim ao lento progresso feito pelas mulheres nas últimas décadas em termos de participação no mercado de trabalho e de redução das lacunas profissionais com os homens.
Uma pesquisa realizada entre 16 e 24 de julho pelo Escritório de Estatísticas dos Estados Unidos mostra que 30,9% das mulheres de 24 a 44 anos não estavam trabalhando, devido a problemas com a educação infantil causados pela pandemia, contra 11,6% dos homens.
"Mais de uma mulher em cada quatro está avaliando o que seria inimaginável seis meses atrás: regredir sua carreira, ou abandonar totalmente o mercado de trabalho", disse a McKinsey and Company, cujo estudo foi realizado entre junho e agosto.
- Debate político -O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, critica duramente o fechamento de muitas escolas, vendo a medida como um freio para a recuperação econômica. O debate entrou na campanha com seu adversário democrata, Joe Biden.
Na melhor das hipóteses, Aracelis Bonet agora consegue trabalhar 15 horas por semana, em comparação com 35 a 40 horas antes. Sua renda caiu em mais da metade.
"É muito estressante e muito frustrante", desabafa, descrevendo seus dias intermináveis apoiando seu filho em todos os níveis acadêmico, social e psicológico, sem qualquer ajuda, enquanto à noite tenta manter um número mínimo de clientes.
"Eu sou mãe, professora, terapeuta. Estou exausta", aponta.
Em setembro, a participação na força de trabalho das mulheres de 20 anos caiu para 56,8% contra 69,9% dos homens.
Obviamente, "a covid-19 exacerbou as desigualdades de raça, renda e gênero", resume Diane Swonk, economista-chefe da Grant Thornton.
- Carreira em risco -O risco é que as diferenças entre homens e mulheres se ampliem ainda mais, principalmente no acesso a cargos de responsabilidade nas empresas.
Porque deixar o emprego atrasa por muito tempo a carreira, ressalta a economista.
A imprensa científica, como a Nature ou o jornal britânico BMJ, tem mostrado que as pesquisadoras, obrigadas a dar educação em casa, não foram poupadas: publicaram menos estudos do que os homens neste período de pandemia.
Também é menos provável que tenham embarcado em novas pesquisas nos últimos meses em comparação com seus colegas homens.
A falta de creches ou a abertura parcial das escolas também impede que as mulheres que perderam o emprego encontrem um novo rapidamente.
É uma espécie de dupla condenação, diz Gregory Daco, economista-chefe da Oxford Economics.
"A pandemia atingiu muito mais as mulheres que ocupavam cargos no setor de serviços, o mais afetado pela pandemia. E o retorno ao emprego é muito mais lento para as mulheres do que para os homens", frisa.
- Compromisso político -Mary Proffitt, que mora em Lexington, Kentucky, é uma delas.
"Moro com meu filho de 12 anos e meu pai de 88 anos, que tem leucemia", explica esta senhora de 60 anos que trabalhava em um restaurante antes de ser demitida no final de março.
Para ela, voltar ao trabalho é uma ilusão, pois estaria exposta ao risco de contrair o coronavírus.
Sem seguro de saúde, licença médica remunerada e pais com deficiência imunológica, isso é simplesmente impensável.
Além disso, questiona Mary, de que adianta trabalhar meio período para pagar por creches "ridiculamente caras"?
Para ela, a culpa é clara: "Com os democratas, certamente não estaríamos nesta situação caótica", assegura.
"Toda minha vida fui politicamente comprometida. Desde março, estou ainda mais", diz ela, embora não acredite que o voto das mulheres nas eleições de 3 de novembro possa fazer a diferença em um estado republicano como o Kentucky.
Dt/lo/ad/rsr/dga/mr/tt
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